AVALIAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
EOCA - Entrevista Operativa Centrada na Aprendizagem
A Entrevista Operativa Centrada na Aprendizagem (EOCA) é um instrumento inspirado na psicologia social de Pichon-Rivière, nos postulados da psicanálise e no método clínico da escola de Genebra foi idealizado por Jorge Visca e é um instrumento de uso simples que avalia em uma entrevista a aprendizagem. (BOSSA, 2007.p.46)
Uma forma de primeira sessão diagnóstica é proposta por Jorge Visca (1987, p. 72) através da EOCA. "Em todo momento, a intenção é permitir ao sujeito construir a entrevista de maneira espontânea, porém dirigida de forma experimental. Interessa observar seus conhecimentos, atitudes, destrezas, mecanismos de defesas, ansiedades, áreas expressão da conduta, níveis de operatividade, mobilidade horizontal e vertical etc”. (Weiss apud Visca, 2007, p. 57).
As propostas a serem feitas na E.O.C.A, assim como o material a ser usado, vão variar de acordo com a idade e a escolaridade do paciente. O material comumente usado para criança é composto numa caixa a onde o paciente encontrará vários objetos, sendo alguns deles relacionados à aprendizagem, tais como, cola, tesoura, papel sulfite branco e colorido, papel crepom e seda, coleção, cola colorida, livros de leituras, revistas para recorte e colagem e diversos outros materiais.
O objetivo da caixa é dar ao paciente a oportunidade de explorá-la enquanto o psicopedagogo o observa, nesse momento serão observados alguns aspectos da criança como: a sua reação, organização, apropriação, imaginação, criatividade, preparação, regras utilizadas, etc.
De um modo geral, usam-se propostas do tipo: “Gostaria que você me mostrasse o que sabe fazer, o que lhe ensinaram e o que você aprendeu”, “Esse material é para que você o use como quiser”, “Você já me mostrou como lê e desenha, agora eu gostaria que você me mostrasse outra coisa”.
Durante a realização da sessão, é necessário observar três aspectos:
• A temática, que envolverá o significado do conteúdo das atividades em seu aspecto manifesto e late
• A dinâmica, que é expressa através da postura corporal, gestos, tom de voz, modo de sentar, e manipular os objetos etc.;
• O produto feito pelo paciente, que será a escrita, o desenho, as contas, a leitura etc., permitindo assim uma primeira avaliação do nível pedagógico.
A partir da análise desses três aspectos, o autor propõe que se trace o primeiro sistema de hipóteses para continuação do diagnóstico.
REFERÊCIA:
WEISS, Maria Lúcia Lemme. Psicopedagogia Clínica – Uma visão diagnóstica dos problemas de aprendizagem escolar. 13 ed. Ver. E aml: RJ Lamparina.2003.
Fonte: http://psicopedagogiaeducacao.blogspot.com/2009/09/entrevista-operativa-centrada-na.html
*****************************************
O USO DE JOGOS DE REGRAS NO ATENDIMENTO PSICOPEDAGÓGICO
Autores: Eliane Cawahisa; Geiva Calsa; Ivonilce Gallo; Luciana Lacanallo
Introdução
Em decorrência do baixo desempenho dos alunos nas escolas, uma quantidade cada vez maior de crianças tem chegado aos consultórios de psicopedagogia apresentando dificuldades de aprendizagem em matemática. Tanto na atuação clínica psicopedagógica quanto na atuação escolar faz-se necessário um atendimento especializado nesta área de conhecimento.
O desempenho que os alunos vêm demonstrando, sem dúvida, justifica o desenvolvimento de uma metodologia de trabalho capaz de promover uma aprendizagem significativa dos conceitos e procedimentos matemáticos, em particular, nas primeiras séries do ensino fundamental. Com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento de uma aprendizagem significativa, este artigo visa apresentar uma experiência de uso de jogos de regras na construção do conhecimento matemático.
Embora desenvolvida no âmbito clínico psicopedagógico considera-se oportuna sua ampliação para o meio escolar regular, desde que atendidos os princípios teóricos e os critérios metodológicos de desenvolvimento da atividade. O jogo da velha e o bafo foram os jogos convencionais escolhidos como instrumentos terapêuticos da experiência aqui relatada.
Os Jogos sob um Enfoque Psicopedagógico
A brincadeira e o jogo constituem-se uma necessidade humana e, segundo Kishimoto (2000), interferem diretamente no desenvolvimento da imaginação, da representação simbólica, da cognição, dos sentimentos, do prazer, das relações, da convivência, da criatividade, do movimento e da auto-imagem dos indivíduos. Muitos educadores desvalorizam a brincadeira acreditando que o mais importante na escola é aprender a ler e escrever.
Não levam em conta que todo o desenvolvimento que a brincadeira traz para os indivíduos é pré-requisito para a alfabetização. Vygotsky (1996) afirma que a brincadeira simbólica e o jogo formam uma zona de desenvolvimento proximal que pode se constituir o ponto de partida para aprendizagens formais.
Segundo Piaget (1975), por meio do jogo a criança assimila o mundo para atender seus desejos e fantasias. O jogo segue uma evolução que se inicia com os exercícios funcionais, continua no desenvolvimento dos jogos simbólicos, evolui no sentido dos jogos de construção para se aproximar, gradativamente, dos jogos de regras, que dão origem à lógica operatória.
Segundo o autor, nos jogos de regras existe algo mais que a simples diversão e interação, pois, eles revelam uma lógica diferente da racional. Este tipo de jogo revela uma lógica própria da subjetividade tão necessária para a estruturação da personalidade humana quanto a lógica formal, advinda das estruturas cognitivas. Para Gonçalves (1999), os jogos de regras podem ser considerados o coroamento das transformações a que criança chega quando atinge a reversibilidade do pensamento.
Ao tentar resolver os problemas originados no desenvolvimento do jogo, o sujeito cria estratégias e as avalia em função dos resultados obtidos e das metas a alcançar na atividade. Os fracassos decorrentes destas ações originam conflitos ou contradições por parte do indivíduo e desencadeiam mecanismos de equilibração cognitiva (Brenelli, 1996).
As regulações ativas geradas por este processo implicam decisões deliberadas dos indivíduos que originam novos procedimentos de jogo. Apresentam um caráter construtivo e por meio delas a retomada de uma ação é sempre modificada pelos resultados da ação anterior em um processo contínuo de modificação das ações seguintes, em função dos resultados das ações precedentes (MACEDO, 1994).
Brenelli (1996) assinala que conhecer os meios empregados para alcançar o objetivo do jogo, bem como conhecer as razões desta escolha ou de sua modificação, implica uma reconstrução no plano da representação do que era dominado pelo sujeito como ação.
O processo de tomada de consciência pode ser favorecido, dessa maneira, pela verbalização dos procedimentos de jogo. Sob uma ótica construtivista a verbalização envolve explicações sobre o que, como e porque os sujeitos executaram seus procedimentos. A utilização da fala organizada é capaz de favorecer a compreensão dos conceitos e procedimentos contidos nas situaçõesproblema enfrentadas pelos sujeitos.
Em uma intervenção de caráter psicopedagógico, o educador deve equilibrar uma atuação mais e menos diretiva, conforme o tipo de tarefa a ser realizada pelos sujeitos. Nas tarefas verbais sua atuação pode ser mais diretiva, pois, tem como objetivo organizar a situação de aprendizagem e solicitar a re-interpretação das ações e das falas dos sujeitos; nas tarefas práticas pode ser menos diretiva, pois, seu objetivo é o de apenas orientar a ação a ser efetivamente realizada pelo sujeito (CALSA, 2002).
Do ponto de vista psicopedagógico, o processo de aprendizagem envolve não somente a fala do sujeito que aprende, mas também a fala de quem ensina. Ao “pensar em voz alta” suas estratégias de ação o educador atua como modelo de reflexão para o sujeito. Utilizados tradicionalmente como recursos clínicos (VISCA, 1987), a fala organizada e o uso do modelo têm obtido na escola resultados satisfatórios no ensino de diferentes áreas de conhecimento (SOLÉ, 1998; ZUNINO, 1995; CALSA, 2002).
A utilização do jogo de regras como um recurso terapêutico ou escolar, seja por parte do psicopedagogo ou do educador, exige conhecimento de sua estrutura e clareza dos objetivos a serem atingidos. Macedo (1997) lembra que ao se propor um jogo é preciso ter em mente o porquê de jogar, o que jogar, para quem, com que recursos, de que modo jogar, quando e durante quanto tempo jogar, e qual a continuidade desta atividade ao final de seu desenvolvimento.
Desenvolvimento das Intervenções Psicopedagógicas
Foram escolhidos como sujeitos da intervenção duas crianças que procuraram atendimento clínico psicopedagógico com dificuldades de aprendizagem na área de matemática.
As crianças freqüentavam a 3a. e 4a. série do ensino fundamental e apresentavam uma faixa etária entre 9 e 11 anos de idade. Os dados obtidos nas sessões de atendimento psicopedagógico foram registrados por escrito pelos terapeutas Elaboraram-se os registros após cada sessão em que os jogos de regras foram utilizados. As sessões foram realizadas individualmente com duração de 50 minutos cada uma. A quantidade de sessões e sua periodicidade foram determinadas pelo interesse dos sujeitos no desenvolvimento dos jogos.
Durante o jogo se um jogador não conseguisse virar todas as fichas ou deixasse uma ou mais, a vez seria do próximo participante. Se o jogador não possuísse a soma determinada pelo seu adversário para fazer a aposta, o valor que não possuído seria descontado da sua soma de pontos (os resultados parciais devem ser anotados).
Se um dos jogadores possuísse uma única carta com o valor superior à aposta feita pelo adversário, ele poderia tentar trocá-la por fichas que representassem essa quantidade. Caso um dos jogadores não tivesse mais o valor para cobrir à aposta determinada pelo adversário ele ficaria com saldo negativo que deveria ser pago no próximo jogo (o registro do saldo negativo foi feito com anotações convencionais, por exemplo - 4 pontos). Seria considerado vencedor quem conseguisse a maior soma no final da partida.
Durante o processo de intervenção psicopedagógica os jogos de regras foram desenvolvidos respeitando-se sua natureza (estrutura interna), seus aspectos cognitivos, afetivos e sociais. Num primeiro momento, optouse pelo ensino e desenvolvimento do jogo, conforme seus materiais e regras convencionais. Após esta aprendizagem novos elementos (numerais e operações) e regras foram introduzidos de acordo com as dificuldades de aprendizagem de matemática a serem atendidas em cada caso.
Resultados
Para a apresentação do jogo do bafo optou-se pelo relato do caso clínico de J. P. (denominação fictícia). As queixas da escola e da família quanto ao seu desempenho se concentravam nos seguintes aspectos: não realizava cálculos mentais; demonstrava possuir recursos intelectuais para realizar as tarefas de matemática, mas não os utilizava; realizava tarefas escolares, sem contudo dispor-se a refazê-las, no caso de estarem incorretas. Para facilitar o acompanhamento das condutas de J. P. optou-se por dividir suas respostas em etapas que permitem a percepção de seu crescimento tanto em relação às estratégias de resolução quanto aos conteúdos de matemática propriamente ditos. Os relatos dos jogos do bafo e da velha iniciam-se a partir da introdução de novos elementos e regras à sua estrutura convencional para o atendimento das dificuldades específicas de cada um dos sujeitos em foco.
Na fase inicial de desenvolvimento do jogo do bafo já com a introdução de conteúdos matemáticos J. P. se preocupava apenas em virar as figuras o mais precisamente possível sem se importar com a soma dos numerais presentes em cada uma das fichas. Ele parecia estar associando as fichas que utilizava neste jogo com as do jogo convencional, em que o valor de cada ficha era definido pela força de seu personagem. Ao poupar as fichas de maior valor - superiores a seis - demonstrava preocupação com a quantidade de cartas de que dispunha no jogo. Jogava o bafo seguindo os procedimentos do jogo convencional sem se dar conta das novas estratégias originadas da introdução de numerais nas fichas.
Em um segundo momento, J. P. começou a perceber que podia superar a terapeuta na sua agilidade de virar as fichas, mas ainda assim não era capaz de ganhar o jogo. Enquanto apostava fichas de valor baixo (1e2) a terapeuta apostava fichas de valor maior que as absorviam. Suas apostas baixas permitiam à terapeuta ganhar o jogo virando as fichas de maior valor em que havia apostado. Nesta etapa a soma de pontos de J. P. era sempre menor que a da terapeuta embora possuísse uma maior quantidade de fichas que ela.
O terceiro momento do jogo do bafo caracterizou-se pela percepção de J. P. de que a soma dos pontos de suas fichas o estava impedindo de ganhar o jogo. Começou então a jogar tentando alcançar a maior soma de pontos em cada virada. Para tanto, passou a apostar com suas fichas de maior valor. A cada partida examinava as fichas que possuía, verificava as que havia perdido e organizava uma estratégia capaz de promover o saldo negativo para a terapeuta.
No quarto e último momento de sua evolução no jogo J. P. passou a apostar o maior número de fichas possível e, de preferência, as de maior valor. Tornou-se capaz de levar em conta em sua estratégia de jogo as duas variáveis ao mesmo tempo: quantidade de fichas e valor de cada ficha apostada. A partir deste momento, preocupa-se em ganhar o máximo de fichas e, ao mesmo tempo, atingir a maior soma possível de pontos.
Para o desenvolvimento do jogo da velha escolheu-se o caso clínico de F. P. (denominação fictícia). A queixa escolar e familiar de seu desempenho concentrava-se nos seguintes pontos: não compreendia o significado dos sinais das quatro operações básicas; não se mostrava capaz de utilizar e compreender os algoritmos convencionais de adição e subtração; encontrava-se na fase inicial de construção do esquema multiplicativo e parecia ainda não ter avançado na construção do esquema aditivo; ainda utilizava algoritmos intuitivos e representação icônica tanto na adição quanto na subtração.
Da mesma forma que no caso anterior, o relato das estratégias envolvidas no jogo da velha se inicia a partir da introdução de elementos e regras relacionadas ao conteúdo matemático no qual o sujeito apresentava dificuldades de aprendizagem. Após esta aprendizagem novos materiais (algarismos) e regras foram introduzidos de acordo com as dificuldades de aprendizagem a serem atendidas no transcorrer do tratamento.
No primeiro momento de atuação com o jogo da velha F. P. mostrou levar em conta apenas os atributos espaciais do tabuleiro sem se ater ao outro atributo, indispensável para a vitória - a soma dos algarismos.
Durante esta fase fixava-se apenas uma das dimensões espaciais do jogo: a diagonal. Utilizava sempre a mesma seqüência de colocação de suas fichas sobre o tabuleiro. Costumava iniciar as partidas colocando suas fichas em primeiro lugar sobre o canto inferior esquerdo do tabuleiro, em seguida no centro, e, no final, no quadro central superior. Sua contagem mostrava-se truncada e sempre acompanhada pelos dedos das mãos. Neste momento, a organização de suas ações parecia não levar em consideração as estratégias utilizadas pelo adversário.
No segundo momento do uso do jogo da velha F. P. começou a organizar sua ação a partir da dimensão numérica do jogo, embora persistisse sua preferência pela dimensão espacial do tabuleiro. Manteve sua fixação em apenas uma de suas dimensões espaciais, a diagonal, e sua estratégia de jogo quanto à posição das fichas no tabuleiro, ainda sem levar em conta os movimentos do adversário. Em uma das partidas desta fase, acabou por ganhar o jogo, mas suas ações não se constituíram reações ou antecipações aos movimentos do adversário e, sim, a repetição de uma seqüência de passos previamente testados. Ainda nesta fase, a escolha das fichas a serem colocadas no tabuleiro foi aleatória, pois, ignorou a dimensão numérica do jogo. Ao vencer a partida não somente quanto à posição das fichas, mas também na contagem de seus pontos deu-se conta da importância do número da ficha utilizada em sua última jogada. Sua contagem continuou truncada e acompanhada dos dedos das mãos.
Na terceira fase do atendimento com uso do jogo da velha F. P. manifestou um grande avanço na elaboração e execução de suas estratégias de jogo. Passou a preocupar-se com as duas dimensões envolvidas no jogo: espacial e numérica e começou a perceber mais claramente as razões das vitórias consecutivas de seu adversário.
Apresentou uma pequena variação em sua estratégia de jogo. Iniciou uma das partidas desta fase do mesmo modo que as anteriores, mas acrescentou mais uma posição à sua finalização: o canto superior direito do tabuleiro. Sua opção por uma ou outra posição da ficha no final do jogo passa a depender dos movimentos do adversário.
Esta opção caracteriza-se como uma reação ao movimento do adversário e, portanto, posterior a este.
Nesta partida, em suas duas primeiras jogadas optou novamente por fichas com números baixos, mas ao final percebeu que, embora tenha vencido quanto à posição das fichas no tabuleiro perdeu em sua contagem de pontos. Deu-se conta de que a diferença de pontos obtidos na partida foi conseqüência das fichas escolhidas pelos dois jogadores. A partir daí passou a observar as quantidades presentes nas fichas utilizadas pelo terapeuta, bem como a seqüência em que foram jogadas. Sua contagem ainda permaneceu truncada e acompanhada dos dedos das mãos.
Na última etapa do jogo da velha F.P. modificou suas estratégias de jogo e passou a utilizar cartas com números maiores em pontos estratégicos do tabuleiro. As estratégias do adversário tornaram-se modelos de ação. Passou a utilizar fichas de maior valor desde as primeiras jogadas de cada partida e, ao mesmo tempo, a apresentar um maior conjunto de variações das posições das fichas no tabuleiro. As jogadas eram iniciadas e finalizadas em diferentes posições do tabuleiro, pois, a estratégia de jogo era organizada não somente como reação aos movimentos do adversário, mas também como antecipação a eles.
Em uma das partidas desta fase o sujeito iniciou o jogo no canto superior direito, seguiu para o canto superior esquerdo e previu a possibilidade de vencer fechando uma seqüência na lateral esquerda do tabuleiro. Para isto, ignorou a ficha colocada pelo adversário no quadro central do tabuleiro e jogou sua ficha na posição central esquerda e, logo após, venceu o jogo fechando uma seqüência no canto inferior esquerdo.
Ao vencer a partida confirmou sua previsão quanto à melhor estratégia adotada nesta situação.
Nos dois casos relatados os sujeitos modificaram suas estratégias de jogo tornando-as operatórias. As estratégias utilizadas no início do desenvolvimento dos dois jogos caracterizaram-se pela preocupação com apenas uma das variáveis envolvidas na atividade de cada vez.
Ao longo do processo de evolução de suas estratégias os sujeitos privilegiaram a cada momento apenas uma das dimensões do jogo. No jogo da velha, no primeiro e segundo momento, F. P. levou em conta apenas sua dimensão espacial para, no terceiro momento, priorizar sua dimensão numérica, e apenas no último momento, levar em conta as duas dimensões ao mesmo tempo. No jogo do bafo, no primeiro e segundo momento, J.P. levou em conta apenas a quantidade de fichas viradas para, no terceiro momento, priorizar a soma dos numerais contidos nas fichas, e apenas no último momento, levar em conta as duas dimensões ao mesmo tempo: quantidadede fichas apostadas e viradas e soma dos numerais contidos nas fichas.
Conclusões
Os resultados do experimento evidenciam os progressos obtidos pelos sujeitos submetidos à abordagem psicopedagógica dos conteúdos matemáticos e dos jogos convencionais escolhidos, bafo e jogo da velha.
Nos dois casos relatados, constatou-se evolução de suas estratégias de jogo e de seus conhecimentos sobre as operações de adição e subtração.
As estratégias iniciais dos dois jogadores demonstravam umaconduta indiferente aos elementos matemáticos introduzidos nos jogos e organizavam suas jogadas, conforme os procedimentos convencionalmente utilizados nos dois jogos.
No jogo do bafo J.P. preocupava-se apenas em virar as figuras o mais rápido possível, enquanto no jogo da velha F.P. fixava-se em uma das dimensões espaciais do tabuleiro, a diagonal.
Ao lidar com apenas uma das duas dimensões implicadas nos jogos os sujeitos evidenciaram uma conduta não operatória, embora a tivessem manifestado em outras situações1.
Em uma etapa posterior os dois jogadores passaram a levar em conta a dimensão numérica dos dois jogos abandonando temporariamente a dimensão espacial. A utilização da dimensão numérica nos jogos, embora de maneira restrita, sugere a manutenção de sua conduta não operatória.
A última etapa de evolução das estratégias de jogo dos sujeitos representou a utilização de diferentes variáveis contidas tanto na dimensão numérica dos jogos – no jogo do bafo quantidade de fichas, valor de cada uma e sua soma, e no jogo da velha o valor de cada ficha e sua soma, quanto em sua dimensão espacial – no jogo da velha a posição diagonal, horizontal e vertical das fichas.
Em provas piagetianas aplicadas aos dois sujeitos observou-se a manifestação do estágio de pensamento operatório concreto.
O novo comportamento introduzido nos dois jogos evidenciou uma conduta operatória nos procedimentos dos dois jogadores. Ao beneficiar-se de sua operatoriedade na organização das estratégias de jogo os sujeitos indicaram ter sido capazes de utilizar adequadamente seus recursos cognitivos. A ativação pertinente dos recursos cognitivos disponíveis em seu sistema cognitivo é um dos indicadores, segundo Perrenoud (1999), do desenvolvimento de competências por parte dos indivíduos.
Os progressos obtidos pelos dois jogadores ao longo do experimento demonstram a importância da abordagem psicopedagógica da matemática e dos jogos convencionais para a melhoria do desempenho dos sujeitos nas duas áreas. Além de modificar suas estratégias de jogo, os sujeitos modificaram suas estratégias de soma das quantidades contidas nas fichas de jogo e dos pontos obtidos nas partidas.
Ambos deixaram de realizar esta operação por meio da contagem dos dedos e passaram a efetuá-la por meio do cálculo mental. Tais resultados confirmam os obtidos em estudos anteriores por Brenelli (1996) e Calsa (2002).
Brenelli (1996) observou que a abordagem psicopedagógica dos jogos de regras favorece o desenvolvimento das estruturas cognitivas, pois, permite que o sujeito realize descentrações e coordenações de pontos de vista, bem como, o desencadeamento de regulações ativas no processo de escolha de procedimentos adequados ao alcance dos objetivos do jogo.
Em seu estudo, realizado com crianças de faixa etária equivalente ao deste relato, a autora constatou que ao modificar sua maneira de jogar a criança mostra que foi capaz de compensar as perturbações provocadas pelo jogo, na tentativa de se acomodar às suas exigências. Dessa perspectiva, podese afirmar que por meio do jogo o sujeito exercitou suas funções intelectuais de assimilação e acomodação, fatores, em parte, responsáveis pelo desenvolvimento cognitivo dos sujeitos.
Calsa (2002), em outro estudo com faixa etária equivalente ao desta pesquisa, concluiu que a abordagem psicopedagógica de conteúdos matemáticos é capaz de melhorar o desempenho de alunos com rendimento insatisfatório nesta matéria. Durante o processo de intervenção os alunos apresentaram um movimento de retomada de formas mais primitivas de resolução de tarefas para, ao longo do processo, chegar até formas mais avançadas e compatíveis com sua faixa etária.
Finalizando, é importante assinalar que os resultados da experiência relatada neste artigo mostram a importância de intervenções de caráter psicopedagógico para a modificação do modelo de aprendizagem dos indivíduos em situação terapêutica, e sugerem sua viabilidade em situação escolar para a melhoria da aprendizagem de seus alunos.
Referências
ANTUNHA, E. Jogos sazonais: coadjuvantes do amadurecimento das funções cerebrais. In: OLIVEIRA, V. Brincar e a criança do nascimento aos seis anos. Rio de Janeiro: Vozes, 2000. p.33-56.49
BRENELLI, R. P. O jogo como espaço para jogar. Campinas: Papirus, 1996.
BENCINI, R. e GENTILE, P. Para aprender (e desenvolver) competências. Revista Pátio, São Paulo, n.135, ano 15, p.12-17, 2000.
BOSSA, N. A psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.
CALSA, G. C. Intervenção psicopedagógica e problemas aritméticos no ensino fundamental. Tese de doutorado: Universidade Estadual de Campinas, 2002. 285p.
GONÇALVES, J. E. Jogos: como e porque utilizá-los na escola! Disponível em: . 1999.
KISHIMOTO, T. M. Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. São Paulo: Cortez, 2000.
MACEDO, L. Ensaios construtivistas. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1994.
MACEDO, L. Quatro cores, senha e dominó. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1997.
MACEDO, L. Aprender com jogos e situações-problema. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000.
PERRENOUD, P. Construir competências é virar as costas aos saberes? Revista Pátio, São Paulo, n.11, ano 3, p.15-19, 1999.
PIAGET, J. O desenvolvimento do pensamento: equilibração das estruturas cognitivas. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1977.
PIAGET, J. A formação do símbolo na criança. Rio de Janeiro: Zahar, 1975.
SMOLE S.; DINIZ, M.; CÂNDIDO, P. Brincadeiras infantis nas aulas de matemática. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000.
TOMAZINHO, R. As atividades e brincadeiras corporais na pré-escola: um olhar reflexivo. Dissertação de Mestrado. Universidade Presbiteriana Mackenzie, SãoPaulo, 2002.
VISCA, J. Clínica Psicopedagógica. Epistemologia convergente. Porto Alegre: Artes Médicas, 1987
*****************************************Diagnóstico Psicopedagógico: o desafio de montar um quebra-cabeças
Fernández (1990) afirma que o diagnóstico, para o terapeuta, deve ter a mesma função que a rede para um equilibrista. É ele, portanto, a base que dará suporte ao psicopedagogo para que este faça o encaminhamento necessário.
É um processo que permite ao profissional investigar, levantar hipóteses provisórias que serão ou não confirmadas ao longo do processo recorrendo, para isso, a conhecimentos práticos e teóricos. Esta investigação permanece durante todo o trabalho diagnóstico através de intervenções e da "...escuta psicopedagógica...", para que "...se possa decifrar os processos que dão sentido ao observado e norteiam a intervenção". (BOSSA, 2000, p. 24).
Na Epistemologia Convergente todo o processo diagnóstico é estruturado para que se possa observar a dinâmica de interação entre o cognitivo e o afetivo de onde resulta o funcionamento do sujeito (BOSSE, 1995, p. 80)
Conforme Weiss,
O objetivo básico do diagnóstico psicopedagógico é identificar os desvios e os obstáculos básicos no Modelo de Aprendizagem do sujeito que o impedem de crescer na aprendizagem dentro do esperado pelo meio social. (2003, p. 32 )
O diagnóstico possui uma grande relevância tanto quanto o tratamento. Ele mexe de tal forma com o paciente e sua família que, por muitas vezes, chegam a acreditar que o sujeito teve uma melhora ou tornou-se agressivo e agitado no decorrer do trabalho diagnóstico. Por isso devemos fazer o diagnóstico com muito cuidado observando o comportamento e mudanças que isto pode acarretar no sujeito.
Para ilustrar como o diagnóstico interfere na vida do sujeito e sua família, citaremos um exemplo de Weiss: uma paciente, uma adolescente de 18 anos cursando a 7ª série de escola especial, queixou-se à mãe que ela (Weiss) estava forçando-a a crescer. Ela conseguiu fazer a elaboração deste pensamento porque tinha medo de perder o papel na família da doente que necessitava de atenção exclusiva para ela. A família percebeu que isto realmente poderia acontecer e era isto também que sustentava seu casamento "já acabado". Concordou com a terapeuta em interromper o diagnóstico (2003, p. 33 ).
Bossa nos lembra que a forma de se operar na clínica para se fazer um diagnóstico varia entre os profissionais dependendo da postura teórica adotada. (p. 96, 2000).
Na linha da Epistemologia Convergente, Visca nos informa que o diagnóstico começa com a consulta inicial (dos pais ou do próprio paciente) e encerra com a devolução (1987, p. 69).
Antes de se iniciar as sessões com o sujeito faz-se uma entrevista contratual com a mãe e/ou o pai e/ou responsável, objetivando colher informações como:
- Identificação da criança: nome, filiação, data de nascimento, endereço, nome da pessoa que cuida da criança, escola que freqüenta, série, turma, horário, nome da professora, irmãos, escolaridades dos irmãos, idade dos irmãos.
- Motivo da consulta;
- Procura do Psicopedagogo: indicação;
- Atendimento anterior;
- Expectativa da família e da criança;
- Esclarecimento sobre o trabalho psicopedagógico.
- Definição de local, data e horário para a realização das sessões e honorários.
Visca propôs o seguinte Esquema Seqüencial Proposto pela Epistemologia Convergente:
Ações do entrevistador Procedimentos Internos do Entrevistador
EOCA
Testes
Anamnese
Elaboração do Informe 1º sistema de hipóteses
Linhas de investigação
Escolha de instrumentos
2º sistema de hipóteses
Linhas de investigação
Verificação e decantação do 2º sistema de hipótese.
Formulação do 3º sistema de hipóteses
Elaboração de uma imagem do sujeito (irrepetível) que articula a aprendizagem com os aspectos energéticos e estruturais, a-históricos e históricos que a condicionam.
(VISCA, 1991)
Observamos, no quadro acima, que ele propõe iniciar o diagnóstico com a EOCA e não com a anamnese argumentando que "... os pais, invariavelmente ainda que com intensidades diferentes, durante a anamnese tentam impor sua opinião, sua ótica, consciente ou inconscientemente. Isto impede que o agente corretor se aproxime 'ingenuamente' do paciente para vê-lo tal como ele é, para descobri-lo. (Id. Ibid., 1987, p. 70).
Os profissionais que optam pela linha da Epistemologia Convergente realizam a anamnese após as provas para que não haja "contaminação" pelo bombardeio de informações trazidas pela família, o que acabaria distorcendo o olhar sobre aquela criança e influenciando no resultado do diagnóstico.
Porém, alguns profissionais iniciam o diagnóstico com a anamnese. É o caso de Weiss. Compare abaixo o quadro da seqüência diagnóstica proposta por ela:
1º - Entrevista Familiar Exploratória Situacional (E.F.E.S.)
2º - Anamnese
3º - Sessões lúdicas centradas na aprendizagem (para crianças)
4º - Complementação com provas e testes (quando for necessário)
5º - Síntese Diagnóstica – Prognóstico
6º - Devolução - Encaminhamento
(WEISS, 1994)
Esta diferença não altera o resultado do diagnóstico, porém é preciso que o profissional acredite na linha em que escolheu para seu trabalho psicopedagógico.
Como o presente trabalho está baseado na Epistemologia Convergente abordaremos a anamnese ao final e iniciaremos falando sobre a EOCA.
A realização da EOCA tem a intenção de investigar o modelo de aprendizagem do sujeito sendo sua prática baseada na psicologia social de Pichón Rivière, nos postulados da psicanálise e método clínico da Escola de Genebra (BOSSA, 2000, p. 44).
Para Visca, a EOCA deverá ser um instrumento simples, porém rico em seus resultados. Consiste em solicitar ao sujeito que mostre ao entrevistador o que ele sabe fazer, o que lhe ensinaram a fazer e o que aprendeu a fazer, utilizando-se de materiais dispostos sobre a mesa, após a seguinte observação do entrevistador: "este material é para que você o use se precisar para mostrar-me o que te falei que queria saber de você" (VISCA, 1987, p. 72).
O entrevistador poderá apresentar vários materiais tais como: folhas de ofício tamanho A4, borracha, caneta, tesoura, régua, livros ou revistas, barbantes, cola, lápis, massa de modelar, lápis de cor, lápis de cera, quebra-cabeça ou ainda outros materiais que julgar necessários.
O entrevistado tende a comportar-se de diferentes maneiras após ouvir a consigna. Alguns imediatamente, pegam o material e começam a desenhar ou escrever etc. Outros começam a falar, outros pedem que lhe digam o que fazer, e outros simplesmente ficam paralisados. Neste último caso, Visca nos propõe empregar o que ele chamou de modelo de alternativa múltipla (1987, p. 73), cuja intenção é desencadear respostas por parte do sujeito. Visca nos dá um exemplo de como devemos conduzir esta situação: "você pode desenhar, escrever, fazer alguma coisa de matemática ou qualquer coisa que lhe venha à cabeça..." (1987, p. 73).
Vejamos o que Sara Paín nos fala sobre esta falta de ação na atividade "A hora do jogo" (atividade trabalhada por alguns psicólogos ou Psicopedagogos que não se aplica à Epistemologia Convergente, porém é interessante citar para percebermos a relação do sujeito com o objeto):
No outro extremo encontramos a criança que não toma qualquer contato com os objetos. Às vezes se trata de uma evitação fóbica que pode ceder ao estímulo. Outras vezes se trata de um desligamento da realidade, uma indiferença sem ansiedade, na qual o sujeito se dobra às vezes sobre seu próprio corpo e outras vezes permanece numa atividade quase catatônica. (1992, p. 53).
Piaget, em Psicología de la Inteligência, coloca que:
O indivíduo não atua senão quando experimenta a necessidade; ou seja; quando o equilíbrio se acha momentaneamente quebrado entre o meio e o organismo, a ação tende a reestabelecer este equilíbrio, quer dizer, precisamente, a readaptar o organismo... (PIAGET apud VISCA, 1991, p. 41).
De acordo com Visca, o que nos interessa observar na EOCA são "...seus conhecimentos, atitudes, destrezas, mecanismos de defesa, ansiedades, áreas de expressão da conduta, níveis de operatividade, mobilidade horizontal e vertical etc (1987, p. 73).
É importante também observar três aspectos que fornecerão um sistema de hipóteses a serem verificados em outros momentos do diagnóstico:
• A temática - é tudo aquilo que o sujeito diz, tendo sempre um aspecto manifesto e outro latente;
• A dinâmica - é tudo aquilo que o sujeito faz, ou seja, gestos, tons de voz, postura corporal, etc). A forma de pegar os materiais, de sentar-se são tão ou mais reveladores do que os comentários e o produto.
• O produto - é tudo aquilo que o sujeito deixa no papel.
(Id. Ibid., 1987, p. 74)
Visca (1987) observa que o que obtemos nesta primeira entrevista é um conjunto de observações que deverão ser submetidas a uma verificação mais rigorosa, constituindo o próximo passo para o processo diagnóstico.
É da EOCA que o psicopedagogo extrairá o 1º Sistema de hipóteses e definirá sua linha de pesquisa. Logo após são selecionadas as provas piagetianas para o diagnóstico operatório, as provas projetivas psicopedagógicas e outros instrumentos de pesquisa complementares.
Visca reuniu em seu livro: El diagnostico operatório em la practica psicopedagogica, as provas operatórias aplicadas no método clínico da Escola de Genebra por Piaget, no qual expõe sucintamente os passos em que usou com grupos de estudo e cursos para o ensino do diagnóstico psicopedagógico, comentando o porque de cada passo.
A aplicação das provas operatórias tem como objetivo determinar o nível de pensamento do sujeito realizando uma análise quantitativa, e reconhecer a diferenças funcionais realizando um estudo predominantemente qualitativo. (Id. Ibid., p. 11, 1995).
O autor nos alerta que as provas "...no siempre han sido adecuadamente entendidas y utilizadas de acuerdo com todas las posibilidades que las mismas poseen" (1995, p. 11). Isto se deve, talvez, a uma certa dificuldade de sua correta aplicação, evolução e extração das conclusões úteis para entender a aprendizagem.
Segundo Weiss:
As provas operatórias têm como objetivo principal determinar o grau de aquisição de algumas noções-chave do desenvolvimento cognitivo, detectando o nível de pensamento alcançado pela criança, ou seja, o nível de estrutura cognoscitiva com que opera (2003, p. 106).
Ela ainda nos alerta que não se deve aplicar várias provas de conservação em uma mesma sessão, para se evitar a contaminação da forma de resposta. Observa que o psicopedagogo deverá fazer registros detalhados dos procedimentos da criança, observando e anotando suas falas, atitude, soluções que dá às questões, seus argumentos e juízos, como arruma o material. Isto será fundamental para a interpretação das condutas.
Para a avaliação as respostas são divididas em três níveis:
• Nível 1: Não há conservação, o sujeito não atinge o nível operatório nesse domínio.
• Nível 2 ou intermediário: As respostas apresentam oscilações, instabilidade ou não são completas. Em um momento conservam, em outro não.
• Nível 3: As respostas demonstram aquisição da noção sem vacilação.
Muito interessante o que Weiss nos diz sobre as diferentes condutas em provas distintas:
...pode ocorrer que o paciente não obtenha êxito em apenas uma prova, quando todo o conjunto sugere a sua possibilidade de êxito. Pode-se ver se há um significado particular para a ação dessa prova que sofra uma interferência emocional: encontramos várias vezes crianças, filhos de pais separados e com novos casamentos dos pais, que só não obtinham êxito na prova de intersecção de classes. Podemos ainda citar crianças muito dependentes dos adultos que ficam intimidadas com a contra-argumentação do terapeuta, e passam a concordar com o que ele fala, deixando de lado a operação que já são capazes de fazer (2003, p. 111).
Em relação a crianças com alguma deficiência mental ela nos diz que:
No caso de suspeita de deficiência mental, os estudos de B. Inhelder (1944) em El diagnóstico del razonamiento en los débiles mentales mostram que os oligofrênicos (QI 0-50) não chegam a nenhuma noção de conservação; os débeis mentais (QI 50-70) chegam a ter êxito na prova de conservação de substância; os fronteiriços (QI 70-80) podem chegar a ter sucesso na prova de conservação de peso; os chamados de inteligência normal "obtusa" ou "baixa", podem obter êxito em provas de conservação de volume, e às vezes, quando bem trabalhados, podem atingir o início do pensamento formal (2003, p.111-112).
Visca também reuniu em um outro livro: Técnicas proyetivas psicopedagogicas, as provas projetivas, cuja aplicação tem como objetivo investigar os vínculos que o sujeito pode estabelecer em três grandes domínios: o escolar, o familiar e consigo mesmo, através dos quais é possível reconhecer três níveis em relação ao grau de consciência dos distintos aspectos que constituem o vínculo de aprendizagem.
Sobre as provas projetivas Weiss observa que:
O princípio básico é de que a maneira do sujeito perceber, interpretar e estruturar o material ou situação reflete os aspectos fundamentais do seu psiquismo. É possível, desse modo, buscar relações com a apreensão do conhecimento como procurar, evitar, distorcer, omitir, esquecer algo que lhe é apresentado. Podem-se detectar, assim, obstáculos afetivos existentes nesse processo de aprendizagem de nível geral e especificamente escolar (2003, p. 117)
Para Sara Paín, o que podemos avaliar através do desenho ou relato é a capacidade do pensamento para construir uma organização coerente e harmoniosa e elaborar a emoção. Também permitirá avaliar a deteriorização que se produz no próprio pensamento. Esta autora ainda nos diz que o pensamento fala através do desenho onde se diz mal ou não se diz nada, o que oferece a oportunidade de saber como o sujeito ignora (1992, p. 61).
De acordo com a Epistemologia Convergente, após a aplicação das provas operatórias e das técnicas projetivas o psicopedagogo levantará o 2º Sistema de hipóteses e organizará sua linha de pesquisa para a anamnese que, como já vimos, terá lugar no final do processo diagnóstico, de modo a não contaminar previamente a percepção do avaliador.
Weiss nos diz que:
As observações sobre o funcionamento cognitivo do paciente não são restritas às provas do diagnóstico operatório; elas devem ser feitas ao longo do processo diagnóstico. Na anamnese verifica-se com os pais como se deu essa construção e as distorções havidas no percurso;... (2003, p.106).
A anamnese é uma das peças fundamentais deste quebra-cabeça que é o diagnóstico. Através dela nos serão reveladas informações do passado e presente do sujeito juntamente com as variáveis existentes em seu meio. Observaremos a visão da família sobre a história da criança, seus preconceitos, expectativas, afetos, conhecimentos e tudo aquilo que é depositado sobre o sujeito.
... toda anamnese já é, em si, uma intervenção na dinâmica familiar em relação à "aprendizagem de vida". No mínimo se processa uma reflexão dos pais, um mergulho no passado, buscando o início da vida do paciente, o que inclui espontaneamente uma volta à própria vida da família como um todo (Id. Ibid., 2003, p. 63).
Segundo Weiss, o objetivo da anamnese é "colher dados significativos sobre a história de vida do paciente" (2003, p. 61).
Consiste em entrevistar o pai e/ou a mãe, ou responsável para, a partir disso, extrair o máximo de informações possíveis sobre o sujeito, realizando uma posterior análise e levantamento do 3º sistema de hipóteses. Para isto é preciso que seja muito bem conduzida e registrada.
O psicopedagogo deverá deixá-los à vontade "... para que todos se sintam com liberdade de expor seus pensamentos e sentimentos sobre a criança para que possam compreender os pontos nevrálgicos ligados à aprendizagem". (Id. Ibid., 2003, p. 62).
Deixá-los falar espontaneamente permite ao psicopedagogo avaliar o que eles recordam para falar, qual a seqüência e a importância dos fatos. O psicopedagogo deverá complementar ou aprofundar.
Conforme Weiss, em alguns casos deixa-se a família falar livremente. Em outros, a depender das características da família, faz-se necessário recorrer a perguntas sempre que necessário. Os objetivos deverão estar bem definidos, e a entrevista deverá ter um caráter semidiretivo (2003, p. 64).
De acordo com Paín, a história vital nos permitirá "...detectar o grau de individualização que a criança tem com relação à mãe e a conservação de sua história nela" (1992, p. 42).
É importante iniciar a entrevista falando sobre a gravidez, pré-natal, concepção. Weiss nos informa que,
"A história do paciente tem início no momento da concepção. Os estudos de Verny (1989) sobre a Psicologia pré-natal e perinatal vêm reforçar a importância desses momentos na vida do indivíduo e, de algum modo, nos aspectos inconscientes de aprendizagem" (2003, p. 64).
Algumas circunstâncias do parto como falta de dilatação, circular de cordão, emprego de fórceps, adiamento de intervenção de cesárea, "costumam ser causa da destruição de células nervosas que não se reproduzem e também de posteriores transtornos, especialmente no nível de adequação perceptivo-motriz" (PAÍN, 1992, p. 43).
É interessante perguntar se foi uma gravidez desejada ou não, se foi aceito pela família ou rejeitado. Estes pontos poderão determinar aspectos afetivos dos pais em relação ao filho.
Posteriormente é importante saber sobre as primeiras aprendizagens não escolares ou informais, tais como: como aprendeu a usar a mamadeira, o copo, a colher, como e quando aprendeu a engatinhar, a andar, a andar de velocípede, a controlar os esfíncteres, etc. A intenção é descobrir "em que medida a família possibilita o desenvolvimento cognitivo da criança - facilitando a construção de esquemas e deixando desenvolver o equilíbrio entre assimilação e acomodação...". (WEISS, 2003, p.66).
É interessante saber sobre a evolução geral da criança, como ocorreram seus controles, aquisição de hábitos, aquisição da fala, alimentação, sono etc., se ocorreram na faixa normal de desenvolvimento ou se houve defasagens.
Se a mãe não permite que a criança faça as coisas por si só, não permite também que haja o equilíbrio entre assimilação e acomodação. Alguns pais retardam este desenvolvimento privando a criança de, por exemplo, comer sozinha para não se lambuzar, tirar as fraldas para não se sujar e não urinar na casa, é o chamado de hipoassimilação (PAÍN, 1992), ou seja, os esquemas de objeto permanecem empobrecidos, bem como a capacidade de coordená-los.
Por outro lado há casos de internalização prematura dos esquemas, é o chamado de hiperassimilação (PAÍN, 1992), pais que forçam a criança a fazer determinadas coisas das quais ela ainda não está preparada para assimilar, pois seu organismo ainda está imaturo, o que acaba desrealizando negativamente o pensamento da criança.
Sobre o que acabamos de mencionar Sara Paín nos diz que é interessante saber se as aquisições foram feitas pela criança no momento esperado ou se foram retardadas ou precoces. "Isto nos permite estabelecer um quociente aproximado de desenvolvimento, que se comparará com o atual, para determinar o deterioramento ou incremento no processo de evolução" (1992, p. 45).
A mesma autora aconselha insistirmos "... nas modalidades para a educação do controle dos esfíncteres quando apareçam perturbações na acomodação... " (1992, p. 42).
Weiss nos orienta também saber sobre a história clínica, quais doenças, como foram tratadas, suas conseqüências, diferentes laudos, seqüelas.
A história escolar é muito importante, quando começou a freqüentar a escola, sua adaptação, primeiro dia de aula, possíveis rejeições, entusiasmo, porque escolheram aquela escola, trocas de escola, enfim, os aspectos positivos e negativos e as conseqüências na aprendizagem.
Todas estas as informações essenciais da anamnese devem ser registradas para que se possa fazer um bom diagnóstico.
Encerrada a anamnese, o psicopedagogo levantará o 3º sistema de hipóteses. A anamnese deverá ser confrontada com todo o trabalho do diagnóstico para se fazer a devolução e o encaminhamento.
Devolução no dicionário é o ato de devolver, de dar de volta (ROCHA, 1996, p. 208). No sentido da clínica psicopedagógica a devolução é uma comunicação verbal, feita aos pais e ao paciente, dos resultados obtidos através de uma investigação que se utilizou do diagnóstico para obter resultados.
"... talvez o momento mais importante desta aprendizagem seja a entrevista dedicada à devolução do diagnóstico, entrevista que se realiza primeiramente com o sujeito e depois com os pais (quando se trata de uma criança, é claro)" (PAÍN, 1992, p. 72).
Segundo Weiss, no caso da criança, é preciso fazer a devolução utilizando-se de uma linguagem adequada e compreensível para sua idade para que não fique parecendo que há segredos entre o terapeuta e os pais, ou que o terapeuta os traiu (1992, p. 130).
É perfeitamente normal que, neste momento, exista muita ansiedade para todos os envolvidos no processo, seja o psicopedagogo, o paciente e os pais. Muitas vezes algumas suspeitas observadas ao longo do diagnóstico tendem a se revelar no momento da devolução, "ficam evidentes nestas falas as fantasias que chegam ao momento da devolução, e que estiveram presentes durante todo o processo diagnóstico" (Id. Ibid., 2003, p. 130).
Alguns pais chegam à devolução sem terem consciência ou camuflam o que sabem sobre seu filho. É preciso tomar consciência da situação e providenciar suas transformações, caso contrário, não será possível realizar um contrato de tratamento.
Weiss orienta organizar os dados sobre o paciente em três áreas: pedagógica, cognitiva e afetivo-social, e posteriormente rearrumar a seqüência dos assuntos a serem abordados, a que ponto dará mais ênfase. É necessário haver um roteiro para que o psicopedagogo não se perca e os pais não fiquem confusos. Tudo deve ser feito com muito afeto e seriedade, passando segurança. Os pais, assim, muitas vezes acabam revelando algo neste momento que surpreende e acaba complementando o diagnóstico.
É importante que se toque inicialmente nos aspectos mais positivos do paciente para que o mesmo se sinta valorizado. Muitas vezes a criança já se encontra com sua auto-estima tão baixa que a revelação apenas dos aspectos negativos acabam perturbando-o ainda mais, o que acaba por inviabilizar a possibilidade para novas conquistas.
Depois deverão ser mencionados os pontos causadores dos problemas de aprendizagem.
Posterior a esta conduta deverá ser mencionada as recomendações como troca de escola ou de turma, amenizar a super-proteção dos pais, estimular a leitura em casa etc, e as indicações que são os atendimentos que se julgue necessário como psicopedagogo, fonoaudiólogo, psicólogo, neurologista etc.
Em casos de quadros psicóticos, neuroses graves ou outras patologias, é necessário um tratamento psicoterápico inicial, até que o paciente atinja um ponto tal que tenha condições de perceber a sua própria necessidade de aprender e crescer no que respeita à escolaridade; é preciso que se instale nele o desejo de aprender (Weiss, 2003, p. 136).
Muitas vezes faz-se necessário o encaminhamento para mais de um profissional. E isto complica quando a família pertence a um baixo nível socioeconômico. É importante que no momento da devolução o psicopedagogo tenha algumas indicações de instituições particulares e públicas que ofereçam serviços gratuitos ou com diferentes formas pagamento. Isto evita que o problema levantado pelo diagnóstico não fique sem uma posterior solução.
O informe é um laudo do que foi diagnosticado. Ele é solicitado muitas vezes pela escola, outros profissionais etc. Quaisquer que sejam os solicitantes é importante não redigir o mesmo laudo, pois existem informações que devem ser resguardadas, ou seja, para cada solicitante deve-se redigir informações convenientes. Sua finalidade é "resumir as conclusões a que se chegou na busca de respostas às perguntas que motivaram o diagnóstico" (Id. Ibid., 2003, p. 138).
A mesma autora sugere o seguinte roteiro para o informe:
I. Dados pessoais;
II. Motivo da avaliação - encaminhamento;
III. Período da avaliação e número de sessões;
IV. Instrumentos usados;
V. Análise dos resultados nas diferentes áreas: pedagógica, cognitiva, afetivo-social, corporal.
VI. Síntese dos resultados - hipótese diagnóstica;
VII. Prognóstico;
VIII. Recomendações e indicações;
IX. Observações: acréscimo de dados conforme casos específicos.
Bibliografia:
BOSSA, Nadia A. A psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática. Porto Alegre, Artes Médicas, 2000.
______________. Dificuldades de Aprendizagem: O que são? Como Tratá-las? Porto Alegre, Artes Médicas Sul, 2000.
BOSSE, Vera R. P. O material disparador - considerações preliminares de uma experiência clínica psicopedagógica. In: Psicopedagogia, Rev 14 (33), São Paulo, 1995.
DOLLE, Jean-Marie. Essas crianças que não aprendem: diagnóstico e terapias cognitivas. Petrópolis, rio de Janeiro, Vozes, 2002.
PAÍN, Sara. Diagnóstico e tratamento dos problemas de aprendizagem. Porto Alegre, Artes Médica, 1985.
RUBINSTEIN, Edith. A especificidade do diagnóstico psicopedagógico in Sisto, Fermino Fernandes...[et al.]. Atuação Psicopedagógica e Aprendizagem Escolar - Petrópolis, RJ, Vozes, 2002.
VISCA, Jorge. Clínica Psicopedagógica. Epistemologia Convergente. Porto Alegre, Artes Médicas, 1987.
___________. Psicopedagogia: novas contribuições; organização e tradução Andréa Morais, Maria Isabel Guimarães - Rio de Janeiro: Nova Fronteira,1991.
___________. El diagnostico operatorio em la practica psicopedagogica. Buenos Aires, Ag.Serv,G,. 1995.
___________. Técnicas proyetivas psicopedagogicas. Buenos Aires, Ag. Serv.G., 1995.
WEISS, M. L. L. Psicopedagogia Clínica: uma visão diagnóstica dos problemas de aprendizagem escolar. Rio de Janeiro, DP&A, 2003.
***********************************************RECURSOS A SEREM USADOS NO DIAGNÓSTICO E INSTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
I. Introdução
Preocupações com os recursos que podem ser utilizados no diagnóstico e intervenção psicopedagógica são constantes na tocante à Psicopedagogia, principalmente porque ela ainda não se constituiu uma profissão é, portanto, uma área de prestação de serviços, embora a Associação Brasileira de Psicopedagogia esteja empenhando-se para seu reconhecimento enquanto profissão regulamentada.
Considerando que os candidatos a cursos de psicopedagogia possuem formação acadêmica diversificada oriunda de vários cursos de graduação, como por exemplo Pedagogia, Letras, Fonoaudiologia, Matemática, Psicologia e áreas afins e visto que, os cursos de pós-graduação nesta área não delimitam a graduação dos candidatos, portanto, atendem clientelas diversificadas, ainda que o tempo de duração dos cursos de Pós variam de instituição para instituição, a preocupação com os recursos a serem utilizados na Psicopedagogia é necessária já que alguns psicopedagogos tendem a usar recursos específicos da Psicologia, sem serem formados para tanto. Neste sentido, a questão demanda reflexão é o que se propõe nesta pesquisa.
2. O que é psicopedagogia
Para SISTO (1996) é uma área de estudos que trata da aprendizagem escolar, quer seja no curso normal ou nas dificuldades. CAMPOS (1996), considera que os problemas de aprendizagem constituem-se no campo da Psicopedagogia.
A Psicopedagogia é vista por SOUZA (1996), como área que investiga a relação da criança com o conhecimento.
O Código de Ética da Psicopedagogia, no Capítulo I, Artigo 1 º, afirma que "A Psicopedagogia é campo de atuação em saúde e educação o qual lida com o conhecimento, sua ampliação, sua aquisição, distorções, diferenças e desenvolvimento por meio de múltiplos processos" .
A Psicopedagogia é uma área de estudos nova que pode e está atendendo os sujeitos que apresentam problemas de aprendizagem. Segundo BOSSA (1994), a Psicopedagogia nasce com o objetivo de atender a demanda - dificuldades de aprendizagem.
Segundo FERREIRA (1982, p. 1412), Psicopedagogia "é o estudo da atividade psíquica da criança e dos princípios que daí decorrem, para regular a ação educativa do indivíduo". Neste sentido, a Psicóloga e Psicopedagoga Nádia A. BOSSA (1995) considera que o termo Psicopedagogia parece deixar claro que se trata de uma aplicação da Psicologia à Pedagogia: por isso esta definição não reflete o verdadeiro significado do termo.
De fato, a Psicopedagogia vai além da aplicação da Psicologia à Pedagogia, pois ela não pode ser vista sem o caráter interdisciplinar BORGES (1994) e SOUZA (1996), o qual implica na dependência da contribuição teórico prática de outras áreas de estudos para se constituir como tal. Por outro lado, a Psicopedagogia não é "o estudo da atividade psíquica da criança e dos princípios que daí decorrem,..." , visto que ela não se limita à aprendizagem da criança, mas abrange todo processo de aprendizagem. Conseqüentemente, inclui quem está aprendendo, independente de ser criança, adolescente ou adulto.
"A Psicopedagogia é um campo de atuação em Saúde e Educação que lida com o Conhecimento, sua ampliação, sua aquisição, distorções, diferenças e desenvolvimento por meio de múltiplos processos..." .
Nesta definição, enfatiza-se a Saúde e a Educação como campo de atuação da Psicopedagogia, também, limita-o à Cognição, refere-se a múltiplos processo, mas não esclarece se "múltiplos processos" são as múltiplas técnicas de diagnóstico e intervenção dos problemas de aprendizagem.
Com a reformulação do Código de Ética em 1996, a conceituação de Psicopedagogia sofre alteração, passando ser a seguinte:
"... campo de atuação em Educação e Saúde que lida com o processo de aprendizagem humana; seus padrões normais e patológicos, considerando a influência do meio - família, escola e sociedade - no seu desenvolvimento, usando procedimentos próprios da Psicopedagogia". ( Cap. I; Artigo 1º).
Continua afirmando que a Psicopedagogia é uma área de atuação que engloba saúde e educação, também limita o campo de atuação à cognição, destacando que envolve os padrões normais e patológicos da aprendizagem, ainda, enfatiza a influência do meio (família, escola e sociedade).
A definição de Psicopedagogia apresentada pelo Código de Ética do psicopedagogo, portanto, uma decisão tomada em consenso pelos membros da Associação Brasileira de Psicopedagogia enfatiza que esta é um campo de atuação. Se a Psicopedagogia é conceituada como campo de atuação e não como profissão, qual é sua validade?
Nádia Aparecida BOSSA (1994, p. 01), psicopedagoga, (em sua tese de mestrado em Psicologia da Educação na PUC , em abril de 1993), afirma que "...no momento, a validade da Psicopedagogia, como corpo teórico organizado, não lhe assegura a qualidade de saber cientifico, devendo-se fazer realmente ainda muito no sentido de ela sair da esfera empírica e poder vir a estruturar-se como tal...".
Segundo a autora, a Psicopedagogia, ainda está construindo seu corpo teórico, portanto se constituindo como ciência. Assim sendo, a Psicopedagogia é uma área de estudos muito nova, portando pode ser vista com desconfiança por alguns. Por outro lado, o fato de ser jovem, permite que se construa para atender os problemas enfrentados no processo ensino-aprendizagem
São crescentes os problemas referentes às dificuldades de aprendizagem no Brasil. A Pedagogia embasada em teóricos conceituados como Piaget, Vygotsky, Freinet, Ferreiro, Teberosky e outros, tem sido insuficiente para prevenir ou intervir nas dificuldades de aprendizagem. Para tanto, a Psicopedagogia surge para auxiliar na intervenção e prevenção dos problemas de aprendizagem.
BOSSA(1994) afirma que os problemas de aprendizagem possuem origem na constituição do desejo do sujeito. As explicações para o fracasso escolar tem sido dadas com justificativa na desnutrição, nos problemas neurológicos e genéticos. Poucas são as explicações que enfatizam as questões inorgânicas, ou seja, as de ordem do desejo do sujeito.
Contudo, para entender os problemas de aprendizagem realizar diagnósticos e intervenções torna-se necessário considerar os fatores tanto internos quanto externos desse sujeito, não devendo ser ignoradas as causas exógenas e endógenas.
Os cursos de Pós-Graduação, os quais dão formação teórica e às práticas (com estágios), aos estudantes enfatizam o caráter interdisciplinar desta atuação, pois este enfoque exige a integração de profissionais de diversas áreas, tanto para o enfoque preventivo quanto para o terapêutico.
Ressalta BOSSA (1998,p8) que "os psicopedagogos têm construído sua teoria a partir do estudo dos problemas de aprendizagem. E a clínica tem se constituído em eficiente laboratório da teoria".
Tanto na clínica quanto na instituição, o psicopedagogo atua intervindo como mediador entre o sujeito e sua história traumática, ou seja, a história que lhe causou a dificuldade de aprender. No entanto, o profissional não deve fazer parte do contexto do sujeito, já que ele está contido numa dinâmica familiar, escolar ou social da qual o profissional deve manter-se ciente do problema de aprendizagem, fazer a leitura e a intervenção no mesmo. Assim, com o auxílio do psicopedagogo, o sujeito pode reelaborar sua história de vida reconstruindo fatos que estavam fragmentados e retomar o percurso normal de sua aprendizagem.
Neste ângulo, o trabalho clínico do psicopedagogo se completa com a relação entre o sujeito, sua historia pessoal e a sua modalidade de aprendizagem. Já o trabalho preventivo objetiva "evitar" os problemas de aprendizagem, enfatizando a instituição escolar, os processos didáticos e metodológicos, a dinâmica institucional com todos profissionais nela inseridos.
A sustentação do trabalho psicopedagógico ocorre através das diversas áreas do conhecimento humano. Eis algumas delas : Psicologia, Pedagogia, Psicanálise, Psicologia genética, Lingüística.
Neste sentido, ressalta BOSSA(1998,p.8), que "A psicopedagogia vem constituindo seu corpo teórico na articulação da psicanálise e psicologia genética. Articulação que fica evidente quando se trata de observar os problemas de aprendizagem, pilar da teoria da psicopedagogia
Para Psicopedagogia é fundamental que o profissional faça uso do trabalho interdisciplinar; pois os conhecimentos específicos das diversas teorias contribuem para o resultado eficiente da intervenção ou prevenção psicopedagógica. Por exemplo, a Psicanálise pode fornecer embasamento para compreender o mundo inconsciente do sujeito; a Psicologia Genética proporciona condições para analisar o desenvolvimento cognitivo do sujeito; a Psicologia possibilita compreender o mundo físico e psíquico do sujeito; a Lingüística permite entender o processo de aquisição da linguagem, tanto oral quanto escrita
Nestas áreas encontramos autores renomados que contribuem para o crescimento da Psicopedagogia , tanto em nível preventivo quanto em nível clínico.
Em nível preventivo, segundo BOSSA (1994), a Psicopedagogia tenta detectar perturbações no processo ensino - aprendizagem, conhecer a dinâmica da instituição educativa, orientar a instituição quanto à metodologia de ensino utilizada. Isto, através de orientação de estudos e apropriação dos conteúdos escolares
Pode-se concluir que o campo de atuação do psicopedagogo é a aprendizagem, sua intervenção é preventiva e curativa, pois se dispõe a detectar problemas de aprendizagem e "resolvê-los", também, preveni-los evitando que surjam outros.
No enfoque preventivo, BOSSA(1994), enfatiza que a função do psicopedagogo é detectar possíveis problemas no processo ensino-aprendizagem; participar da dinâmica das relações da comunidade educativa, objetivando favorecer processos de integração e trocas; promover; realizar orientações metodológicas para o processo ensino-aprendizagem, considerando as características do indivíduo ou grupo; colocar em prática processo de orientação educacional, vocacional e ocupacional em grupo ou individual.
Neste sentido, cabe questionar como o psicopedagogo atua para detectar e intervir nos problemas de aprendizagem?
3. Diagnóstico psicopedagógico
O psicopedagogo usa o diagnóstico psicopedagógico para detectar os problemas de aprendizagem.
RUBINSTEIN (1996) compara diagnóstico psicopedagógico a um processo de investigação, onde o psicopedagogo assemelha-se um a detetive a procura de pistas, selecionando-as e centrando-se na investigação de todo processo de aprendizagem, levando-se em conta a totalidade dos fatores envolvidos neste processo.
Afirma ela que o diagnóstico psicopedagógico é em si mesmo uma intervenção, pois o psicopedagogo tem que interagir com o cliente, a família, e a escola, partes envolvidas na dinâmica do problema de aprendizagem.
A autora (1996,p128) ilustra que " durante e após o processo diagnóstico serão construídos um conhecimento e uma compreensão a respeito do processo de aprendizagem". Isto permite que o psicopedagogo tenha maior clareza a respeito dos objetivos a serem alcançados no atendimento psicopedagógico.
O diagnóstico psicopedagógico clínico, segundo a estudiosa (1996, p.134) deve concentrar sua ação no sentido de "... levantar hipóteses, verificar o potencial de aprendizagem, mobilizar o aprendiz e o seu entorno (família e escola) no sentido da construção de um olhar sobre o não aprender RUBINSTEIN.
Quais recursos o psicopedagogo usa para realizar o diagnóstico e a intervenção psicopedagógica?
O Código de Ética da Psicopedagogia , em seu (Capítulo I - Dos Princípios - Artigo 1º) afirma que o psicopedagogo pode utilizar procedimentos próprios da Psicopedagogia. Neste sentido, realizando o diagnóstico psicopedagógico, o psicopedagogo está utilizando procedimentos próprio de sua área de atuação. No artigo 2º , enfatiza-se o caráter interdisciplinar da Psicopedagogia, destaca o uso de recursos das várias áreas do conhecimento humano para a compreensão do ato de aprender, também, menciona o uso de métodos e técnicas próprias.
RUBINSTEIN (1996) destaca que o psicopedagogo pode usar como recursos a entrevista com a família; investigar o motivo da consulta; realizar procurar a história de vida da criança realizando Anamnese; entrevistar o cliente; fazer contato com a escola e outros profissionais que atendam a criança; manter os pais informados do estado da criança e da intervenção que está sendo realizada; realizar encaminhamento para outros profissionais, quando necessário.
Os recursos apontados por RUBINSTEIN (1996) constituem-se em instrumentos para a realização do diagnóstico e intervenção psicopedagógica. Porém, BOSSA (1994), destaca outros recursos para o diagnóstico psicopedagógico, referindo-se a Provas de Inteligência (Wisc); Testes Projetivos; Avaliação perceptomotora (Teste Bender); Teste de Apercepção Infantil (CAT.); Teste de Apercepção Temática(TAT.); também, refere-se a Provas de nível de pensamento (Piaget); Avaliação do nível pedagógico ( nível de escolaridade); Desenho da família;Desenho da figura Humana;H.T.P - Casa, Arvore e Pessoa (House, Tree, Person); Testes psicomotores: Lateralidade; Estruturas rítmicas ..
A autora, assim como FERNÁNDEZ (1991) e PAÍN (1985) sugere, ainda, o uso de jogos considerando que o sujeito através deles pode manifestar, sem mecanismos de defesa, os desejos contidos em seu inconsciente. Além do mais, no enfoque psicopedagógico os jogos representam situações-problemas a serem resolvidas, pois envolvem regras, apresentam desafios e possibilita observar como o sujeito age frente a eles, qual sua estrutura de pensamento, como reage diante de dificuldades. Levando-se em conta que o sujeito possui poucos recursos (vocabulário, por exemplo) para se comunicar, expressar o que sente, o que deseja, pode fazer uso de jogos, desenhos e brincadeiras para manifestar o que sente. Sendo assim, cabe ao psicopedagogo estar atento para fazer a leitura e análise das mensagens que o sujeito está lhe enviando.
Quanto ao uso de testes, BOSSA (1994), não apresenta restrições quanto ao uso quanto ao uso dos instrumentos a que ela se refere para o diagnóstico psicopedagógico. Alguns são testes são de uso exclusivo de psicólogos, como as Provas de Inteligência (Wisc),Testes Projetivos, Avaliação perceptomotora (Teste Bender), Teste de Apercepção Infantil (CAT.), Teste de Apercepção Temática(TAT.). Porém, a autora chama atenção para as recomendações dos autores dos testes, como no CAT Infantil, no manual, afirma-se que o mesmo poderá ser aproveitado por por psiquiatras, psicanalistas, psicólogos, assistentes sociais e professores.
Considerando que há um grande receio por parte dos psicólogos e Conselho Federal de Psicologia ( CFP), que profissionais não formados em psicologia façam uso de testes ditos específicos da psicologia, principalmente, os que medem o nível de inteligência e testes projetivos, a leitura atenta às indicações dos autores quanto ao uso dos mesmos pode evitar posturas anti-éticas no que se refere a relações com outros profissionais, em especial com os da área da Psicologia.
Ainda, salienta BOSSA(1994, p.51), que a legislação que regulamenta a profissão de psicólogo a Lei nº 4119, de 27 de agosto de 1962 não especifica quais são os testes quais são os testes específico de uso dos psicólogos.
Para evitar tal fato, o psicopedagogo pode ser criativo e desenvolver atividades que possibilitem observar os aspectos da inteligência e da projeção e, se o profissional achar que os testes psicológicos são importantíssimos para concluir um diagnóstico, pode encaminhar o cliente para uma avaliação psicológica, efetivando um trabalho mulitidisciplinar .
Considerando que a Psicopedagogia é uma área multidisciplinar, deve o psicopedagogo desenvolver trabalhos integrado com outros profissionais, respeitando o seu cliente e resguardando, para os psicólogos, a exclusividade do uso dos testes psicológicos, pois a Psicopedagogia conta com uma série de recursos que permite ao psicopedagogo desenvolver seu trabalho em harmonia com outras áreas do conhecimento humano, trabalhando nos estritos limites das atividades que lhes são concedidas, conforme aponta o Capítulo III do Código de Ética. .
4.0. Recursos para o diagnóstico e intervenção psicopedagógico
O diagnóstico psicopedagógico, segundo RUBINSTEIN (1996), possui uma dinâmica muito particular, fazendo com que o psicopedagogo participe ativamente do processo psicopedagógico, contrariando os padrões onde o terapeuta adota uma atitude estática diante da dinâmica do caso.
A conduta dinâmica proposta por RUBINSTEIN no diagnóstico psicopedagógico é a Avaliação Assistida.
LINHARES (1995,p.23), refere-se à avaliação assistida como sendo a "combinação entre avaliar e intervir ensinando diretamente o examinando durante o processo de avaliação"
A avaliação assistida ou avaliação dinâmica, está fundamentada na teoria sócio-construtivista proposta por VYGOTSKY, a qual aborda a "aprendizagem mediada e a zona de desenvolvimento proximal".
Na aprendizagem mediada, LINHARES (1995) enfatiza que os eventos são selecionados, ordenados, filtrados e dotados de significado específico por agentes mediadores, com o objetivo de modificar o repertório das crianças e estimular a manifestação de níveis mais elevados de funcionamento, com o objetivo da criança revelar seu potencial para a aprendizagem.
Este conceito de aprendizagem mediada influenciou a avaliação do desempenho intelectual, e vários estudiosos propuseram maior ênfase no potencial de aprendizagem do que no desempenho real. Este novo enfoque está fundamentado na Teoria de VYGOTSKY, precisamente em seu conceito de "zona de desenvolvimento proximal". Neste sentido, o "examinador" verifica a convergência entre desenvolvimento e aprendizagem.
A diferença entre avaliação assistida e a avaliação padronizada, segundo LINHARES, está no fato de que a primeira se caracteriza pelo fator dinâmico, já a segunda se caracteriza como estática.
O quadro abaixo mostras as características entre ambas avaliações.
Avaliação Assistida Avaliação Padronizada
Dinâmica Estática
É flexível Possui instruções padronizadas.
Valoriza o conhecimento adquirido e resolução de problemas. O "avaliador" possui comportamento pautado pelo manual do teste.
Dá ênfase em como o conhecimento é adquirido. Valoriza produtos de aprendizagem
Resultados Resultados
Indicadores do processo de aprendizagem Comparar indivíduos baseando-se em seus escores com grupos de referência.
TABELA 1: Comparação entre Avaliação Assistida e Padronizada.
Para LINHARES (1995) deve-se levar em conta quatro dimensões para caracterizar a avaliação assistida, as quais são compostas pela Interação (onde as ações são compartilhadas entre os sujeitos envolvidos); Método (pode ser estruturado de acordo com o grau de interação entre o sujeito e o examinador, ainda na maneira de incorporar as intervenções de ajuda no processo da avaliação, podendo ser clínico ou estruturado); conteúdo que se deseja ensinar; Foco (é o desempenho potencial revelado através da condição de assistente).
Com relação ao método, LINHARES(1995) destaca que como as intervenções de ajuda no método clínico são menos sistematizadas, assim como as intervenções se processam de modo flexível ao longo da avaliação, então fica difícil separar o desempenho inicial de base (que ocorre sem ajuda) do desempenho potencial (que pode ocorrer através da mediação). Deste modo, o método clínico permite a avaliação qualitativa mais geral do desempenho do examinado, enquanto que o método estruturado, envolve a intervenção de ajuda mais sistematizada. Nele pode-se estabelecer uma estruturação no processo de avaliação. Separa-o em fases que se diferenciam pelo fato de serem sem assistência ao educando e com assistência.
Na fase de ajuda, no método estruturado é prevista a direção que se pode tomar. Mas, pode variar a forma e a quantidade de ajuda oferecida.
Em relação ao conteúdo, LINHARES (1995) destaca que com a avaliação assistida pode-se avaliar as habilidades de domínio geral cognitivo: operações cognitivas e raciocínio; as habilidades de domínio específico como a compreensão da leitura, consciência fonológica e habilidades aritméticas.
Como o Foco é o desempenho do potencial da criança revelado através da condição de assistência que se dá ao educando. Através do foco, pode-se identificar a região de sensibilidade à instrução do examinado; a velocidade de aprendizagem e a amplitude de transferência; crianças com alto escores que apresentam bom desempenho na fase de investigação, independente da assistência; estimular a localização do desenvolvimento potencial na zona de desenvolvimento proximal.
Levando em conta as características da avaliação assistida, LINHARES (1995, p.29), considera que " a avaliação assistida parece ser uma modalidade de avaliação promissora, especialmente para crianças classificadas como deficientes mentais ou referidas como apresentando dificuldades de aprendizagem".
Outra recurso para o diagnóstico psicopedagógico é a LPAD (Learning Potencial Assessment Device).
Tanto RUBINSTEIN (1996) quanto LINHARES (1995), referem-se a LPAD (Learning Potencial Assessment Device) proposto por FEUERSTEIN (1996), como sendo um método dinâmico de caráter diagnóstico para avaliar o potencial cognitivo dos sujeitos com problemas de aprendizagem.
RUBINSTEIN (1996), destaca que FEUERSTEIN considera os métodos tradicionais de avaliação insuficientes para avaliar a capacidade de aprendizagem dos indivíduos, enquanto que LINHARES aponta o LPAD como sendo o instrumento dinâmico para avaliar o potencial cognitivo, incluindo o mapeamento das funções cognitivas deficientes. Ela, ainda enfatiza um segundo material desenvolvido por FEUERSTEIN o PEI (Instrumental Enrichment), o qual visa a modificabilidade cognitiva estrutural, combatendo e corrigindo funções cognitivas abrangentes que instalam, reforçam os princípios cognitivos fundamentais ao nível operacional abstrato.
4.1 O LPAD (The Learning Potencial Assesment Device)
O LPAD (The Learning Potencial Assesment Device) criado por Feuerstein em 1972, é considerado um teste dinâmico, cujas variáveis mais relevantes são os mecanismos pessoais que o sujeito articula, na sua interação com o meio, o que determina o seu potencial cognitivo.
Segundo Feuerstein, esse procedimento de avaliação, o LPAD, apresenta quatro diferenças básicas dos testes psicométricos tradicionais:
1. Modifica para o examinador a situação de neutralidade na aplicação do teste: o examinador torna-se um "mediador", que poderá estimar o potencial de aprendizagem de seu aluno, observando o que este consegue fazer sozinho e depois com sua ajuda, à medida que as dificuldades emergem nas tarefas propostas.
Ao estimular o aluno a vencer as dificuldades observadas, o professor-mediador neutraliza as situações de fracasso, demonstrando para o aluno que a situação de aprendizagem poderá ser agradável e proveitosa.
2. Apresenta mudanças na estrutura do teste: a estrutura do teste deve favorecer a apresentação gradual e bem seqüenciada das propostas de aprendizagem. Dessa forma, o professor-mediador criará uma situação de aprendizagem com experimentadas dificuldades, mas sob um clima de apoio o encorajamento.
Assim, o material de avaliação bem organizado, com etapas de dificuldades estudadas, possibilita ao professor acompanhar os recursos utilizados e as transformações que ocorrem no pensamento desses alunos diante da situação problema trabalhada.
Segundo Gunzburg(1973) e Case(1972) , uma avaliação bem planejada será aquela que proporcionará ao aluno o encorajamento para superar as dificuldades apresentadas no decorrer de seu processo. Assim, as diferentes estratégias utilizadas como recursos pelo aluno para realizar atividades propostas serão extremamente importantes na identificação e estimulação do seu potencial cognitivo.
3. Transforma o produto esperado do teste em um processo de orientação. Assim, os objetivos da avaliação passam a focar mudanças ocorridas no processo de aprendizagem. Essa abordagem dinâmica para a avaliação auxilia o professor-mediador a construir processos de remediação para a aprendizagem a partir de sua interação direta com o aluno.
Segundo Feuerstein, toda interpretação do desenvolvimento humano deverá priorizar a interpretação da forma como o indivíduo utiliza seu potencial cognitivo e soluciona os seus problemas do cotidiano.
4. A exigência de uma mudança na interpretação dos dados recolhidos na avaliação. Haverá um ênfase maior nos sucessos do aluno durante o processo. As técnicas tradicionais de avaliação acabam enfatizando e medindo a dificuldade e a performance medíocre do aluno. Assim, as respostas positivas e os sucessos obtidos pelo aluno, durante o processo de avaliação, funcionariam como indicadores de seu potencial de aprendizagem e indicariam uma pista para o contato com as funções psicológicas superiores desse aluno.
Portanto, essas quatro características apresentadas por Feuerstein na estruturação do LPAD exigiram um procedimento de avaliação diferenciado, sendo necessário que se sejam apresentadas as tarefas à crianças e que seja feita observação a respeito da forma como ele se comporta diante da tarefa e a soluciona, sem contar inicialmente com o auxílio do avaliador. Durante a aplicação da atividade deverá ser realizada a mediação da tarefa à criança objetivando auxiliar o indivíduo na identificação da proposta da tarefa e na sua execução organizada.
Quanto a este fato, Feuerstein afirma ser possível definir as habilidades cognitivas desse sujeito examinado e descobrir as suas formas de ação para solucionar problemas. Assim, poderão definir rotas alternativas de trabalho que poderão enriquecer e até modificar a sua "inteligência global".
Neste aspecto Feuerstein ressalta, no entanto, a importância de se criar um clima amistoso de confiabilidade entre o avaliador e o aluno, para que se evitem tensões, desistências e, por conseqüência, a desmotivação diante das dificuldades apresentadas.
Os déficits encontrados nessa análise dizem respeito à impulsividade do indivíduo diante de problemas propostos em decorrência da sua desorganização exploratória e das suas dificuldades nas habilidades comparativas, que envolveriam seu campo perceptual e interativo com o meio.
Ao analisar as dificuldades do aluno durante o processo de aprendizagem, Feuerstein afirma que muitos indivíduos considerados rebaixados cognitivamente, deveriam ser considerados "operadores retardados", e suas habilidades cognitivas poderão ser melhoradas qualitativamente, mesmo na fase mais tardia da adolescência ou na fase adulta. Isto seria possível graças a uma ativa e adequada mediação nos processos de aprendizagem.
Depois de apresentar a atividade à criança, observar como ela a realiza e realizar a mediação da atividade, Feuerstein propõe novamente a realização da tarefa para saber se o indivíduo avaliado poderá obter sucesso na proposta apresentada, demonstrando que ocorreu a aprendizagem, mas não como um processo acumulativo de informações e conceitos, e sim como um processo de reconstrução de seus esquemas cognitivos.
Para Feuerstein, os indivíduos que apresentam suas capacidades cognitivas retardadas demonstram, no decorrer do processo de avaliação, dificuldades na elaboração e resposta das tarefas (input-output). Isso implicaria em trabalhar com a aprendizagem mediada (parceiro experiente X parceiro inexperiente) e com um conceito global a respeito da inteligência, que deverá ser interpretada qualitativamente, ou seja, valorizando a qualidade das tarefas realizadas e não a quantidade das mesmas.
Sob esse ponto de vista, Feuerstein argumenta que nenhum instrumento de avaliação da inteligência pode deixar de considerar os processos individuais do pensamento, com base nos processos de "input" do sujeito, ou seja, na forma como indivíduo organiza e entra em contato com as informações; a forma como o indivíduo opera seu pensamento baseando-se nas informações disponíveis, ou seja, seus processos de elaboração; como o indivíduo comunica o resultado dos seus processos mentais, ou seja, a maneira como ele faz uso de suas informações (output), através de seus comportamentos e habilidades.
Afirma RUSSO (1994) que o modelo de processo de pensamento considerado por Feuerstein, input-elaboração-output, além de proporcionar a identificação das dificuldades potenciais dos processos mentais do indivíduo, poderá, também, proporcionar através do procedimento de avaliação, pré-teste-aprendizagem mediada-teste, o desenvolvimento e o exercício das capacidades cognitivas afetadas no sujeito.
Enfatiza a referido autora que Feuerstein acredita na importância da motivação e das características afetivas do sujeito, como componente fundamental para as realizações desses procedimentos de avaliação. Tais idéias foram materializadas em seu instrumento de avaliação, denominado "Learning Potencial Assessment Device - LPAD".
Após a aplicação do LPAD, nas suas diversas modalidades, Feuerstein sugere como estratégia pedagógica de trabalho o uso do instrumento PEI (Program Instumental Enrchiment) ou PEI (Programa de Enriquecimento Cognitivo), objetivando proporcionar aos indivíduos considerados "operadores retardados" um enriquecimento de seu potencial cognitivo.
4.2 PEI (Program Instumental Enrchiment) ou Programa de Enriquecimento Instrumental
O PEI se fundamenta na concepção de que é a inteligência que enfatiza sua condição de ser receptiva a trocas e modificações
FEUERSTEIN, (apud GARCIA, 1991, p.18), afirma que a inteligência é um processo dinâmico auto-regulador altamente sensível aos efeitos do meio ambiente. Deste modo, contesta as posições da psicologia que concebem a inteligência como organismo determinado geneticamente e que permanece constante e invariável ao longo de toda vida.
O criador do PEI estabeleceu como objetivo deste instrumento, aumentar a capacidade do organismo humano de ser modificado através da exposição direta dos estímulos e experiências obtidas através do enfrentamentos de eventos da vida, com oportunidades formal e informal de aprendizagem.
Este objetivo geral implica objetivos específicos como corrigir as funções mentais deficientes; possibilitar a formação de conceitos básicos para a realização dos exercícios do programa; desenvolver um sistema de hábitos a partir das experiências obtidas nos exercícios realizados; proporcionar ao indivíduos pensamentos reflexivo e insight; contribuir para mudanças de atitudes.
O PEI é composto por, aproximadamente, 600 páginas de exercícios, distribuídos em quatorze instrumentos denominados Organização de Pontos; Orientação Espacial; Comparações; Percepção Analítica; Orientação Espacial II; Ilustrações; Classificação; Relações Temporais; Progressões Numéricas; Relações Parentesco Familiar; Relações Transitivas; Silogismo; Desenho de Padrões e Instruções. Estes exercícios são apresentados ao estudante página por página, para serem desenvolvidos.
GARCIA (1991) menciona que a realização dos exercícios requer uma série de processos de elaboração e transformação onde o estudante contribui ativamente para a organização, re-estruturação, descobrimento e re-aplicação das relações produzidas.
4.3 Outras Alternativas
Muitas alternativas para uso do psicopedagogo estão sendo colocadas no mercado. Os recursos apresentados por autores de materiais publicados pela Editora Vetor, que além de fornecer material, também promove cursos para orientar a utilização dos mesmos, vem beneficiando a avaliação e intervenção psicopedagógica. Eles estão aqui resumidos, pois, a análise de cada um demanda outra dissertação.
1. Lendo e Escrevendo (1 e 2)
Este material pode ser aplicado para detectar se o estudante possui os requisitos básicos para o processo de Alfabetização.
Pode ser usado em alunos da Pré- escola e séries iniciais.
Autora: Geraldini P. Wintter e Melany S. Copit
2. Teste de Prontidão Horizontes
Pode ser usado para detectar Maturidade/ Prontidão para Alfabetização na pré-escola e séries iniciais do Ensino Fundamental.
Autora: Neda Lian Branco Martins
3. Metropolitano de Prontidão - fator R
Pode ser usado para detectar prontidão alfabetização na pré-escola e séries iniciais do Ensino Fundamental.
Autor: G.H. Heldreth, Ph.D. Griffiths
Adaptação e Padronização: Ana Maria Poppovic
4. Becasse R-l (F e M)
Este teste pode auxiliar no diagnóstico da maturidade escola. Ele traz atividades envolvendo: Estruturação de estórias;Títulos; conteúdos; Redação Omissão ou recusa; Dinâmica da Aplicação; Escolha da Lâmina.
Autora: Bettina Katzenstein Schoenfeldt.
5. Papel de Carta
Este material pode ser utilizado para auxiliar na Avaliação das Dificuldades de Aprendizagem. Apresenta como conteúdo atividades envolvendo comunicação e vinculação.
A Editora Vetor recomenda que este teste seja usado somente por psicólogos.
Autora: Leila Sara José Chamat
6. Prontidão para Alfabetização
Trata-se de um Programa para o Desenvolvimento de Funções Específicas destinadas a alfabetização. Apresenta conteúdo teórico e prático.
Autoras: Ana Maria Poppovic e Genny Golubi de Moraes
Além dos recursos apresentados pela editora Vetor, as provas piagetianas e os níveis de alfabetização são igualmente importantes podendo ser confeccionados pelo próprio profissional
7. As Provas Piagetianas
Podem ser usadas para detectar o estágio do raciocínio lógico matemático da criança. O Conteúdo pode ser montado com o número de provas que se achar necessário. Ernesto Rosa Neto apresenta uma seqüência compostas por tarefas que envolvem a Classificação, Seriação, Classe- Inclusão; Conservação de Quantidades Contínuas e Quantidades Descontínuas.
8. Os Níveis de Escrita
Os Níveis de Escrita estudados por Emília Ferreiro, também são recursos excelentes. Eles podem ser utilizados para identificar o nível de escrita em que a criança se encontra no processo de alfabetização, podendo ser: icônico (a criança representa seu mundo através de desenhos); não icônico (a criança consegue usar letras para escrever e desenhar representando sua forma de escrita, porém o uso das letras não está sistematizado, muitas vezes coloca as letras e faz o desenho, usando ambos para escrever uma mesma palavra); realismo nominal (faz o uso das letras conforme o tamanho do objeto e não de acordo com a palavra, para ela o objeto grande deve ter muitas letras e o objeto pequeno poucas letras); nível pré-silábico (a criança já sabe que precisa de letras para escrever, embora não faça distinção entre letra e número, também já sabe que precisamos usar muitas letras diferentes para escrever). Deste modo, a criança usa as letras do próprio nome variando a posição e a ordem em que elas aparecem no seu nome, para escrever novas palavras); nível pré-silábico em conflito (nesta fase a criança pode enfrentar um conflito já que conta as letras para escrever, mas no momento de escrever acha que é necessário muitas letras para escrever, acreditando que com poucas letras não é possível a escrita, ainda, ao pedir a ela que faça a relação de letras com sílabas, ela risca as letras que parecem sobrar. Isso pode acontecer com palavras monossílabas; ao vencer este conflito a criança entrará no nível pré-silábico); nível pré-silábico (a criança passa a atribuir valor sonoro a cada uma das letras que compõe a escrita e descobre que a escrita representa a fala). Deste modo, formula a sílaba - sem valor sonoro -, cada letra representa um valor som; nível pré-silábico "elaborado" (a criança percebe o valor silábico, portanto, usa uma letra para significar uma sílaba, assim usa uma letra para escrever a palavra monossílabo, mas como acredita que uma letras só não dá para ler, coloca outras só para que possa ler); nível silábico "alfabético" (começa a usar algumas sílabas, embora algumas outras usa só uma letra e se contenta com isso vai descobrindo a sílaba e começa a usá-la); nível alfabético (a criança já usa praticamente todas as sílabas simples, embora com alguns erros, sendo necessário trabalhar a ortografia).
9. Informática.
Os recursos da informática, também, não podem ser ignorados pela Psicopedagogia.
É verdade que o computador não possui flexibilidade para compreender outras linguagens, decifrar códigos desconhecidos ou criticar o que lhe é apresentado. Ele é mais um recurso que pode ser explorado de inúmeras maneiras.
Considerando que a Psicopedagogia trabalha com a aprendizagem humana, os recursos da informática poderão possibilitar a criação, a comunicação, a interação, enfim novas descobertas promovendo a aprendizagem humana.
Foram mencionados aqui, alguns instrumentos que podem ser usados para o diagnóstico e intervenção psicopedagógica, enfatizando que se o psicopedagogo não utilizar recursos exclusivos de outras áreas, não estará ferindo a ética profissional, ainda estará zelando pelo bom relacionamento com especialistas de outras áreas, conforme menciona o Código de Ética da Psicopedagogia, (Capítulo II, Das Responsabilidades dos Psicopedagogos, Artigo 6º, letra b), também, estará garantindo o bem estar das pessoas em atendimento profissional, conseqüentemente, mantendo a ética profissional.
No que tange ao levantamento realizado nesta pesquisa sobre alguns recursos para diagnóstico e intervenção psicopedagógica, destaca-se que não se trata de apresentar um quite de materiais para serem utilizados com todas as crianças e em todas situações, pois tal atitude colocaria o psicopedagogo na posição de um simples aplicador de testes, não é isto que se quer para este profissional, também, não é pretensão da pesquisadora fornecer roteiro ou receita para diagnóstico e intervenção. O propósito aqui foi refletir sobre os recursos que estão no mercados. Portanto, cabe ao profissional analisar cada situação e decidir por aplicar o recurso que lhe for conveniente tendo em vista a qualidade de seu trabalho e o compromisso com o cliente.
Conclusão
Pode-se concluir que o mercado editorial dispõe de muitos recursos para diagnóstico e intervenção psicopedagógica possibilitando ao psicopedagogo desenvolver seu trabalho de maneira eficiente e eficaz, contribuindo assim para melhorar a qualidade do ensino, quer sua atuação seja na clínica ou na institucional escolar, quer seu enfoque de trabalho seja preventivo ou curativo, no sentido de intervir no problema de aprendizagem já apresentado pela criança ou no sentido de prevenir a instalação de problemas nos educandos. Deste modo, não há razão para que o psicopedagogo faça uso de recursos específicos da Psicologia uma vez que possui recursos diversificados. Se houver necessidade de uma avaliação do nível emocional ou inteligência deve encaminhar a criança para um psicólogo, pois ele poderá realizar a avaliação e, se necessário uma intervenção nesses níveis os dois profissionais, psicopedagogo e psicólogo, poderão atuar juntos, até mesmo porque a Psicopedagogia é uma área de atuação multidisciplinar.
Bibliografia
BARONE, Leda M. C. Psicopedagogia - O Caráter Interdisciplinar na Formação e Atuação Profissional. Considerações a Respeito da Ética. Porto Alegre: Artes Médicas, l987.
_____________. A Especificidade do Diagnóstico Psicopedagógico. In: Atuação Psicopedagógica e Aprendizagem Escolar. Petrópolis: Vozes, 1996. p. 127 - 139.
BOSSA, Nádia Ap. A Psicopedagogia no Brasil: Contribuições a Partir da Prática. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.
CÓDIGO DE ÉTICA DA ABPP, In: Revista Psicopedagogia. São Paulo. v.12, Nº25, p.36-37, ABPp, 1993.
CUBERO, Rosário & MORENO, Carmem. Desenvolvimento Psicológico e Educação. In: Cesar COLL, Jesús PALÁCIOS, Alvaro MARSHESI. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.
DICIONÁRIO BRASILEIRO DA LÍNGUA PORTUGUESA. 11ª Edição. 9ª Tiragem. Editora Gamma: Rio de Janeiro, 1982.
FERNANDEZ. Alícia. Inteligência Aprisionada. Porto Alegre: Artes Médicas,1991.
FLORES, Herval G. Ética e Conhecimento. Revista de Psicopedagogia. Vol. 12. N.º 25, 1993.
GARCIA, Ligia Garcia. Las Experiências de Aprendizaje a Atraves de Un mediador y Sus Efectos En El Desarrollo De Estructuras Cognoscitivas. In IX Congresso Latino - Americano de Neurologia Infantil . Blumenau/ Sta. Catarina, 1991.
LINHARES, Maria Beatriz M. Avaliação Assistida. Psicologia: Teorias e Pesquisa, Brasília, 11 (1): 23-31, 1995.
RUBINSTEIN, E.. A Intervenção Psicopedagógica Clínica, in SCOZ at alii, Psicopedagogia: Contextualização, Formação e Atuação Profissional, Porto Alegre: Artes Médicas, l992.
RUSSO, Luiza. Uma Introdução à Abordagem de Reuven Feuerstein na Avaliação Indivíduos com Atraso de Desenvolvimento. Psicopedagogia. São Paulo,13 (34): 5-8, Agosto, 1994.
VETOR. Programação de Cursos 1º Semestre 1999. São Paulo. Editora Psico-pedagógica Ltda,.1999.
VYGOTSKY, Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes., 1991.
***********************************************Teste Projetivo: O Desenho
O teste do desenho é mais um dos recursos ao qual o psicológico recorre como auxiliar da sua praxe seja na empresa, indústria, clínica ou escola. Em suas variadas formas, ele está presente nas atividades de seleção, avaliação e ajuda psicológica. Mas, afinal, o que se busca avaliar por meio do desenho nessas situações? Este artigo pretende esclarecer e contextualizar o teste do desenho, na tentativa de dissipar dúvidas que, quase sempre, angustia os candidatos quando submetidos, em particular, a esse tipo de instrumento nos processos seletivos. Campos (1999) destaca que o primeiro trabalho sobre o desenho como fenômeno expressivo, digno de menção, foi realizado em 1887, por Ricci, em Bolonha. O H-T-P (House - casa, Tree - árvore, Person - pessoa), é o teste projetivo mais usado em exame psicotécnico/seleção de pessoal, avaliação clínica, etc. Outros testes, mas apenas por meio da figura humana, a exemplo do Goodenough e do Machover, estão voltados para mensuração da inteligência infantil.
Nesse momento, se faz necessário uma breve descrição do H-T-P. Este teste é administrado à criança acima de 8 anos de idade, adolescente e adulto, cuja aplicação pode ser em nível individual ou em grupo. Seu tempo de realização é livre, mas, geralmente, não ultrapassa a média de 30 a 90 minutos. O material utilizado é papel ofício A-4 (tamanho ideal, não pode ser papel com pauta), lápis grafite n. 2 (de modo geral grafite é mais apropriado para desenhar, facilita o controle do tônus muscular sobre os traços, ao passo que o estereográfico é escorregadio). Os desenhos são feitos à mão livre, ou seja, sem régua ou objetos que sirva a essa função. Embora, o uso da borracha, por parte do aplicador, seja optativo, quase sempre compõe o kit, até porque que a sua utilização, por si, já consiste em motivo de análise. Quando se trata de criança, também se utiliza lápis coloridos, no que se constitui, assim, a Bateria Acromática e Cromática do H-T-P.
Na concepção de Buck (2003), o H-T-P tem como objetivo obter informação sobre como uma pessoa vivencia a sua individualidade em relação aos outros, e em facilitar a projeção de elementos da personalidade e de áreas de conflitos, identificados como o propósito de avaliação ou terapêutica. Ainda para o autor, “os desenhos também estimulam o estabelecimento de interesse, conforto e confiança entre o examinador e o cliente”(p.2). Sua técnica se respalda no “conceito de que os desenhos da figura humana”, bem como os da casa e da árvore, “são úteis para o estudo da personalidade ou como meio de diagnóstico na avaliação clínica, e se fundamenta na teórica na psicologia da imagem de si mesmo, assim como na teoria psicanalítica da projeção” (HARRIS, 1981, p.57- grifo nosso).
Para Levy (apud TRINCA, 1987), o desenho além de projetar a imagem corporal, usualmente compõe uma gama de projeções relacionadas ao autoconceito, a imagem ideal do eu, e as atitudes para com os outros, mesmo com o examinador na situação da testagem. O teste do desenho pode ser uma expressão consciente, como também incluir símbolos disfarçados e fenômenos inconscientes. O desenho da figura humana, segundo Alves (apud WECHSLER, 2003), é uma das medidas mais utilizá-las pelos psicólogos brasileiros, na maioria das vezes com o intuito de avaliação emocional mais do que cognitiva. A freqüência da utilização dessa técnica, certamente, se deve a sua composição simples, aparentemente objetiva e de baixo custo financeiro (HUTZ e BANDEIRA apud WECHSLER, 2003).
Ao examinando é solicitado, geralmente, um mínimo de três desenhos, e, em seguida se conduz o Inquérito1. Nessa etapa do Inquérito é extraído o maior número possível de informações e descrições subjetivas que o examinando discorre sobre cada uma das figuras grafadas. Cabe ressaltar que, na clínica, esse manejo é bem mais favorável de se consolidar do que num exame psicotécnico, por se tratar, quase sempre, de grupo. Para Deleuze (1997), o devir não é imaginário, bem como uma vigem não é real, ele faz do mínimo de um trajeto ou da sua imobilidade no mesmo lugar, uma viagem; e é esse percurso que leva o imaginário a um devir. Ao trazer esta afirmativa deleuziana para o contexto desta discussão, diríamos que este teste é o “devir”, e que o examinando é o “imaginário”. Daí a importância do Inquérito. Este, junto ao desenho funda as disposições de acesso ao indivíduo, com significativa e vertical compreensão do seu Eu.
Em outras palavras, é a fala do examinado, no seu sincero propósito de colaborar com o processo, que vai dar mais sentido, e legitimar mais ainda as expressões dos seus desenhos. Afinal, “toda linguagem é uma linguagem exposta à emergência dos efeitos do inconsciente” (NASIO, 1993, p.79). Nessa perspectiva, Deleuze (2006) ressalta que a estrutura se estabelece daquilo que é linguagem, seja ela esotérica ou não-verbal, do mesmo modo em que “só há estrutura do inconsciente à medida que o inconsciente fala e é linguagem” (DELEUZE, 2006, pp.238-9). O desenho é uma outra forma de linguagem por meio do qual o inconsciente também se manifesta. Para Campos (1999) o desenho na vez de técnica projetiva reflete uma impressão do “todo” do indivíduo, como uma “Gestalt”2 organizada, que aparece em toda a sua extensão, pelo olhar do examinador experiente na técnica da interpretação de desenho (grifos da autora).
A autora acredita que tudo esta no desenho, cada linha e parte em suas relações com as outras, o aspecto da sua elaboração com um todo apresenta um efeito unificado, diferente do Rorschach que, além de não apresentar tal clareza de interpretação, necessita de cálculos e escores. Enfim, “a projeção do Desenho é apreendido pelo clínico com uma unidade; o Rorschach deve ser tratado parte por parte” (CAMPOS, 1999, p.27). Por questões inerentes à conduta para com os testes psicológicos, não é possível esmiuçar aqui o significado específico do H-T-P, ou seja, em que se consubstanciam seus itens, isto, se não o invalidaria, entretanto retiraria um pouco do seu impacto avaliativo.
Existem os desenhos projetivos a exemplo do Zulliger (aplicação individual ou coletiva, por meio de slides ou apresentação de 3 cartões ou lâminas), e do Rorschach (aplicação somente individual, mediante a apresentação de 10 cartões ou lâminas), com os seus famosos borrões de tinta que se constituem de estímulos ambíguos. O indivíduo descreve, verbalmente, como os percebe. Feito isso, terá que destacar com lápis de cores variadas nas folhas de localização, uma espécie de marca d`água, os locais nos quais as imagens inspiraram suas respostas. O H-T-P é um teste projetivo, mas gráfico, isto o diferencia destes outros citados.
Os três desenhos do H-T-P trabalham com a mesma deliberação tendo em vista para a interpretação das características da personalidade,estado emocional, transtorno mental3 e outros. Convém salientar que, este teste, apesar da sua relevância tende a denotar aspectos patológicos dos quais quase ninguém escapa. Assim sendo, a praxe recomenda a aplicação de mais de um teste de personalidade quando da avaliação do item específico: Personalidade, e da importância de que o avaliador perceba em quais situações deve relativisar os seus dados qualitativos.
Segundo Van Kolck (1984), o indivíduo ao atender à solicitação - “desenhe uma pessoa” - lança sobre o papel a imagem corporal que possui e que se torna veículo de expressão de sua personalidade (p.14). A autora acrescenta que essa imagem não é apenas consciente, mas também construída como base no corpo do outro, e que não está ligada somente à aparência, mas, em especial, a qualidade da relação. A folha de papel em branco representa o mundo externo do indivíduo que nos desenhos livres é ocupada por objetos diversos sem conexão entre si, ou, pelo contrário, isolados, ou mesmo vazios de conteúdos (PICCOLO, 1995), e, por vezes, porque não, bem distribuídos, relacionados e harmonizados.
O sistema inconsciente, estranhamente, é colocado em dúvida por Nasio (1993), ao mesmo tempo em que indica o suposto lugar do seu trânsito. Para o autor, “se o inconsciente existe, ele só pode existir no interior do campo da psicanálise e, mais precisamente, no interior do campo do tratamento analítico” (p.49). Diríamos que o inconsciente está na vida, no cotidiano das pessoas, e em toda atuação psicológicas, embora umas abordagem priorizem, outras o pretira ou ignore. O inconsciente não é uma invenção de Sigmund Freud, nem patente da psicanálise. Segundo Mueller e Hergenhahn (apud GORSKI, 2005), se atribuem ao filósofo Gottfried W. Leibniz a descoberta do inconsciente muito antes de Freud tocar nessa tecla.
O desenho é uma das mais autênticas expressões do testando, uma vez que capta, em particular, conteúdos inconscientes, sem a sua intervenção. Embora ele possa até intuir que algo do seu interior, do seu Eu, irá torná-lo conhecido, mas não consegue ter o controle sobre o que será exposto. Isto certamente o angustia bem mais, porque o deixa vulnerável. Porém, a intenção não é deixá-lo numa situação desconfortável. Mas, esse teste se estrutura de tal modo que o examinando não consegue manipular informações ao seu favor. Posto que, ele não tem noção de quais aspectos dos desenhos serão considerados favoráveis ao seu caso.
Com exceção de figuras estereotipadas - a exemplo de coqueiro, bananeira e pessoa unidimensional ou feita de “palitos”-, que são impróprias para serem analisados porque não oferecem material suficiente, no teste do desenho não tem resposta certa nem errada. Logo, todos os componentes dos desenhos são analisáveis. A grosso modo, o H-T-P se compara a uma radiografia psíquica. Considerado o fato de que o candidato ou examinado não tem controle sobre os testes, durante o processo de seleção ou avaliação o mais sensato é procurar relaxar (fazer exercícios respiratórios, e manter os pés bem apoiados no chão, sobretudo e de maneira moderada nos momentos antecedem a sua realização, são fundamentais), e ariscar-se em: “Ser a própria pessoa, sem subterfúgios, ou representar algum personagem”, e ser cooperativo às realizações e às solicitações da demanda diagnóstica ou psicométrica. Uma vez que assim proceda, e essa postura é válida para todos os testes, estará facilitando uma melhor denotação do seu potencial, e como conseqüência um resultado mais satisfatório do seu desempenho.
Para um melhor entendimento do trabalho prático com desenhos, a seguir serão apresentadas quatro vinhetas de dois casos clínicos, e de dois exames psicotécnicos. Um paciente, médico, estava em crise no casamento. A sua esposa se queixava que isto se devia, em grande parte, à relação simbiótica do marido com os parentes, em especial ao seu apego à mãe viúva. O que era, veementemente, negado por ele, que se dizia independente e acostumado a se “virar” sozinho. Portanto, está casado ou solteiro lhe parecia, apesar deste seu segundo matrimônio, ser indiferente, etc. Solicitei que ele desenhasse a sua família.
Depois de relutar, de questionar a utilidade do desenho, meio indisposto do tipo: “Só vou fazer porque não tenho outra alternativa”, com o lápis esgrimiu rápidos golpes no papel. Este gesto que também tem outras significações, aqui se restringirá ao que foi explicitado: Quatro esboços do mesmo tamanho, similares, e um apêndice junto e a esquerda do primeiro esboço da seqüência. Cada garatuja como se fossem parênteses sobrepostos. Um menor “a cabeça”, em cima de um outro maior “o tórax”, e a base do primeiro, bastante rechonchuda em relação aos demais, representando os quadris.
Quando do Inquérito, apontei para que os nomeasse, o dos quadris largos era sua mãe, o apêndice que sugeria algo como: “Preso à barra da sua saia”, o paciente se auto-reconheceu, e os outros eram seus irmãos. Sugeri que fizesse um outro desenho, mas, com a sua família: mulher e filho (esta fora a intenção inicial). Desta vez apareceram figuras, mas sem se tocarem: Um homem, na direita do papel, olha para o oeste; uma mulher no seu lado esquerdo, olha para o leste, e uma criancinha dava a impressão de engatinhar alheia ao casal. Ao chamar sua atenção para estes detalhes, o paciente se conscientizou das suas dificuldades, e pareceu disposto a repensar e a assumir seu casamento.
Um outro paciente, este já em fase de ser liberado para cirurgia bariátrica, se dizia muito bem, e que havia superado o trauma de hospital, etc. Sugeri que ele fizesse a cena desse dia tão sonhado. No desenho bem elaborado - não quer dizer bonito, perfeito, mas, que seus componentes estão nitidamente representados -, se evidenciou uma figura de barriga enorme, deitada na mesa de cirurgia sob um grande refletor, e com os olhos arregalados em direção à porta. Ao longo do seu corpo três pessoas identificadas como o cirurgião, a anestesiologista e uma enfermeira. Com base nesse “olhar de pavor com desejo implícito de fuga”, ele resolveu adiar a cirurgia, por uns quinze dias, com o objetivo de explorar um pouco mais esse medo.
Uma examinada, no psicotécnico, achou que a perfeição do desenho seria considerada, daí reforçou e retocou todos os desenhos. Seu H-T-P ficou bizarro, e adquiriu uma outra conotação. Esse fato junto à mesma atitude no Teste Palográfico de reforçar os traços (palos), quando da contagem dos mesmos, contribuíram para a sua não indicação. Num concurso público bastante concorrido, uma candidata à vaga de Agente de investigação (função fictícia para dificultar associações), de repente, por conta de uma pergunta da sua concorrente, durante a realização de um teste, ficou agressiva, e bastante exaltada. Seu protesto tinha um pouco de pertinência, houve de fato uma pequena interferência, mas que não devia ter ocorrido. Porém, não chegara a prejudicar o andamento do todo.
Quando reunidos para discutirmos o caso, a psicóloga e o estagiário responsáveis pela sala, estavam se sentindo profundamente culpados e incompetentes. Na função de um dos membros da coordenação do evento, chamei a atenção de que lhes tinha faltado uma prontidão para conter essa interferência, mas que a reação da moça fora exageradamente desproporcional ao incidente. Na análise do seu teste, todos os desenhos, em especial o da figura humana apresentava vários indicativos de intensa agressividade. Chegou-se a conclusão de que a sua agressividade e tensão não eram reacional a situação da testagem, mas constitucional à sua personalidade. A candidata foi considerada, temporariamente, inapta para o cargo.
O desenho tem a função de estabelecer contato, investigação e tratamento. Na comunicação verbal o examinado poderá tentar conduzir, com seus argumentos, o interlocutor para determinado foco, persuadi-lo para o que julga ser crucial para conquistar a vaga. Daí a grande vantagem do desenho, o indivíduo não tem a chance de exercitar esse artifício. Assim como o corpo fala, o desenho diz por meio do inconsciente, aquilo que, por cautela ou autocensura, o seu autor não se permite verbalizar. No psicotécnico, os traços de personalidade identificados nos desenhos são comparados ao perfil que se exige para o cargo. Nesse caso, por vezes, sujeitos de elevado nível cultural e consideráveis características pessoais, não são contempladas. Do mesmo modo que, um outro, com menos potencial poderá se adequar melhor a essa função.
Num primeiro momento, esse processo, parece meio sem lógica e, em particular, cruel. Deve-se lembrar que este sistema é capitalista, e que a escolha de um candidato se dá em relação a diversos fatores. Alguns são bem específicos de cada empresa ou processo seletivo. Por exemplo, numa empresa na qual não haja perspectiva de ascensão funcional, colocar uma pessoa com elevado nível de escolaridade, inteligente, e criatividade, numa função “elementar”, sem possibilidade de crescimento, seria condená-la ao desajuste. Também seria motivo de constrangimento indicar uma outra para uma colocação que está além do seu potencial. Ela se desgastaria para atingir um nível razoável de satisfação produtiva, ou não atingiria, gerando frustração, ou mesmo, algo mais sério. Segundo Codo e Vasques-Menezes (apud ABREU et al., 2002), as pessoas entram em burnout4 ao se sentirem incapazes de investir em seu trabalho, e em conseqüência da incapacidade de lidar como o mesmo.
Um processo seletivo não é pensado em ternos emergenciais. Entre outros, também porque, contratação no Brasil, implica em encargos sociais altíssimos, etc. Na situação de desempregado há disposição sim, mas que, se não forem seguidos os parâmetros racionais de seleção, não há nenhuma segurança de que seja mantida. Atendida as necessidades básicas de subsistência, outras ocuparão o campo psicológico do indivíduo. Assim sendo, vem à tona o velho jargão, de que somente “o casamento da pessoa certa com a função”, poderá resistir às intempéries ocupacionais.
Entre os desenhos, é o da figura humana geralmente o mais realizado, mas, paradoxalmente, é também o mais rejeitado. Para Buck (2003), isso está associado ao nível de desajustamento do sujeito, uma vez que evidencia, mais diretamente, as dificuldades das relações interpessoais e a consciência corporal, mais do que a casa ou árvore. No que se refere aos dados de inteligência, aptidões, etc., feitas as suas devidas ponderações, pode se considerar os mais elevados escores ou percentuais. Ao passo que, na avaliação ou análise da personalidade propriamente dita, os aspectos mais comprometedores são vistos em relação à capacidade adaptativa. Junto a outros itens que poderão ajudar o paciente a superar as suas dificuldade, e, no caso do examinado, no psicotécnico, a enfrentar as situações. Por conseguinte, tenta-se fazer prevalecer o princípio de que, a parte mais saudável, uma vez destacada e valorizada, favorece as outras mais afetadas: “Como alguém conta comigo, eu sou responsável por minha ação perante o outro” (RICOEUR apud SENNETT, 2002: 174). Todo paciente, etc., por mais comprometido que pareça sempre apresenta algum “gancho” como ponto de partida para a sua ajuda.
Porém, nem sempre é fácil de desvelar áreas conflitivas, para perceber os potencias de um candidato, é preciso técnica e atenção, e, no caso clínico, paciência, bem como persistência, para encontrar e alargar as arestas que contribuam para a “cura” do paciente ou remissão do seu sintoma. Van Kolck (1984) salienta que além da projeção5, mecanismos como identificação6 e introjeção7 podem se manifestar, mas certamente a expressão e a adaptação são os dois processos que ocupam lugar de importância quando o desenho é concretizado. A adaptação, expressão e projeção, segundo a autora, estão explícitas no ato de desenhar. Assim sendo, mais do que qualquer outra especificidade de produção pessoal, deve ser visto com bastante critério os aspectos: Adaptativo que diz respeito à adequação à tarefa solicitada, sua correspondência em relação à faixa etária, sexo e, eventual, patologia; Expressivo que analisa o estilo característico da resposta que se mostra por meio gráfico da forma; e o Projetivo que verifica as situações e objetos que denotam conteúdo e a maneira de tratar o tema.
No teste do desenho, embora seu enunciado se refira “ao melhor que o examinado possa desenhar”, a estética ou beleza artística não é considerada, mas os conteúdos que estão representados. Histórias, críticas, sentimentos e emoções verbalizados durante a aplicação e no inquérito são dados complementares que podem até colaborar com o fechamento do Parecer de um Laudo. Tudo que o indivíduo faz, diz, escreve, desenha é uma projeção do seu Eu, ou são fragmentos de si mesmo. Ele pode até não ser exatamente aquilo, mas está de alguma forma, por meio desses sinais, representado. Van Kolck (1984) cogitar que há “casos de rejeição em graus diferentes de intensidade, a partir da negação a desenhar até o não complemento do desenho”(p.10 - grifo da autora).
Na situação de testagem, o discurso de que não sabe desenhar, a priori pode sugerir uma preocupação com a plástica do desenho, mas, na realidade, trata-se de resistência, um mecanismo de defesa, receio de se projetar. De modo geral, “todas as defesas contêm aspectos adaptativos e são indispensáveis para um ajuste adequado à realidade” (PICCOLO, 1995, p.209). É a “melhor solução” (grifo da autora) encontrada pelo sujeito para lidar com as situações, a sua maneira de perceber e conectar-se tanto com a realidade interna quanto com a realidade externa. Em virtude disto, interessa conhecer quais os perigos fantasiados que o ego tenta evitar, e no que acredita como de mais terrível que possa ocorrer caso relaxe essa conduta defensiva (idem, ibid).
Assim como o corpo não mente, e conta coisas sobre a história emocional, e dos mais profundos sentimentos, caráter e personalidade (KURTZ e PRESTERA, 1989), o mesmo pode-se dizer do desenho, que também funciona com uma estrutura similar à grafologia. Assim como na grafologia, o teste do desenho é uma série de atos, de registros gráficos dos movimentos, “quer dizer, como um filme em que o próprio indivíduo plasma, graficamente, seu tipo de inteligência, sua sensibilidade, seus impulsos, suas tendências, suas reações etc.” (VELS, 1997, p.39).
Segundo Vels (1997), a grafologia tem a vantagem de nos dar uma imagem fiel do indivíduo revelada por ele mesmo, sem intermediário e sem risco de inibição e nervosismo que todo teste psicotécnico produz, quando o indivíduo se sente “examinado” (p. 11 - grifo do autor). É verdade que toda situação de testagem gera algum tipo de tensão, mas, se o indivíduo é conhecedor de que sua grafia é objeto de avaliação, por que na grafologia seria diferente? Enfim, no processo psicotécnico,, se destina um tempo para o Rapport8 ou “quebra gelo”, entre outras, para desmistificar os testes, etc., e também para atenuar a ansiedade ou nervosismo dos examinandos (SILVA, 2007).
Tomando por base o exposto poder-se-ia indagar se o treinamento do H-T-P, por exemplo, leva a exposição de desenhos mais satisfatórios? Nunca é demais ressaltar, que não é permitido o treino de qualquer teste psicológico. Isto fere os princípios éticos que regem a categoria, e que está sujeito à invalidação e punição por parte do CFP (Conselho Federal de Psicologia) que regulariza a profissão. Mas, na hipótese de um sujeito recorrer a esse expediente ilegal? Esse macete com o teste do desenho pode até implicar numa vantagem, mas aparente, uma vez que camufla determinados aspectos, mas, dificilmente, não deixará de transparecer as características que, de fato, são inerentes a sua personalidade.
Provavelmente, ficaria um desenho confuso, correndo o risco de que, exatamente por isto, ser preterido, haja vista as incoerências da expressão dos desenhos. Também deve ser considerado o fato de que a avaliação não se dá somente na exclusividade de um desenho ou teste, mas no seu conjunto que subsidia a decisão do examinador. Nesse sentido, Van Kolck (1984) diz que um traço gráfico isolado nada significa. Cada traço deve ser considerado em conexão com os demais e no contexto geral do desenho (p.6). Enfim, o treino não é garantia para assegurar vaga ou carteira de habilitação.
Na perspectiva de ser um psicanalista fazendo outra coisa mais apropriada para a ocasião, Winnicott (apud MENCARELLI e VAISBERG, 2005) propunha uma espécie de jogo de traços e rabiscos no qual cada pessoa deveria finalizar apenas com um desenho esboçado pelo outro. Assim, em poucos encontros era possível chegar ao núcleo problemático do paciente. Apesar desta “deixa” de Winnicott, o desenho na condição de modalidade de teste psicológico é pouco estudado na academia, como conseqüência seu uso, em termos proporcionais, ainda é bem restrito.
Com exceção da ênfase infantil, e do psicotécnico, o teste do desenho não tem uma presença maciça em termo do auxílio que esse recurso pode trazer. Talvez por consistir-se num instrumento de característica rudimentar - todo mundo, de uma forma ou de outra desenha, rabisca, etc., desde os seus primórdios de criança -, não tenha sido valorizado. Segundo Lipovetsky (2005), “não é mais apenas a riqueza do material que constitui o luxo, mas a aura do nome e renome das grandes casas, o prestígio da grife, a magia da marca” (p. 43). Mas este imperativo simbólico, não é exclusivo da moda. Talvez, nesse universo, seja mais explicitamente ditatorial, todavia está também nos mais diversos universos dos segmentos sociais, mesmo no acadêmico, e nem sempre de modo subjacente.
Enfim, os trabalhos mais expressivos em relação ao desenho estiveram voltados para saúde mental a cargo da Nise da Silveira. Esta psiquiatra que não aceitava o eletrochoque - atualmente denominado eletroconvulsoterapia9 - como meio de tratamento, recorreu ao desenho, modelagem e pintura, na sua assistência aos pacientes psicóticos. Em 28 de setembro de 1956, no Engenho de Dentro, no Rio de Janeiro, fundou o Museu de Imagens do Inconsciente.
O desenho está imerso na realidade social, nas suas mais diversas matrizes de arte, seja mediante das obras clássicas, sofisticadas, estilizadas, e até mesmo nas manifestações dos anseios e protestos populares por meio das grafites de rua. Porém, o desenho na sua função de Avaliação Psicológica, não pode se constituir numa tarefa simplória, não se trata de deleitar ou rejeitar conforme o conforto ou incômodo da percepção. Mas, de ir além, traspassar para enxergar, ali, uma vida imbricada noutras vidas, que almejam pela realização de um sonho, atender uma necessidade, e ter uma chance. Finalmente, o teste do desenho tem o dom de veículo que aproxima, e se faz explicitar dos fragmentos, das nuances de luz e sombra, a compreensão. E, assim, se fecha a gestalt de quem ajuda (psicólogo), e de quem espera ser ajudado (paciente, examinado).
NOTAS:
1. O Inquérito consiste num roteiro padronizado de perguntas que são feitas após a conclusão de cada desenho. Isto não significa dizer que o aplicador não possa explorar, de maneira mais espontânea, itens que não ficaram claros, conforme a necessidade.
2. Teoria da Gestalt afirma que não se pode ter conhecimento do todo por meio das partes, e sim das partes pelo todo, uma vez que o conjunto possui leis próprias que regem seus elementos. Só mediante a totalidade é que o cérebro pode, de fato, perceber, decodificar e assimilar uma imagem ou um conceito. Esta teoria deu origem a Psicologia da Gestalt que, por sua vez, enfatiza os processos que envolvem figura e fundo, e a percepção ativa do indivíduo no aqui e agora (FAGAN e SHEPHERD, 1980). No entender de Rey (2003), a Gestalt move-se claramente em função de uma compreensão holística dos fenômenos psicólogicos.
3. A expressão doença mental foi substituída por Transtorno mental (MATOS; MATOS; MATOS, 2005, p.313).
4. Burnout é um termo de origem inglesa que designa “algo que deixou de funcionar por exaustão de energia” (OLIVEIRA apud SILVEIRA et al., 2005, p.159). Esta síndrome também pode ser definida como um estado de exaustão emocional, física e mental causado por elevado nível de exigência durante longo tempo (PINES e ARONSON apud idem, ibid).
5. Projeção é a operação pela qual o sujeito expulsa de si e localiza no outro, pessoa ou coisa, qualidades, sentimentos, desejos que ele desconhece ou recusa em si mesmo. Comum na paranóia, e na superstição dos “normais” (LAPLANCHE e PONTALIS, 2004).
6. Identificação é o processo psicológico pelo qual se assimila aspecto, propriedade, atributo do outro e se transforma, total ou parcial, segundo esse modelo. Enfim, a personalidade constitui-se e diferencia-se por uma série de identificações (LAPLANCHE e PONTALIS, 2004).
7. Introjeção é processo de aproximar-se da incorporação, que constitui o seu protótipo corporal, mas não implica necessariamente ao seu limite (introjeção do ego, do ideal do ego, etc.). Está estreitamente relacionada com a identificação (LAPLANCHE e PONTALIS, 2004).
8. Maiores informações sobre o Rapport podem ser encontradas no texto: Os Testes Psicológicos e as suas Práticas (SILVA, 2007 - http://www.algosobre.com.br/ - artigos / psicologia).
9. Com base em Fink e Berrios, Perizzolo et al. (2003) dizem que a eletroconvulsoterapia é o tratamento mais controverso tanto quanto mais polêmico da psiquiatria. Sua própria natureza, histórico de abuso, apresentações desfavoráveis da mídia, e testemunhos de pacientes tão convincentes quanto desiformados contribuíram para o contexto de tal visão.
REFERENCIAL
ABREU, K. L. et al. (2002). Estresse ocupacional e síndrome de Burnout no exercício profissional da psicologia. Revista Psicologia: ciência e profissão. Vol. 1, n.1. Ano 22. Brasília: CFP.
BUCK, J. N. (2003). H-T-P: casa-árvore-pessoa, técnica projetiva de desenho: manual e guia de interpretação. 1. ed. Trad. R. C. Tardivo. São Paulo: Vetor.(Uso exclusivo de psicólogos).
CAMPOS, D. M. (1999). O teste do desenho como instrumento de diagnóstico da personalidade: validade, técnica de aplicação e normas de interpretação. 31 ed. Petrópolis-RJ: Vozes.
DELEUZE, G. (1997[1925-1995]). Crítica e clínica. Trad. P. P. Pelbart. São Paulo: Ed. 34.
DELEUZE, G. (2006 [1925-1995]). A ilha deserta: e outros textos. Trad. L. B. L. Orlandi. São Paulo: Iluminuras.
FAGAN, J. e SHEPHERD, I. L. (1980).Gestalt-Terapia: Teoria, Técnicas e aplicações. 4. ed. Trad. Álvaro Cabral. Rio de Janeiro: Zahar.
GORSKI, F. T. (2005). Freud, Lacan e o conto da Ilha Desconhecida - Reflexões psicanalíticas acerca de um conto de Saramago. Revista Psicologia: ciência e profissão. Vol. 1, n.1. Ano 25. Brasília: CFP.
HARRIS, D. B. (1981). El test de Goodenough: revision, ampliacion y actualizacion. Barcelona-Buenos Aires: Paidos.
KURTZ, R. e H, PRESTERA. (1989). O corpo revela: um guia para a leitura corporal. Trad. M. A. B. Libanio. São Paulo: Summus.
LAPLANCHE e PONTALIS. (2004). Vocabulário da psicanálise. Trad. P. Tamen. São Paulo: Marins Fontes.
LIPOVETSKY, G. e ROUX, E. (2005). O luxo eterno: da idade do sagrado ao tempo das marcas. Trad. M. L. Machado. São Paulo: Companhia das Letras.
MATOS, E. G; MATOS; T. M. G; MATOS, G. M. G. (2005). A importância e as limitações do uso do DSM-IV na prática clínica. Revista de Psiquiatria do R.G.S. v. 27, n. 3, set/dez.
MENCARELLI, V. L. e VAISBERG, T. M. J. A. (2005). Iluminando o self: uma experiência clínica psicanalítica não convencional. Revista Estudos de Psicologia. Vol. 22, n. 4, out/dez. Campinas-SP: PUC-Campinas.
NASIO, J.-D. (1993). Cinco lições sobre a teoria de Jacques Lacan. Trad. V. Ribeiro. Rio de Janeiro: Zahar.
PERIZZOLO, J. et al. (2003). Aspectos da prática da eletroconvulsoterapia: uma revisão sistemática. Revista de Psiquiatria do R. G. S. vol. 25, n.2. mai/ago.
PICCOLO, E. G. (1995). Defesas nos testes gráficos. In: O processo psicodiagnóstico e as técnicas projetivas. 8 ed. Trad. M. Felzenszwalb. (Orgs). OCAMPO, M. L. S. et al. São Paulo: Martins Fontes.
PICASSO, P. (2004). 1.000 Pensamentos de Personalidades que Influenciaram a Humanidade. (Org.). A. H. Oliveira. São Paulo: DPL.
REY, L. G. (2003). Sujeito e subjetividade: uma aproximação histórico-cultural. Trad. R. S. L. Guzzo. São Paulo: Pioneira Thomson Learning.
SENNETT, R. (2002). A Corrosão do Caráter. 6. ed. Trad. M. Santarrita. Rio de Janeiro: Record.
SILVA, V. G. (2007). Os Testes Psicológicos e as suas Práticas (http://www.algosobre.com.br/ - artigos / psicologia).
SILVEIRA, N. M. et al. (2005). Avaliação de burnout em amostra de policiais civis. Revista de Psiquiatria do R. G. S. vol. 27, n.2. mai/ago.
TRINCA, W. (1987). Investigação clínica da personalidade: o desenho livre como estímulo da apercepção temática. São Paulo: EPU.
Van KOLCK, O. L. (1984). Testes projetivos no diagnóstico psicológico. São Paulo: EPU.
VELS, A. (1997). Dicionário de grafologia e termos psicológicos afins. Trad. J. C. A. Cunha. São Paulo: Casa do Psicólogo.
WECHSLER, S. M. (2003). Avaliação do desenvolvimento cognitivo infantil pelo desenho da figura humana. Revista Boletim de Psicologia. Vol. LIII, n. 119, jul/dez. São Paulo: Sociedade de Psicologia de São Paulo.__________________________________________________
CAIXA DE TRABALHO: UM DEPOSITÁRIO DO MUNDO INTERNO DO APRENDIZ
Muitos Psicopedagogos utilizam a caixa de trabalho como mais uma opção no tratamento psicopedagógico, embora existam psicopedagogos que não trabalhem com a mesma. Veremos aqui o que é a caixa de trabalho, suas vantagens e desvantagens.
Visca idealizou a caixa de trabalho para se trabalhar com as dificuldades de aprendizagem e, para isso, inspirou-se na caixa individual utilizada pelos terapeutas analista na Psicanálise de crianças. Ela seria composta de brinquedos e materiais escolhidos para representarem o mundo interno das crianças, suas fantasias inconscientes frente ao mundo (BARBOSA, 2000, p. 35).
Visca nos diz que:
...cada caixa de trabalho é única, não apenas porque será usada por um único paciente (individual ou grupal), mas também no sentido de que não há caixas duas iguais, da mesma maneira que não existem dois indivíduos ou dois diagnósticos iguais (1987, p. 29).
A caixa deverá ser única porque ela representa uma importância significativa para o sujeito, já que contém objetos que foram escolhidos para ele, os quais intencionam promover “... a superação ou a minimização das dificuldades de aprendizagem” (BARBOSA, 2002, p. 36).
A caixa de trabalho constitui-se, na sua forma física, só e tão somente numa caixa de papelão, de cartolina ou plástica, num tamanho suficiente que possibilite guardar todo o material de uso e pequenas construções.
Embora simples na aparência tem um rico significado internamente já que é ali que o sujeito depositará suas construções e elaborações como desenhos, pintura, texto etc. Ela representa “o depositário de conteúdos simbólicos do paciente” (WEISS, 2003, p. 152). Ela não deverá se tornar apenas receptáculos de materiais e produções, pois representa o mundo interno do aprendiz, devendo ser manejada apenas por seu dono, sem correr o risco de ser mexida ou observada por terceiros, é o que nos aconselha Barbosa. O psicopedagogo deverá garantir a privacidade do sujeito para que este não se sinta invadido e não perca a confiança.
Para Barbosa ela é “um continente, no qual a criança poderá depositar seus conteúdos de saber e de não saber” (2002, p. 35).
Weiss nos informa que “Os materiais a serem colocados são definidos ao final do diagnóstico quando se planeja o tratamento” (2003, p. 152). Barbosa completa nos dizendo que os materiais são escolhidos previamente de acordo com a leitura que fizemos da criança ou adolescente durante a avaliação psicopedagógica (2002, p. 35).
Para se organizar uma caixa é preciso considerar alguns aspectos, tais como: estágio de pensamento, interesses ou motivações, déficits de aprendizagem, sexo, idade, meio sócio-cultural, prognóstico e grau de focalização da tarefa (Visca, 1987, p. 29). Barbosa completa ainda com: nível de apropriação da linguagem escrita, vínculos afetivos estabelecidos com as situações de aprendizagem (2002, p. 36).
Barbosa nos faz uma observação de extrema relevância a cerca da composição da caixa. Há crianças ou adolescentes que apresentam o predomínio da assimilação, ou seja, são aquelas que se aproximam mais de situações lúdicas. Para estes sujeitos deverão ser colocado apenas um material não estruturado (tinta, argila, peças para montar, massa de modelar, etc) e mais materiais estruturados ou semi-estruturados (cadernos, livros, jogos com regras, modelos, receitas etc) a fim de que ele se identifique com a caixa através deste único material não-estruturado e experimente mudanças através dos diferentes materiais estruturados (2002, p. 36-37).
O excesso de materiais não estruturados para este tipo de aprendiz representa o excesso de recursos distratores, dificultando sua concentração e sua busca em direção ao movimento de acomodação, que o obriga a modificar os esquemas de aprendizagem já existentes (Id. Ibid., 2002, p. 37).
Já em outros sujeitos ocorre o predomínio da acomodação, que são aqueles que estão sempre modificando seus esquemas de forma excessiva o que acabam por imitar e não criar. Para estes, Barbosa recomenda um material estruturado para servir como ponto de partida e mais materiais não-estruturados para que criem sem seguir modelos, sem modificar seus esquemas de aprendizagem, ou seja, são sujeitos que necessitam de uma maior flexibilidade.
Além de materiais, estruturados e não estruturados, a caixa deverá conter materiais básicos que servirão de apoio, tais como: lápis, borracha, régua, apontador e a depender da necessidade apontada pela avaliação: tesoura cola, revistas para recortar, cadernos etc.
A caixa de trabalho pode ser incluída como uma das constantes do enquadramento, a qual só poderá sofrer modificações com novos combinados entre o terapeuta e o sujeito. Dentre as modificações está o acréscimo ou a retirada de algum objeto. Se isto for feito sem nenhum critério ou avaliação, a evolução do sujeito poderá ser seriamente prejudicada.
É comum crianças e adolescentes quererem trazer objetos de casa ou levar objetos da caixa para casa. Isto só pode acontecer se fizer parte de um combinado entre aprendiz e terapeuta; se for contribuir para a aprendizagem ou para a minimização da dificuldade de aprendizagem; se houver clareza dos objetivos desta ação (Id. Ibid., 2002, p. 38)
Outra modificação está em repor objetos como uma cola que a criança usou em apenas uma tarefa de recorte e colagem. Barbosa nos orienta repor “dependendo da consciência que ela possui em relação aos limites e ao seu descontrole frente aos limites” (2002, p. 38).
Além da caixa de trabalho, há profissionais que trabalham com o que Bosse denominou de material disparador em seu artigo na revista Psicopedagogia: O material disparador – considerações preliminares de uma experiência clínica psicopedagógica.
Nesta citação ela explica porque acredita ser inviável trabalhar com a caixa de trabalho:
Em nossa realidade atual, torna-se praticamente inviável ao psicopedagogo dispor de materiais como: jogos, tesouras, caixas de lápis de cor etc. para uso exclusivo de um único cliente. A menos que o profissional se dedique a atender pessoas de classe econômica alta, o que não me parece ser o objetivo da Psicopedagogia (BOSSE, 1995, p. 81).
Consiste em selecionar um material previamente ao início de cada sessão e tem como objetivo mobilizar o sujeito à busca da aprendizagem. A eleição do material acompanha os interesses e necessidades da criança ou adolescente. Segundo Bosse, o material disparador poderá ser um livro, um jogo, pedaços de tecido, papel de dobradura etc.
Feita a seleção, o material é deixado sobre a mesa de trabalho ao lado de uma caixa com instrumentos básicos de uso comum a todos os clientes, tais como, lápis, borracha, tesoura, cola, caneta, régua, apontador, hidrocor, papel sulfite, papel pautado, quadriculado e colorido.
Ela nos diz que o mesmo material deverá ser oferecido ao sujeito por várias sessões seguidas até que se esgote o seu interesse, entretanto observa que o fato dele perder o interesse não significa que ele tenha superado a defasagem. Então, caberá ao psicopedagogo encontrar ‘uma nova “brecha” entre os interesse da criança, que permita trabalhar aquela mesma dificuldade’ (1995, p. 82).
Da mesma forma que a caixa de trabalho, o material a ser oferecido deverá estar de acordo com seu nível cognitivo para que lhe dê estímulo em seguir adiante. Porém também deverá ser oferecido outro material que mobilize aprendizagens de um nível imediatamente superior ao que o sujeito se encontra para que se possa desafiá-lo a trabalhar com suas dificuldades, superando suas resistências.
As substituições também não deverão ser feitas de forma aleatória. Elas deverão responder a questões tais como: “Porque vou substituir este disparador nesta sessão? Porque vou introduzir outro”. Mesmo quando o sujeito pedir algo e este objeto estiver na sala, ela propõe que diga que talvez lhe seja entregue na próxima sessão. Isto permitirá avaliarmos o seu nível de tolerância à frustração e suas resistências.
Creio que seja essa a contribuição da proposta que desenvolvi com o material disparador: a organização e sistematização de uma prática adequada à realidade brasileira e, ao mesmo tempo, coerente com os princípios de um modelo mais amplo, que é o da Epistemologia Convergente, que lhe dá sustentação. (BOSSE. P. 1995, p. 83).
Deveremos lembrar mais uma vez, que a proposta da Epistemologia Convergente é de se trabalhar com a caixa de trabalho, através da qual o psicopedagogo irá observar as ações do cliente para, a partir daí, fazer suas intervenções com o objetivo de promover o seu avanço em relação às dificuldades.
Bibliografia:
BARBOSA, Laura Monte Serrat. Caixa de trabalho uma ação psicopedagógica proposta pela Epistemologia Convergente, in Psicopedagogia e Aprendizagem. Coletânea de reflexões. Curitiba, 2002.
BOSSA, Nadia A. A psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática. Porto Alegre, Artes Médicas, 2000.
______________. Dificuldades de Aprendizagem: O que são? Como Tratá-las? Porto Alegre, Artes Médicas Sul, 2000.
BOSSE, Vera R. P. O material disparador – considerações preliminares de uma experiência clínica psicopedagógica. In: Psicopedagogia, Rev 14 (33), São Paulo, 1995.
PAÍN, Sara. Diagnóstico e tratamento dos problemas de aprendizagem. Porto Alegre, Artes Médica, 1985.
WEISS, M. L. L. Psicopedagogia Clínica: uma visão diagnóstica dos problemas de aprendizagem escolar. Rio de Janeiro, DP&A, 2003.
_____________________________________________
AVALIAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
O trabalho psicopedagógico possui como objetivo central abordar, investigar e intervir nas dificuldades encontradas no processo de ensino aprendizagem.
Encontrar uma definição clara para designar as dificuldades de aprendizagem não é uma tarefa fácil. É preciso esclarecer os padrões de normalidade para identificarmos e analisarmos as anomalias.
Com a finalidade de identificar as causas do fracasso escolar instalado no Brasil na década de 70, profissionais de áreas distintas como pediatras, psicólogos, fonoaudiólogos, educadores, passaram a contribuir com pesquisas e estudos sobre o desenvolvimento infantil e a aprendizagem.
Considerando a escola responsável por grande parte da formação do ser humano, o trabalho do psicopedagogo na instituição escolar tem um caráter preventivo no sentido de procurar criar competências e habilidades para solução dos problemas. Com esta finalidade e em decorrência do grande número de crianças com dificuldades de aprendizagem e de outros desafios que englobam a família e a escola, a intervenção psicopedagógica ganha, na atualidade, grande relevância nas instituições de ensino.
Ao analisarmos o processo de aprendizagem, devemos perceber um múltiplo enfoque, explanando propriedades psicológicas, neurológicas e sociais do indivíduo, já que a construção da aprendizagem considera aspectos biológicos, cognitivos, emocionais e do meio, que constroem o ser e embaseia a sua evolução.
Concebe-se a aprendizagem como uma construção intrapsíquica, com continuidade genética e diferenças evolutivas, resultantes das pré-condições enérgico-estruturais do sujeito e das circunstâncias do meio, como discorre Visca (1991, apud Guiroto).
Assim, percebe-se a contribuição da neuropsciologia na análise dos processos de aprendizagem, segundo Luria (1966, apud Moretti e Martins), a neuropsicologia tem por objetivo o estudo das relações entre as funções do sistema nervoso e o comportamento humano. Através da neuropsicologia podemos compreender os processos de aprendizagem e buscar meios de solucionar as possíveis dificuldades encontradas, dentre outras atividades cognitivas.
Conclui-se que os fatores neurológicos fornecem subsídios para um olhar singular e para a compreensão do funcionamento intelectual e de sua evolução durante a vida do educando.
Observou-se que cada indivíduo possui uma maneira peculiar de aprender e construir o seu conhecimento, afirmando o objetivo do trabalho psicopedagógico.
Nos últimos anos, com a acentuação do fracasso escolar e diante do baixo desempenho acadêmico, o interesse pelo processo de aprendizagem aumentou.
Crianças, adolescentes e adultos continuam apresentando dificuldades em aprender de acordo com o processo considerado normal, o que exclui o indivíduo de uma sociedade cada vez mais globalizada.
Neste contexto, o psicopedagogo institucional, como um profissional qualificado, está apto a trabalhar na área da educação, dando assistência aos professores e a outros profissionais da instituição escolar visando a melhoria das condições do processo ensino aprendizagem, bem como para prevenção dos problemas que surjam nesse processo.
Ao psicopedagogo cabe avaliar o aluno e identificar os problemas de aprendizagem, buscando conhecê-lo em seus potenciais construtivos e em suas dificuldades, encaminhando-o, por meio de um relatório, quando necessário, para outros profissionais, como psicólogo, fonoaudiólogo, neurologista, que realizam os diagnósticos e exames complementares com o intuito de favorecer o desenvolvimento da potencialização humana no processo de aquisição do conhecimento.
Equipes multidisciplinares buscam respostas para as dificuldades assistidas. Estuda-se a possibilidade de identificar as áreas encefálicas responsáveis pelos processos cognitivos, o que tornará viável o estudo e a formação de diferentes conexões e meios de aprender, possibilidades que surgem no campo psicopedagógico com o avanço da neurociência.
Dá-se, assim, a importância do olhar singular para o educando. Por meio de técnicas e métodos próprios, como testes, anamnese, brincadeiras lúdicas e entrevistas, o psicopedagogo possibilita uma intervenção visando a solução de problemas de aprendizagem.
Por meio de testes já regulamentados, é possível analisar as propriedades neurológicas e psíquicas do educando como: coordenação motora, equilíbrio, percepção, visão, audição, relação intrapessoal, expectativas, anseios e outros.
Segundo Moretti e Martins os tradicionais testes que compõem a avaliação psicodiagnóstica, referem-se a grande e importante parte da avaliação neuropsicológica. Tal avaliação na infância é divida em dois grupos distintos, descritos abaixo:
1.Investigações rígidas, compostas por uma bateria de exames da área, buscando alterações subjacentes às funções analisadas;
2.Exames menos sistemáticos, interpretativos. Oriundo da re-leitura da avaliação tradicional psicopedagógica.
Através de encaminhamentos para áreas respectivas, os profissionais podem detectar os motivos das dificuldades existentes, como por exemplo, a existência de uma lesão cerebral.
Lembramos que com um sistema de saúde público falho, muitas crianças ao cair ou sofrer uma batida importante, não recebem o atendimento adequado. Exames como a tomografia computadorizada ou a ressonância magnética, podem encontrar pequenas lesões que outrora podem trazer à tona conseqüências no desenvolvimento do indivíduo.
O psicopedagogo deve estar apto para intervir e orientar os professores a agir de modo satisfatório nas problemáticas vivenciadas em sala de aula.Porém é preciso salientar que somente a intervenção com os professores não garante a eficácia da intervenção. A participação dos pais e familiares no âmbito escolar é primordial, visando descrever o cotidiano da criança e observando o seu desenvolvimento humano, acompanhando a interação da criança com o ambiente escolar.
Cabe ao psicopedagogo perceber eventuais perturbações no processo aprendizagem, participar da dinâmica da comunidade educativa, favorecendo a integração, promovendo orientações metodológicas de acordo com as características e particularidades dos indivíduos do grupo, realizando processos de orientação. Já que no caráter assistencial, o psicopedagogo participa de equipes responsáveis pela elaboração de planos e projetos no contexto teórico/ prático das políticas educacionais, fazendo com que os professores, diretores e coordenadores possam repensar o papel da escola frente a sua docência e às necessidades individuais de aprendizagem da criança ou, da própria ensinagem.
Bossa (1944, pág. 23).
Percebe-se a importância do trabalho psicodiagnóstico e as contribuições trazidas pela neurociência.
A avaliação formada por testes, anamneses, entrevistas, brincadeiras lúdicas e investigações, permitem ao profissional um aprofundamento na vida do educando, e, conseqüentemente, no cotidiano de sua família e da comunidade que o rodeia, tornando possível a avaliação do indivíduo e a comparação com os padrões de aprendizagem considerados normais, e, posteriormente, a execução das intervenções terapêuticas que se fazem necessárias.
Bibliografia
BOSSA, Nádia. A Psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática. Porto Alegre: Artmed, 1994.
CABREIRA, Priscila Aguirre. Quais os fatores que levam a criança a ser abrigada e as possíveis conseqüências que afetam a sua aprendizagem. http://www.abpp.com.br/artigos93.htm. Acessado em Maio, 2009.
CAPAVILLA, Alessandra Gotuzo Seabra. Contribuições da neuropsicologiacognitiva e da avaliação neuropsicológica à compreensão do funcionamento cognitivo. http://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo.php?script=sci_arttextãpid=s10562-104920070010005&ing=tanrm=pt. Acessado Maio, 2009.
GUIROTO, Aparecida Pires. Baixo rendimento escolar associado a fatores psicossociais: Um estudo de caso. http://www.abpp.com.br/artigos/79.htm. Acesso em Maio, 2009.
MORRETI; MARTINS, Lúcia Helena Tiosso, João Batista. Contribuições da neuropsicologia para a psicologia clínica e educação. http://scielo.bvs-psi.org.br/scielo.php?pid=s1413-8557997000100008&script=sci_arttext&ting=pt. Acessado em Maio, 2009.
A Entrevista Operativa Centrada na Aprendizagem (EOCA) é um instrumento inspirado na psicologia social de Pichon-Rivière, nos postulados da psicanálise e no método clínico da escola de Genebra foi idealizado por Jorge Visca e é um instrumento de uso simples que avalia em uma entrevista a aprendizagem. (BOSSA, 2007.p.46)
Uma forma de primeira sessão diagnóstica é proposta por Jorge Visca (1987, p. 72) através da EOCA. "Em todo momento, a intenção é permitir ao sujeito construir a entrevista de maneira espontânea, porém dirigida de forma experimental. Interessa observar seus conhecimentos, atitudes, destrezas, mecanismos de defesas, ansiedades, áreas expressão da conduta, níveis de operatividade, mobilidade horizontal e vertical etc”. (Weiss apud Visca, 2007, p. 57).
As propostas a serem feitas na E.O.C.A, assim como o material a ser usado, vão variar de acordo com a idade e a escolaridade do paciente. O material comumente usado para criança é composto numa caixa a onde o paciente encontrará vários objetos, sendo alguns deles relacionados à aprendizagem, tais como, cola, tesoura, papel sulfite branco e colorido, papel crepom e seda, coleção, cola colorida, livros de leituras, revistas para recorte e colagem e diversos outros materiais.
O objetivo da caixa é dar ao paciente a oportunidade de explorá-la enquanto o psicopedagogo o observa, nesse momento serão observados alguns aspectos da criança como: a sua reação, organização, apropriação, imaginação, criatividade, preparação, regras utilizadas, etc.
De um modo geral, usam-se propostas do tipo: “Gostaria que você me mostrasse o que sabe fazer, o que lhe ensinaram e o que você aprendeu”, “Esse material é para que você o use como quiser”, “Você já me mostrou como lê e desenha, agora eu gostaria que você me mostrasse outra coisa”.
Durante a realização da sessão, é necessário observar três aspectos:
• A temática, que envolverá o significado do conteúdo das atividades em seu aspecto manifesto e late
• A dinâmica, que é expressa através da postura corporal, gestos, tom de voz, modo de sentar, e manipular os objetos etc.;
• O produto feito pelo paciente, que será a escrita, o desenho, as contas, a leitura etc., permitindo assim uma primeira avaliação do nível pedagógico.
A partir da análise desses três aspectos, o autor propõe que se trace o primeiro sistema de hipóteses para continuação do diagnóstico.
REFERÊCIA:
WEISS, Maria Lúcia Lemme. Psicopedagogia Clínica – Uma visão diagnóstica dos problemas de aprendizagem escolar. 13 ed. Ver. E aml: RJ Lamparina.2003.
Fonte: http://psicopedagogiaeducacao.blogspot.com/2009/09/entrevista-operativa-centrada-na.html
*****************************************
O USO DE JOGOS DE REGRAS NO ATENDIMENTO PSICOPEDAGÓGICO
Autores: Eliane Cawahisa; Geiva Calsa; Ivonilce Gallo; Luciana Lacanallo
Introdução
Em decorrência do baixo desempenho dos alunos nas escolas, uma quantidade cada vez maior de crianças tem chegado aos consultórios de psicopedagogia apresentando dificuldades de aprendizagem em matemática. Tanto na atuação clínica psicopedagógica quanto na atuação escolar faz-se necessário um atendimento especializado nesta área de conhecimento.
O desempenho que os alunos vêm demonstrando, sem dúvida, justifica o desenvolvimento de uma metodologia de trabalho capaz de promover uma aprendizagem significativa dos conceitos e procedimentos matemáticos, em particular, nas primeiras séries do ensino fundamental. Com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento de uma aprendizagem significativa, este artigo visa apresentar uma experiência de uso de jogos de regras na construção do conhecimento matemático.
Embora desenvolvida no âmbito clínico psicopedagógico considera-se oportuna sua ampliação para o meio escolar regular, desde que atendidos os princípios teóricos e os critérios metodológicos de desenvolvimento da atividade. O jogo da velha e o bafo foram os jogos convencionais escolhidos como instrumentos terapêuticos da experiência aqui relatada.
Os Jogos sob um Enfoque Psicopedagógico
A brincadeira e o jogo constituem-se uma necessidade humana e, segundo Kishimoto (2000), interferem diretamente no desenvolvimento da imaginação, da representação simbólica, da cognição, dos sentimentos, do prazer, das relações, da convivência, da criatividade, do movimento e da auto-imagem dos indivíduos. Muitos educadores desvalorizam a brincadeira acreditando que o mais importante na escola é aprender a ler e escrever.
Não levam em conta que todo o desenvolvimento que a brincadeira traz para os indivíduos é pré-requisito para a alfabetização. Vygotsky (1996) afirma que a brincadeira simbólica e o jogo formam uma zona de desenvolvimento proximal que pode se constituir o ponto de partida para aprendizagens formais.
Segundo Piaget (1975), por meio do jogo a criança assimila o mundo para atender seus desejos e fantasias. O jogo segue uma evolução que se inicia com os exercícios funcionais, continua no desenvolvimento dos jogos simbólicos, evolui no sentido dos jogos de construção para se aproximar, gradativamente, dos jogos de regras, que dão origem à lógica operatória.
Segundo o autor, nos jogos de regras existe algo mais que a simples diversão e interação, pois, eles revelam uma lógica diferente da racional. Este tipo de jogo revela uma lógica própria da subjetividade tão necessária para a estruturação da personalidade humana quanto a lógica formal, advinda das estruturas cognitivas. Para Gonçalves (1999), os jogos de regras podem ser considerados o coroamento das transformações a que criança chega quando atinge a reversibilidade do pensamento.
Ao tentar resolver os problemas originados no desenvolvimento do jogo, o sujeito cria estratégias e as avalia em função dos resultados obtidos e das metas a alcançar na atividade. Os fracassos decorrentes destas ações originam conflitos ou contradições por parte do indivíduo e desencadeiam mecanismos de equilibração cognitiva (Brenelli, 1996).
As regulações ativas geradas por este processo implicam decisões deliberadas dos indivíduos que originam novos procedimentos de jogo. Apresentam um caráter construtivo e por meio delas a retomada de uma ação é sempre modificada pelos resultados da ação anterior em um processo contínuo de modificação das ações seguintes, em função dos resultados das ações precedentes (MACEDO, 1994).
Brenelli (1996) assinala que conhecer os meios empregados para alcançar o objetivo do jogo, bem como conhecer as razões desta escolha ou de sua modificação, implica uma reconstrução no plano da representação do que era dominado pelo sujeito como ação.
O processo de tomada de consciência pode ser favorecido, dessa maneira, pela verbalização dos procedimentos de jogo. Sob uma ótica construtivista a verbalização envolve explicações sobre o que, como e porque os sujeitos executaram seus procedimentos. A utilização da fala organizada é capaz de favorecer a compreensão dos conceitos e procedimentos contidos nas situaçõesproblema enfrentadas pelos sujeitos.
Em uma intervenção de caráter psicopedagógico, o educador deve equilibrar uma atuação mais e menos diretiva, conforme o tipo de tarefa a ser realizada pelos sujeitos. Nas tarefas verbais sua atuação pode ser mais diretiva, pois, tem como objetivo organizar a situação de aprendizagem e solicitar a re-interpretação das ações e das falas dos sujeitos; nas tarefas práticas pode ser menos diretiva, pois, seu objetivo é o de apenas orientar a ação a ser efetivamente realizada pelo sujeito (CALSA, 2002).
Do ponto de vista psicopedagógico, o processo de aprendizagem envolve não somente a fala do sujeito que aprende, mas também a fala de quem ensina. Ao “pensar em voz alta” suas estratégias de ação o educador atua como modelo de reflexão para o sujeito. Utilizados tradicionalmente como recursos clínicos (VISCA, 1987), a fala organizada e o uso do modelo têm obtido na escola resultados satisfatórios no ensino de diferentes áreas de conhecimento (SOLÉ, 1998; ZUNINO, 1995; CALSA, 2002).
A utilização do jogo de regras como um recurso terapêutico ou escolar, seja por parte do psicopedagogo ou do educador, exige conhecimento de sua estrutura e clareza dos objetivos a serem atingidos. Macedo (1997) lembra que ao se propor um jogo é preciso ter em mente o porquê de jogar, o que jogar, para quem, com que recursos, de que modo jogar, quando e durante quanto tempo jogar, e qual a continuidade desta atividade ao final de seu desenvolvimento.
Desenvolvimento das Intervenções Psicopedagógicas
Foram escolhidos como sujeitos da intervenção duas crianças que procuraram atendimento clínico psicopedagógico com dificuldades de aprendizagem na área de matemática.
As crianças freqüentavam a 3a. e 4a. série do ensino fundamental e apresentavam uma faixa etária entre 9 e 11 anos de idade. Os dados obtidos nas sessões de atendimento psicopedagógico foram registrados por escrito pelos terapeutas Elaboraram-se os registros após cada sessão em que os jogos de regras foram utilizados. As sessões foram realizadas individualmente com duração de 50 minutos cada uma. A quantidade de sessões e sua periodicidade foram determinadas pelo interesse dos sujeitos no desenvolvimento dos jogos.
Durante o jogo se um jogador não conseguisse virar todas as fichas ou deixasse uma ou mais, a vez seria do próximo participante. Se o jogador não possuísse a soma determinada pelo seu adversário para fazer a aposta, o valor que não possuído seria descontado da sua soma de pontos (os resultados parciais devem ser anotados).
Se um dos jogadores possuísse uma única carta com o valor superior à aposta feita pelo adversário, ele poderia tentar trocá-la por fichas que representassem essa quantidade. Caso um dos jogadores não tivesse mais o valor para cobrir à aposta determinada pelo adversário ele ficaria com saldo negativo que deveria ser pago no próximo jogo (o registro do saldo negativo foi feito com anotações convencionais, por exemplo - 4 pontos). Seria considerado vencedor quem conseguisse a maior soma no final da partida.
Durante o processo de intervenção psicopedagógica os jogos de regras foram desenvolvidos respeitando-se sua natureza (estrutura interna), seus aspectos cognitivos, afetivos e sociais. Num primeiro momento, optouse pelo ensino e desenvolvimento do jogo, conforme seus materiais e regras convencionais. Após esta aprendizagem novos elementos (numerais e operações) e regras foram introduzidos de acordo com as dificuldades de aprendizagem de matemática a serem atendidas em cada caso.
Resultados
Para a apresentação do jogo do bafo optou-se pelo relato do caso clínico de J. P. (denominação fictícia). As queixas da escola e da família quanto ao seu desempenho se concentravam nos seguintes aspectos: não realizava cálculos mentais; demonstrava possuir recursos intelectuais para realizar as tarefas de matemática, mas não os utilizava; realizava tarefas escolares, sem contudo dispor-se a refazê-las, no caso de estarem incorretas. Para facilitar o acompanhamento das condutas de J. P. optou-se por dividir suas respostas em etapas que permitem a percepção de seu crescimento tanto em relação às estratégias de resolução quanto aos conteúdos de matemática propriamente ditos. Os relatos dos jogos do bafo e da velha iniciam-se a partir da introdução de novos elementos e regras à sua estrutura convencional para o atendimento das dificuldades específicas de cada um dos sujeitos em foco.
Na fase inicial de desenvolvimento do jogo do bafo já com a introdução de conteúdos matemáticos J. P. se preocupava apenas em virar as figuras o mais precisamente possível sem se importar com a soma dos numerais presentes em cada uma das fichas. Ele parecia estar associando as fichas que utilizava neste jogo com as do jogo convencional, em que o valor de cada ficha era definido pela força de seu personagem. Ao poupar as fichas de maior valor - superiores a seis - demonstrava preocupação com a quantidade de cartas de que dispunha no jogo. Jogava o bafo seguindo os procedimentos do jogo convencional sem se dar conta das novas estratégias originadas da introdução de numerais nas fichas.
Em um segundo momento, J. P. começou a perceber que podia superar a terapeuta na sua agilidade de virar as fichas, mas ainda assim não era capaz de ganhar o jogo. Enquanto apostava fichas de valor baixo (1e2) a terapeuta apostava fichas de valor maior que as absorviam. Suas apostas baixas permitiam à terapeuta ganhar o jogo virando as fichas de maior valor em que havia apostado. Nesta etapa a soma de pontos de J. P. era sempre menor que a da terapeuta embora possuísse uma maior quantidade de fichas que ela.
O terceiro momento do jogo do bafo caracterizou-se pela percepção de J. P. de que a soma dos pontos de suas fichas o estava impedindo de ganhar o jogo. Começou então a jogar tentando alcançar a maior soma de pontos em cada virada. Para tanto, passou a apostar com suas fichas de maior valor. A cada partida examinava as fichas que possuía, verificava as que havia perdido e organizava uma estratégia capaz de promover o saldo negativo para a terapeuta.
No quarto e último momento de sua evolução no jogo J. P. passou a apostar o maior número de fichas possível e, de preferência, as de maior valor. Tornou-se capaz de levar em conta em sua estratégia de jogo as duas variáveis ao mesmo tempo: quantidade de fichas e valor de cada ficha apostada. A partir deste momento, preocupa-se em ganhar o máximo de fichas e, ao mesmo tempo, atingir a maior soma possível de pontos.
Para o desenvolvimento do jogo da velha escolheu-se o caso clínico de F. P. (denominação fictícia). A queixa escolar e familiar de seu desempenho concentrava-se nos seguintes pontos: não compreendia o significado dos sinais das quatro operações básicas; não se mostrava capaz de utilizar e compreender os algoritmos convencionais de adição e subtração; encontrava-se na fase inicial de construção do esquema multiplicativo e parecia ainda não ter avançado na construção do esquema aditivo; ainda utilizava algoritmos intuitivos e representação icônica tanto na adição quanto na subtração.
Da mesma forma que no caso anterior, o relato das estratégias envolvidas no jogo da velha se inicia a partir da introdução de elementos e regras relacionadas ao conteúdo matemático no qual o sujeito apresentava dificuldades de aprendizagem. Após esta aprendizagem novos materiais (algarismos) e regras foram introduzidos de acordo com as dificuldades de aprendizagem a serem atendidas no transcorrer do tratamento.
No primeiro momento de atuação com o jogo da velha F. P. mostrou levar em conta apenas os atributos espaciais do tabuleiro sem se ater ao outro atributo, indispensável para a vitória - a soma dos algarismos.
Durante esta fase fixava-se apenas uma das dimensões espaciais do jogo: a diagonal. Utilizava sempre a mesma seqüência de colocação de suas fichas sobre o tabuleiro. Costumava iniciar as partidas colocando suas fichas em primeiro lugar sobre o canto inferior esquerdo do tabuleiro, em seguida no centro, e, no final, no quadro central superior. Sua contagem mostrava-se truncada e sempre acompanhada pelos dedos das mãos. Neste momento, a organização de suas ações parecia não levar em consideração as estratégias utilizadas pelo adversário.
No segundo momento do uso do jogo da velha F. P. começou a organizar sua ação a partir da dimensão numérica do jogo, embora persistisse sua preferência pela dimensão espacial do tabuleiro. Manteve sua fixação em apenas uma de suas dimensões espaciais, a diagonal, e sua estratégia de jogo quanto à posição das fichas no tabuleiro, ainda sem levar em conta os movimentos do adversário. Em uma das partidas desta fase, acabou por ganhar o jogo, mas suas ações não se constituíram reações ou antecipações aos movimentos do adversário e, sim, a repetição de uma seqüência de passos previamente testados. Ainda nesta fase, a escolha das fichas a serem colocadas no tabuleiro foi aleatória, pois, ignorou a dimensão numérica do jogo. Ao vencer a partida não somente quanto à posição das fichas, mas também na contagem de seus pontos deu-se conta da importância do número da ficha utilizada em sua última jogada. Sua contagem continuou truncada e acompanhada dos dedos das mãos.
Na terceira fase do atendimento com uso do jogo da velha F. P. manifestou um grande avanço na elaboração e execução de suas estratégias de jogo. Passou a preocupar-se com as duas dimensões envolvidas no jogo: espacial e numérica e começou a perceber mais claramente as razões das vitórias consecutivas de seu adversário.
Apresentou uma pequena variação em sua estratégia de jogo. Iniciou uma das partidas desta fase do mesmo modo que as anteriores, mas acrescentou mais uma posição à sua finalização: o canto superior direito do tabuleiro. Sua opção por uma ou outra posição da ficha no final do jogo passa a depender dos movimentos do adversário.
Esta opção caracteriza-se como uma reação ao movimento do adversário e, portanto, posterior a este.
Nesta partida, em suas duas primeiras jogadas optou novamente por fichas com números baixos, mas ao final percebeu que, embora tenha vencido quanto à posição das fichas no tabuleiro perdeu em sua contagem de pontos. Deu-se conta de que a diferença de pontos obtidos na partida foi conseqüência das fichas escolhidas pelos dois jogadores. A partir daí passou a observar as quantidades presentes nas fichas utilizadas pelo terapeuta, bem como a seqüência em que foram jogadas. Sua contagem ainda permaneceu truncada e acompanhada dos dedos das mãos.
Na última etapa do jogo da velha F.P. modificou suas estratégias de jogo e passou a utilizar cartas com números maiores em pontos estratégicos do tabuleiro. As estratégias do adversário tornaram-se modelos de ação. Passou a utilizar fichas de maior valor desde as primeiras jogadas de cada partida e, ao mesmo tempo, a apresentar um maior conjunto de variações das posições das fichas no tabuleiro. As jogadas eram iniciadas e finalizadas em diferentes posições do tabuleiro, pois, a estratégia de jogo era organizada não somente como reação aos movimentos do adversário, mas também como antecipação a eles.
Em uma das partidas desta fase o sujeito iniciou o jogo no canto superior direito, seguiu para o canto superior esquerdo e previu a possibilidade de vencer fechando uma seqüência na lateral esquerda do tabuleiro. Para isto, ignorou a ficha colocada pelo adversário no quadro central do tabuleiro e jogou sua ficha na posição central esquerda e, logo após, venceu o jogo fechando uma seqüência no canto inferior esquerdo.
Ao vencer a partida confirmou sua previsão quanto à melhor estratégia adotada nesta situação.
Nos dois casos relatados os sujeitos modificaram suas estratégias de jogo tornando-as operatórias. As estratégias utilizadas no início do desenvolvimento dos dois jogos caracterizaram-se pela preocupação com apenas uma das variáveis envolvidas na atividade de cada vez.
Ao longo do processo de evolução de suas estratégias os sujeitos privilegiaram a cada momento apenas uma das dimensões do jogo. No jogo da velha, no primeiro e segundo momento, F. P. levou em conta apenas sua dimensão espacial para, no terceiro momento, priorizar sua dimensão numérica, e apenas no último momento, levar em conta as duas dimensões ao mesmo tempo. No jogo do bafo, no primeiro e segundo momento, J.P. levou em conta apenas a quantidade de fichas viradas para, no terceiro momento, priorizar a soma dos numerais contidos nas fichas, e apenas no último momento, levar em conta as duas dimensões ao mesmo tempo: quantidadede fichas apostadas e viradas e soma dos numerais contidos nas fichas.
Conclusões
Os resultados do experimento evidenciam os progressos obtidos pelos sujeitos submetidos à abordagem psicopedagógica dos conteúdos matemáticos e dos jogos convencionais escolhidos, bafo e jogo da velha.
Nos dois casos relatados, constatou-se evolução de suas estratégias de jogo e de seus conhecimentos sobre as operações de adição e subtração.
As estratégias iniciais dos dois jogadores demonstravam umaconduta indiferente aos elementos matemáticos introduzidos nos jogos e organizavam suas jogadas, conforme os procedimentos convencionalmente utilizados nos dois jogos.
No jogo do bafo J.P. preocupava-se apenas em virar as figuras o mais rápido possível, enquanto no jogo da velha F.P. fixava-se em uma das dimensões espaciais do tabuleiro, a diagonal.
Ao lidar com apenas uma das duas dimensões implicadas nos jogos os sujeitos evidenciaram uma conduta não operatória, embora a tivessem manifestado em outras situações1.
Em uma etapa posterior os dois jogadores passaram a levar em conta a dimensão numérica dos dois jogos abandonando temporariamente a dimensão espacial. A utilização da dimensão numérica nos jogos, embora de maneira restrita, sugere a manutenção de sua conduta não operatória.
A última etapa de evolução das estratégias de jogo dos sujeitos representou a utilização de diferentes variáveis contidas tanto na dimensão numérica dos jogos – no jogo do bafo quantidade de fichas, valor de cada uma e sua soma, e no jogo da velha o valor de cada ficha e sua soma, quanto em sua dimensão espacial – no jogo da velha a posição diagonal, horizontal e vertical das fichas.
Em provas piagetianas aplicadas aos dois sujeitos observou-se a manifestação do estágio de pensamento operatório concreto.
O novo comportamento introduzido nos dois jogos evidenciou uma conduta operatória nos procedimentos dos dois jogadores. Ao beneficiar-se de sua operatoriedade na organização das estratégias de jogo os sujeitos indicaram ter sido capazes de utilizar adequadamente seus recursos cognitivos. A ativação pertinente dos recursos cognitivos disponíveis em seu sistema cognitivo é um dos indicadores, segundo Perrenoud (1999), do desenvolvimento de competências por parte dos indivíduos.
Os progressos obtidos pelos dois jogadores ao longo do experimento demonstram a importância da abordagem psicopedagógica da matemática e dos jogos convencionais para a melhoria do desempenho dos sujeitos nas duas áreas. Além de modificar suas estratégias de jogo, os sujeitos modificaram suas estratégias de soma das quantidades contidas nas fichas de jogo e dos pontos obtidos nas partidas.
Ambos deixaram de realizar esta operação por meio da contagem dos dedos e passaram a efetuá-la por meio do cálculo mental. Tais resultados confirmam os obtidos em estudos anteriores por Brenelli (1996) e Calsa (2002).
Brenelli (1996) observou que a abordagem psicopedagógica dos jogos de regras favorece o desenvolvimento das estruturas cognitivas, pois, permite que o sujeito realize descentrações e coordenações de pontos de vista, bem como, o desencadeamento de regulações ativas no processo de escolha de procedimentos adequados ao alcance dos objetivos do jogo.
Em seu estudo, realizado com crianças de faixa etária equivalente ao deste relato, a autora constatou que ao modificar sua maneira de jogar a criança mostra que foi capaz de compensar as perturbações provocadas pelo jogo, na tentativa de se acomodar às suas exigências. Dessa perspectiva, podese afirmar que por meio do jogo o sujeito exercitou suas funções intelectuais de assimilação e acomodação, fatores, em parte, responsáveis pelo desenvolvimento cognitivo dos sujeitos.
Calsa (2002), em outro estudo com faixa etária equivalente ao desta pesquisa, concluiu que a abordagem psicopedagógica de conteúdos matemáticos é capaz de melhorar o desempenho de alunos com rendimento insatisfatório nesta matéria. Durante o processo de intervenção os alunos apresentaram um movimento de retomada de formas mais primitivas de resolução de tarefas para, ao longo do processo, chegar até formas mais avançadas e compatíveis com sua faixa etária.
Finalizando, é importante assinalar que os resultados da experiência relatada neste artigo mostram a importância de intervenções de caráter psicopedagógico para a modificação do modelo de aprendizagem dos indivíduos em situação terapêutica, e sugerem sua viabilidade em situação escolar para a melhoria da aprendizagem de seus alunos.
Referências
ANTUNHA, E. Jogos sazonais: coadjuvantes do amadurecimento das funções cerebrais. In: OLIVEIRA, V. Brincar e a criança do nascimento aos seis anos. Rio de Janeiro: Vozes, 2000. p.33-56.49
BRENELLI, R. P. O jogo como espaço para jogar. Campinas: Papirus, 1996.
BENCINI, R. e GENTILE, P. Para aprender (e desenvolver) competências. Revista Pátio, São Paulo, n.135, ano 15, p.12-17, 2000.
BOSSA, N. A psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.
CALSA, G. C. Intervenção psicopedagógica e problemas aritméticos no ensino fundamental. Tese de doutorado: Universidade Estadual de Campinas, 2002. 285p.
GONÇALVES, J. E. Jogos: como e porque utilizá-los na escola! Disponível em: . 1999.
KISHIMOTO, T. M. Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. São Paulo: Cortez, 2000.
MACEDO, L. Ensaios construtivistas. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1994.
MACEDO, L. Quatro cores, senha e dominó. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1997.
MACEDO, L. Aprender com jogos e situações-problema. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000.
PERRENOUD, P. Construir competências é virar as costas aos saberes? Revista Pátio, São Paulo, n.11, ano 3, p.15-19, 1999.
PIAGET, J. O desenvolvimento do pensamento: equilibração das estruturas cognitivas. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1977.
PIAGET, J. A formação do símbolo na criança. Rio de Janeiro: Zahar, 1975.
SMOLE S.; DINIZ, M.; CÂNDIDO, P. Brincadeiras infantis nas aulas de matemática. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000.
TOMAZINHO, R. As atividades e brincadeiras corporais na pré-escola: um olhar reflexivo. Dissertação de Mestrado. Universidade Presbiteriana Mackenzie, SãoPaulo, 2002.
VISCA, J. Clínica Psicopedagógica. Epistemologia convergente. Porto Alegre: Artes Médicas, 1987
*****************************************Diagnóstico Psicopedagógico: o desafio de montar um quebra-cabeças
Fernández (1990) afirma que o diagnóstico, para o terapeuta, deve ter a mesma função que a rede para um equilibrista. É ele, portanto, a base que dará suporte ao psicopedagogo para que este faça o encaminhamento necessário.
É um processo que permite ao profissional investigar, levantar hipóteses provisórias que serão ou não confirmadas ao longo do processo recorrendo, para isso, a conhecimentos práticos e teóricos. Esta investigação permanece durante todo o trabalho diagnóstico através de intervenções e da "...escuta psicopedagógica...", para que "...se possa decifrar os processos que dão sentido ao observado e norteiam a intervenção". (BOSSA, 2000, p. 24).
Na Epistemologia Convergente todo o processo diagnóstico é estruturado para que se possa observar a dinâmica de interação entre o cognitivo e o afetivo de onde resulta o funcionamento do sujeito (BOSSE, 1995, p. 80)
Conforme Weiss,
O objetivo básico do diagnóstico psicopedagógico é identificar os desvios e os obstáculos básicos no Modelo de Aprendizagem do sujeito que o impedem de crescer na aprendizagem dentro do esperado pelo meio social. (2003, p. 32 )
O diagnóstico possui uma grande relevância tanto quanto o tratamento. Ele mexe de tal forma com o paciente e sua família que, por muitas vezes, chegam a acreditar que o sujeito teve uma melhora ou tornou-se agressivo e agitado no decorrer do trabalho diagnóstico. Por isso devemos fazer o diagnóstico com muito cuidado observando o comportamento e mudanças que isto pode acarretar no sujeito.
Para ilustrar como o diagnóstico interfere na vida do sujeito e sua família, citaremos um exemplo de Weiss: uma paciente, uma adolescente de 18 anos cursando a 7ª série de escola especial, queixou-se à mãe que ela (Weiss) estava forçando-a a crescer. Ela conseguiu fazer a elaboração deste pensamento porque tinha medo de perder o papel na família da doente que necessitava de atenção exclusiva para ela. A família percebeu que isto realmente poderia acontecer e era isto também que sustentava seu casamento "já acabado". Concordou com a terapeuta em interromper o diagnóstico (2003, p. 33 ).
Bossa nos lembra que a forma de se operar na clínica para se fazer um diagnóstico varia entre os profissionais dependendo da postura teórica adotada. (p. 96, 2000).
Na linha da Epistemologia Convergente, Visca nos informa que o diagnóstico começa com a consulta inicial (dos pais ou do próprio paciente) e encerra com a devolução (1987, p. 69).
Antes de se iniciar as sessões com o sujeito faz-se uma entrevista contratual com a mãe e/ou o pai e/ou responsável, objetivando colher informações como:
- Identificação da criança: nome, filiação, data de nascimento, endereço, nome da pessoa que cuida da criança, escola que freqüenta, série, turma, horário, nome da professora, irmãos, escolaridades dos irmãos, idade dos irmãos.
- Motivo da consulta;
- Procura do Psicopedagogo: indicação;
- Atendimento anterior;
- Expectativa da família e da criança;
- Esclarecimento sobre o trabalho psicopedagógico.
- Definição de local, data e horário para a realização das sessões e honorários.
Visca propôs o seguinte Esquema Seqüencial Proposto pela Epistemologia Convergente:
Ações do entrevistador Procedimentos Internos do Entrevistador
EOCA
Testes
Anamnese
Elaboração do Informe 1º sistema de hipóteses
Linhas de investigação
Escolha de instrumentos
2º sistema de hipóteses
Linhas de investigação
Verificação e decantação do 2º sistema de hipótese.
Formulação do 3º sistema de hipóteses
Elaboração de uma imagem do sujeito (irrepetível) que articula a aprendizagem com os aspectos energéticos e estruturais, a-históricos e históricos que a condicionam.
(VISCA, 1991)
Observamos, no quadro acima, que ele propõe iniciar o diagnóstico com a EOCA e não com a anamnese argumentando que "... os pais, invariavelmente ainda que com intensidades diferentes, durante a anamnese tentam impor sua opinião, sua ótica, consciente ou inconscientemente. Isto impede que o agente corretor se aproxime 'ingenuamente' do paciente para vê-lo tal como ele é, para descobri-lo. (Id. Ibid., 1987, p. 70).
Os profissionais que optam pela linha da Epistemologia Convergente realizam a anamnese após as provas para que não haja "contaminação" pelo bombardeio de informações trazidas pela família, o que acabaria distorcendo o olhar sobre aquela criança e influenciando no resultado do diagnóstico.
Porém, alguns profissionais iniciam o diagnóstico com a anamnese. É o caso de Weiss. Compare abaixo o quadro da seqüência diagnóstica proposta por ela:
1º - Entrevista Familiar Exploratória Situacional (E.F.E.S.)
2º - Anamnese
3º - Sessões lúdicas centradas na aprendizagem (para crianças)
4º - Complementação com provas e testes (quando for necessário)
5º - Síntese Diagnóstica – Prognóstico
6º - Devolução - Encaminhamento
(WEISS, 1994)
Esta diferença não altera o resultado do diagnóstico, porém é preciso que o profissional acredite na linha em que escolheu para seu trabalho psicopedagógico.
Como o presente trabalho está baseado na Epistemologia Convergente abordaremos a anamnese ao final e iniciaremos falando sobre a EOCA.
A realização da EOCA tem a intenção de investigar o modelo de aprendizagem do sujeito sendo sua prática baseada na psicologia social de Pichón Rivière, nos postulados da psicanálise e método clínico da Escola de Genebra (BOSSA, 2000, p. 44).
Para Visca, a EOCA deverá ser um instrumento simples, porém rico em seus resultados. Consiste em solicitar ao sujeito que mostre ao entrevistador o que ele sabe fazer, o que lhe ensinaram a fazer e o que aprendeu a fazer, utilizando-se de materiais dispostos sobre a mesa, após a seguinte observação do entrevistador: "este material é para que você o use se precisar para mostrar-me o que te falei que queria saber de você" (VISCA, 1987, p. 72).
O entrevistador poderá apresentar vários materiais tais como: folhas de ofício tamanho A4, borracha, caneta, tesoura, régua, livros ou revistas, barbantes, cola, lápis, massa de modelar, lápis de cor, lápis de cera, quebra-cabeça ou ainda outros materiais que julgar necessários.
O entrevistado tende a comportar-se de diferentes maneiras após ouvir a consigna. Alguns imediatamente, pegam o material e começam a desenhar ou escrever etc. Outros começam a falar, outros pedem que lhe digam o que fazer, e outros simplesmente ficam paralisados. Neste último caso, Visca nos propõe empregar o que ele chamou de modelo de alternativa múltipla (1987, p. 73), cuja intenção é desencadear respostas por parte do sujeito. Visca nos dá um exemplo de como devemos conduzir esta situação: "você pode desenhar, escrever, fazer alguma coisa de matemática ou qualquer coisa que lhe venha à cabeça..." (1987, p. 73).
Vejamos o que Sara Paín nos fala sobre esta falta de ação na atividade "A hora do jogo" (atividade trabalhada por alguns psicólogos ou Psicopedagogos que não se aplica à Epistemologia Convergente, porém é interessante citar para percebermos a relação do sujeito com o objeto):
No outro extremo encontramos a criança que não toma qualquer contato com os objetos. Às vezes se trata de uma evitação fóbica que pode ceder ao estímulo. Outras vezes se trata de um desligamento da realidade, uma indiferença sem ansiedade, na qual o sujeito se dobra às vezes sobre seu próprio corpo e outras vezes permanece numa atividade quase catatônica. (1992, p. 53).
Piaget, em Psicología de la Inteligência, coloca que:
O indivíduo não atua senão quando experimenta a necessidade; ou seja; quando o equilíbrio se acha momentaneamente quebrado entre o meio e o organismo, a ação tende a reestabelecer este equilíbrio, quer dizer, precisamente, a readaptar o organismo... (PIAGET apud VISCA, 1991, p. 41).
De acordo com Visca, o que nos interessa observar na EOCA são "...seus conhecimentos, atitudes, destrezas, mecanismos de defesa, ansiedades, áreas de expressão da conduta, níveis de operatividade, mobilidade horizontal e vertical etc (1987, p. 73).
É importante também observar três aspectos que fornecerão um sistema de hipóteses a serem verificados em outros momentos do diagnóstico:
• A temática - é tudo aquilo que o sujeito diz, tendo sempre um aspecto manifesto e outro latente;
• A dinâmica - é tudo aquilo que o sujeito faz, ou seja, gestos, tons de voz, postura corporal, etc). A forma de pegar os materiais, de sentar-se são tão ou mais reveladores do que os comentários e o produto.
• O produto - é tudo aquilo que o sujeito deixa no papel.
(Id. Ibid., 1987, p. 74)
Visca (1987) observa que o que obtemos nesta primeira entrevista é um conjunto de observações que deverão ser submetidas a uma verificação mais rigorosa, constituindo o próximo passo para o processo diagnóstico.
É da EOCA que o psicopedagogo extrairá o 1º Sistema de hipóteses e definirá sua linha de pesquisa. Logo após são selecionadas as provas piagetianas para o diagnóstico operatório, as provas projetivas psicopedagógicas e outros instrumentos de pesquisa complementares.
Visca reuniu em seu livro: El diagnostico operatório em la practica psicopedagogica, as provas operatórias aplicadas no método clínico da Escola de Genebra por Piaget, no qual expõe sucintamente os passos em que usou com grupos de estudo e cursos para o ensino do diagnóstico psicopedagógico, comentando o porque de cada passo.
A aplicação das provas operatórias tem como objetivo determinar o nível de pensamento do sujeito realizando uma análise quantitativa, e reconhecer a diferenças funcionais realizando um estudo predominantemente qualitativo. (Id. Ibid., p. 11, 1995).
O autor nos alerta que as provas "...no siempre han sido adecuadamente entendidas y utilizadas de acuerdo com todas las posibilidades que las mismas poseen" (1995, p. 11). Isto se deve, talvez, a uma certa dificuldade de sua correta aplicação, evolução e extração das conclusões úteis para entender a aprendizagem.
Segundo Weiss:
As provas operatórias têm como objetivo principal determinar o grau de aquisição de algumas noções-chave do desenvolvimento cognitivo, detectando o nível de pensamento alcançado pela criança, ou seja, o nível de estrutura cognoscitiva com que opera (2003, p. 106).
Ela ainda nos alerta que não se deve aplicar várias provas de conservação em uma mesma sessão, para se evitar a contaminação da forma de resposta. Observa que o psicopedagogo deverá fazer registros detalhados dos procedimentos da criança, observando e anotando suas falas, atitude, soluções que dá às questões, seus argumentos e juízos, como arruma o material. Isto será fundamental para a interpretação das condutas.
Para a avaliação as respostas são divididas em três níveis:
• Nível 1: Não há conservação, o sujeito não atinge o nível operatório nesse domínio.
• Nível 2 ou intermediário: As respostas apresentam oscilações, instabilidade ou não são completas. Em um momento conservam, em outro não.
• Nível 3: As respostas demonstram aquisição da noção sem vacilação.
Muito interessante o que Weiss nos diz sobre as diferentes condutas em provas distintas:
...pode ocorrer que o paciente não obtenha êxito em apenas uma prova, quando todo o conjunto sugere a sua possibilidade de êxito. Pode-se ver se há um significado particular para a ação dessa prova que sofra uma interferência emocional: encontramos várias vezes crianças, filhos de pais separados e com novos casamentos dos pais, que só não obtinham êxito na prova de intersecção de classes. Podemos ainda citar crianças muito dependentes dos adultos que ficam intimidadas com a contra-argumentação do terapeuta, e passam a concordar com o que ele fala, deixando de lado a operação que já são capazes de fazer (2003, p. 111).
Em relação a crianças com alguma deficiência mental ela nos diz que:
No caso de suspeita de deficiência mental, os estudos de B. Inhelder (1944) em El diagnóstico del razonamiento en los débiles mentales mostram que os oligofrênicos (QI 0-50) não chegam a nenhuma noção de conservação; os débeis mentais (QI 50-70) chegam a ter êxito na prova de conservação de substância; os fronteiriços (QI 70-80) podem chegar a ter sucesso na prova de conservação de peso; os chamados de inteligência normal "obtusa" ou "baixa", podem obter êxito em provas de conservação de volume, e às vezes, quando bem trabalhados, podem atingir o início do pensamento formal (2003, p.111-112).
Visca também reuniu em um outro livro: Técnicas proyetivas psicopedagogicas, as provas projetivas, cuja aplicação tem como objetivo investigar os vínculos que o sujeito pode estabelecer em três grandes domínios: o escolar, o familiar e consigo mesmo, através dos quais é possível reconhecer três níveis em relação ao grau de consciência dos distintos aspectos que constituem o vínculo de aprendizagem.
Sobre as provas projetivas Weiss observa que:
O princípio básico é de que a maneira do sujeito perceber, interpretar e estruturar o material ou situação reflete os aspectos fundamentais do seu psiquismo. É possível, desse modo, buscar relações com a apreensão do conhecimento como procurar, evitar, distorcer, omitir, esquecer algo que lhe é apresentado. Podem-se detectar, assim, obstáculos afetivos existentes nesse processo de aprendizagem de nível geral e especificamente escolar (2003, p. 117)
Para Sara Paín, o que podemos avaliar através do desenho ou relato é a capacidade do pensamento para construir uma organização coerente e harmoniosa e elaborar a emoção. Também permitirá avaliar a deteriorização que se produz no próprio pensamento. Esta autora ainda nos diz que o pensamento fala através do desenho onde se diz mal ou não se diz nada, o que oferece a oportunidade de saber como o sujeito ignora (1992, p. 61).
De acordo com a Epistemologia Convergente, após a aplicação das provas operatórias e das técnicas projetivas o psicopedagogo levantará o 2º Sistema de hipóteses e organizará sua linha de pesquisa para a anamnese que, como já vimos, terá lugar no final do processo diagnóstico, de modo a não contaminar previamente a percepção do avaliador.
Weiss nos diz que:
As observações sobre o funcionamento cognitivo do paciente não são restritas às provas do diagnóstico operatório; elas devem ser feitas ao longo do processo diagnóstico. Na anamnese verifica-se com os pais como se deu essa construção e as distorções havidas no percurso;... (2003, p.106).
A anamnese é uma das peças fundamentais deste quebra-cabeça que é o diagnóstico. Através dela nos serão reveladas informações do passado e presente do sujeito juntamente com as variáveis existentes em seu meio. Observaremos a visão da família sobre a história da criança, seus preconceitos, expectativas, afetos, conhecimentos e tudo aquilo que é depositado sobre o sujeito.
... toda anamnese já é, em si, uma intervenção na dinâmica familiar em relação à "aprendizagem de vida". No mínimo se processa uma reflexão dos pais, um mergulho no passado, buscando o início da vida do paciente, o que inclui espontaneamente uma volta à própria vida da família como um todo (Id. Ibid., 2003, p. 63).
Segundo Weiss, o objetivo da anamnese é "colher dados significativos sobre a história de vida do paciente" (2003, p. 61).
Consiste em entrevistar o pai e/ou a mãe, ou responsável para, a partir disso, extrair o máximo de informações possíveis sobre o sujeito, realizando uma posterior análise e levantamento do 3º sistema de hipóteses. Para isto é preciso que seja muito bem conduzida e registrada.
O psicopedagogo deverá deixá-los à vontade "... para que todos se sintam com liberdade de expor seus pensamentos e sentimentos sobre a criança para que possam compreender os pontos nevrálgicos ligados à aprendizagem". (Id. Ibid., 2003, p. 62).
Deixá-los falar espontaneamente permite ao psicopedagogo avaliar o que eles recordam para falar, qual a seqüência e a importância dos fatos. O psicopedagogo deverá complementar ou aprofundar.
Conforme Weiss, em alguns casos deixa-se a família falar livremente. Em outros, a depender das características da família, faz-se necessário recorrer a perguntas sempre que necessário. Os objetivos deverão estar bem definidos, e a entrevista deverá ter um caráter semidiretivo (2003, p. 64).
De acordo com Paín, a história vital nos permitirá "...detectar o grau de individualização que a criança tem com relação à mãe e a conservação de sua história nela" (1992, p. 42).
É importante iniciar a entrevista falando sobre a gravidez, pré-natal, concepção. Weiss nos informa que,
"A história do paciente tem início no momento da concepção. Os estudos de Verny (1989) sobre a Psicologia pré-natal e perinatal vêm reforçar a importância desses momentos na vida do indivíduo e, de algum modo, nos aspectos inconscientes de aprendizagem" (2003, p. 64).
Algumas circunstâncias do parto como falta de dilatação, circular de cordão, emprego de fórceps, adiamento de intervenção de cesárea, "costumam ser causa da destruição de células nervosas que não se reproduzem e também de posteriores transtornos, especialmente no nível de adequação perceptivo-motriz" (PAÍN, 1992, p. 43).
É interessante perguntar se foi uma gravidez desejada ou não, se foi aceito pela família ou rejeitado. Estes pontos poderão determinar aspectos afetivos dos pais em relação ao filho.
Posteriormente é importante saber sobre as primeiras aprendizagens não escolares ou informais, tais como: como aprendeu a usar a mamadeira, o copo, a colher, como e quando aprendeu a engatinhar, a andar, a andar de velocípede, a controlar os esfíncteres, etc. A intenção é descobrir "em que medida a família possibilita o desenvolvimento cognitivo da criança - facilitando a construção de esquemas e deixando desenvolver o equilíbrio entre assimilação e acomodação...". (WEISS, 2003, p.66).
É interessante saber sobre a evolução geral da criança, como ocorreram seus controles, aquisição de hábitos, aquisição da fala, alimentação, sono etc., se ocorreram na faixa normal de desenvolvimento ou se houve defasagens.
Se a mãe não permite que a criança faça as coisas por si só, não permite também que haja o equilíbrio entre assimilação e acomodação. Alguns pais retardam este desenvolvimento privando a criança de, por exemplo, comer sozinha para não se lambuzar, tirar as fraldas para não se sujar e não urinar na casa, é o chamado de hipoassimilação (PAÍN, 1992), ou seja, os esquemas de objeto permanecem empobrecidos, bem como a capacidade de coordená-los.
Por outro lado há casos de internalização prematura dos esquemas, é o chamado de hiperassimilação (PAÍN, 1992), pais que forçam a criança a fazer determinadas coisas das quais ela ainda não está preparada para assimilar, pois seu organismo ainda está imaturo, o que acaba desrealizando negativamente o pensamento da criança.
Sobre o que acabamos de mencionar Sara Paín nos diz que é interessante saber se as aquisições foram feitas pela criança no momento esperado ou se foram retardadas ou precoces. "Isto nos permite estabelecer um quociente aproximado de desenvolvimento, que se comparará com o atual, para determinar o deterioramento ou incremento no processo de evolução" (1992, p. 45).
A mesma autora aconselha insistirmos "... nas modalidades para a educação do controle dos esfíncteres quando apareçam perturbações na acomodação... " (1992, p. 42).
Weiss nos orienta também saber sobre a história clínica, quais doenças, como foram tratadas, suas conseqüências, diferentes laudos, seqüelas.
A história escolar é muito importante, quando começou a freqüentar a escola, sua adaptação, primeiro dia de aula, possíveis rejeições, entusiasmo, porque escolheram aquela escola, trocas de escola, enfim, os aspectos positivos e negativos e as conseqüências na aprendizagem.
Todas estas as informações essenciais da anamnese devem ser registradas para que se possa fazer um bom diagnóstico.
Encerrada a anamnese, o psicopedagogo levantará o 3º sistema de hipóteses. A anamnese deverá ser confrontada com todo o trabalho do diagnóstico para se fazer a devolução e o encaminhamento.
Devolução no dicionário é o ato de devolver, de dar de volta (ROCHA, 1996, p. 208). No sentido da clínica psicopedagógica a devolução é uma comunicação verbal, feita aos pais e ao paciente, dos resultados obtidos através de uma investigação que se utilizou do diagnóstico para obter resultados.
"... talvez o momento mais importante desta aprendizagem seja a entrevista dedicada à devolução do diagnóstico, entrevista que se realiza primeiramente com o sujeito e depois com os pais (quando se trata de uma criança, é claro)" (PAÍN, 1992, p. 72).
Segundo Weiss, no caso da criança, é preciso fazer a devolução utilizando-se de uma linguagem adequada e compreensível para sua idade para que não fique parecendo que há segredos entre o terapeuta e os pais, ou que o terapeuta os traiu (1992, p. 130).
É perfeitamente normal que, neste momento, exista muita ansiedade para todos os envolvidos no processo, seja o psicopedagogo, o paciente e os pais. Muitas vezes algumas suspeitas observadas ao longo do diagnóstico tendem a se revelar no momento da devolução, "ficam evidentes nestas falas as fantasias que chegam ao momento da devolução, e que estiveram presentes durante todo o processo diagnóstico" (Id. Ibid., 2003, p. 130).
Alguns pais chegam à devolução sem terem consciência ou camuflam o que sabem sobre seu filho. É preciso tomar consciência da situação e providenciar suas transformações, caso contrário, não será possível realizar um contrato de tratamento.
Weiss orienta organizar os dados sobre o paciente em três áreas: pedagógica, cognitiva e afetivo-social, e posteriormente rearrumar a seqüência dos assuntos a serem abordados, a que ponto dará mais ênfase. É necessário haver um roteiro para que o psicopedagogo não se perca e os pais não fiquem confusos. Tudo deve ser feito com muito afeto e seriedade, passando segurança. Os pais, assim, muitas vezes acabam revelando algo neste momento que surpreende e acaba complementando o diagnóstico.
É importante que se toque inicialmente nos aspectos mais positivos do paciente para que o mesmo se sinta valorizado. Muitas vezes a criança já se encontra com sua auto-estima tão baixa que a revelação apenas dos aspectos negativos acabam perturbando-o ainda mais, o que acaba por inviabilizar a possibilidade para novas conquistas.
Depois deverão ser mencionados os pontos causadores dos problemas de aprendizagem.
Posterior a esta conduta deverá ser mencionada as recomendações como troca de escola ou de turma, amenizar a super-proteção dos pais, estimular a leitura em casa etc, e as indicações que são os atendimentos que se julgue necessário como psicopedagogo, fonoaudiólogo, psicólogo, neurologista etc.
Em casos de quadros psicóticos, neuroses graves ou outras patologias, é necessário um tratamento psicoterápico inicial, até que o paciente atinja um ponto tal que tenha condições de perceber a sua própria necessidade de aprender e crescer no que respeita à escolaridade; é preciso que se instale nele o desejo de aprender (Weiss, 2003, p. 136).
Muitas vezes faz-se necessário o encaminhamento para mais de um profissional. E isto complica quando a família pertence a um baixo nível socioeconômico. É importante que no momento da devolução o psicopedagogo tenha algumas indicações de instituições particulares e públicas que ofereçam serviços gratuitos ou com diferentes formas pagamento. Isto evita que o problema levantado pelo diagnóstico não fique sem uma posterior solução.
O informe é um laudo do que foi diagnosticado. Ele é solicitado muitas vezes pela escola, outros profissionais etc. Quaisquer que sejam os solicitantes é importante não redigir o mesmo laudo, pois existem informações que devem ser resguardadas, ou seja, para cada solicitante deve-se redigir informações convenientes. Sua finalidade é "resumir as conclusões a que se chegou na busca de respostas às perguntas que motivaram o diagnóstico" (Id. Ibid., 2003, p. 138).
A mesma autora sugere o seguinte roteiro para o informe:
I. Dados pessoais;
II. Motivo da avaliação - encaminhamento;
III. Período da avaliação e número de sessões;
IV. Instrumentos usados;
V. Análise dos resultados nas diferentes áreas: pedagógica, cognitiva, afetivo-social, corporal.
VI. Síntese dos resultados - hipótese diagnóstica;
VII. Prognóstico;
VIII. Recomendações e indicações;
IX. Observações: acréscimo de dados conforme casos específicos.
Bibliografia:
BOSSA, Nadia A. A psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática. Porto Alegre, Artes Médicas, 2000.
______________. Dificuldades de Aprendizagem: O que são? Como Tratá-las? Porto Alegre, Artes Médicas Sul, 2000.
BOSSE, Vera R. P. O material disparador - considerações preliminares de uma experiência clínica psicopedagógica. In: Psicopedagogia, Rev 14 (33), São Paulo, 1995.
DOLLE, Jean-Marie. Essas crianças que não aprendem: diagnóstico e terapias cognitivas. Petrópolis, rio de Janeiro, Vozes, 2002.
PAÍN, Sara. Diagnóstico e tratamento dos problemas de aprendizagem. Porto Alegre, Artes Médica, 1985.
RUBINSTEIN, Edith. A especificidade do diagnóstico psicopedagógico in Sisto, Fermino Fernandes...[et al.]. Atuação Psicopedagógica e Aprendizagem Escolar - Petrópolis, RJ, Vozes, 2002.
VISCA, Jorge. Clínica Psicopedagógica. Epistemologia Convergente. Porto Alegre, Artes Médicas, 1987.
___________. Psicopedagogia: novas contribuições; organização e tradução Andréa Morais, Maria Isabel Guimarães - Rio de Janeiro: Nova Fronteira,1991.
___________. El diagnostico operatorio em la practica psicopedagogica. Buenos Aires, Ag.Serv,G,. 1995.
___________. Técnicas proyetivas psicopedagogicas. Buenos Aires, Ag. Serv.G., 1995.
WEISS, M. L. L. Psicopedagogia Clínica: uma visão diagnóstica dos problemas de aprendizagem escolar. Rio de Janeiro, DP&A, 2003.
***********************************************RECURSOS A SEREM USADOS NO DIAGNÓSTICO E INSTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
I. Introdução
Preocupações com os recursos que podem ser utilizados no diagnóstico e intervenção psicopedagógica são constantes na tocante à Psicopedagogia, principalmente porque ela ainda não se constituiu uma profissão é, portanto, uma área de prestação de serviços, embora a Associação Brasileira de Psicopedagogia esteja empenhando-se para seu reconhecimento enquanto profissão regulamentada.
Considerando que os candidatos a cursos de psicopedagogia possuem formação acadêmica diversificada oriunda de vários cursos de graduação, como por exemplo Pedagogia, Letras, Fonoaudiologia, Matemática, Psicologia e áreas afins e visto que, os cursos de pós-graduação nesta área não delimitam a graduação dos candidatos, portanto, atendem clientelas diversificadas, ainda que o tempo de duração dos cursos de Pós variam de instituição para instituição, a preocupação com os recursos a serem utilizados na Psicopedagogia é necessária já que alguns psicopedagogos tendem a usar recursos específicos da Psicologia, sem serem formados para tanto. Neste sentido, a questão demanda reflexão é o que se propõe nesta pesquisa.
2. O que é psicopedagogia
Para SISTO (1996) é uma área de estudos que trata da aprendizagem escolar, quer seja no curso normal ou nas dificuldades. CAMPOS (1996), considera que os problemas de aprendizagem constituem-se no campo da Psicopedagogia.
A Psicopedagogia é vista por SOUZA (1996), como área que investiga a relação da criança com o conhecimento.
O Código de Ética da Psicopedagogia, no Capítulo I, Artigo 1 º, afirma que "A Psicopedagogia é campo de atuação em saúde e educação o qual lida com o conhecimento, sua ampliação, sua aquisição, distorções, diferenças e desenvolvimento por meio de múltiplos processos" .
A Psicopedagogia é uma área de estudos nova que pode e está atendendo os sujeitos que apresentam problemas de aprendizagem. Segundo BOSSA (1994), a Psicopedagogia nasce com o objetivo de atender a demanda - dificuldades de aprendizagem.
Segundo FERREIRA (1982, p. 1412), Psicopedagogia "é o estudo da atividade psíquica da criança e dos princípios que daí decorrem, para regular a ação educativa do indivíduo". Neste sentido, a Psicóloga e Psicopedagoga Nádia A. BOSSA (1995) considera que o termo Psicopedagogia parece deixar claro que se trata de uma aplicação da Psicologia à Pedagogia: por isso esta definição não reflete o verdadeiro significado do termo.
De fato, a Psicopedagogia vai além da aplicação da Psicologia à Pedagogia, pois ela não pode ser vista sem o caráter interdisciplinar BORGES (1994) e SOUZA (1996), o qual implica na dependência da contribuição teórico prática de outras áreas de estudos para se constituir como tal. Por outro lado, a Psicopedagogia não é "o estudo da atividade psíquica da criança e dos princípios que daí decorrem,..." , visto que ela não se limita à aprendizagem da criança, mas abrange todo processo de aprendizagem. Conseqüentemente, inclui quem está aprendendo, independente de ser criança, adolescente ou adulto.
"A Psicopedagogia é um campo de atuação em Saúde e Educação que lida com o Conhecimento, sua ampliação, sua aquisição, distorções, diferenças e desenvolvimento por meio de múltiplos processos..." .
Nesta definição, enfatiza-se a Saúde e a Educação como campo de atuação da Psicopedagogia, também, limita-o à Cognição, refere-se a múltiplos processo, mas não esclarece se "múltiplos processos" são as múltiplas técnicas de diagnóstico e intervenção dos problemas de aprendizagem.
Com a reformulação do Código de Ética em 1996, a conceituação de Psicopedagogia sofre alteração, passando ser a seguinte:
"... campo de atuação em Educação e Saúde que lida com o processo de aprendizagem humana; seus padrões normais e patológicos, considerando a influência do meio - família, escola e sociedade - no seu desenvolvimento, usando procedimentos próprios da Psicopedagogia". ( Cap. I; Artigo 1º).
Continua afirmando que a Psicopedagogia é uma área de atuação que engloba saúde e educação, também limita o campo de atuação à cognição, destacando que envolve os padrões normais e patológicos da aprendizagem, ainda, enfatiza a influência do meio (família, escola e sociedade).
A definição de Psicopedagogia apresentada pelo Código de Ética do psicopedagogo, portanto, uma decisão tomada em consenso pelos membros da Associação Brasileira de Psicopedagogia enfatiza que esta é um campo de atuação. Se a Psicopedagogia é conceituada como campo de atuação e não como profissão, qual é sua validade?
Nádia Aparecida BOSSA (1994, p. 01), psicopedagoga, (em sua tese de mestrado em Psicologia da Educação na PUC , em abril de 1993), afirma que "...no momento, a validade da Psicopedagogia, como corpo teórico organizado, não lhe assegura a qualidade de saber cientifico, devendo-se fazer realmente ainda muito no sentido de ela sair da esfera empírica e poder vir a estruturar-se como tal...".
Segundo a autora, a Psicopedagogia, ainda está construindo seu corpo teórico, portanto se constituindo como ciência. Assim sendo, a Psicopedagogia é uma área de estudos muito nova, portando pode ser vista com desconfiança por alguns. Por outro lado, o fato de ser jovem, permite que se construa para atender os problemas enfrentados no processo ensino-aprendizagem
São crescentes os problemas referentes às dificuldades de aprendizagem no Brasil. A Pedagogia embasada em teóricos conceituados como Piaget, Vygotsky, Freinet, Ferreiro, Teberosky e outros, tem sido insuficiente para prevenir ou intervir nas dificuldades de aprendizagem. Para tanto, a Psicopedagogia surge para auxiliar na intervenção e prevenção dos problemas de aprendizagem.
BOSSA(1994) afirma que os problemas de aprendizagem possuem origem na constituição do desejo do sujeito. As explicações para o fracasso escolar tem sido dadas com justificativa na desnutrição, nos problemas neurológicos e genéticos. Poucas são as explicações que enfatizam as questões inorgânicas, ou seja, as de ordem do desejo do sujeito.
Contudo, para entender os problemas de aprendizagem realizar diagnósticos e intervenções torna-se necessário considerar os fatores tanto internos quanto externos desse sujeito, não devendo ser ignoradas as causas exógenas e endógenas.
Os cursos de Pós-Graduação, os quais dão formação teórica e às práticas (com estágios), aos estudantes enfatizam o caráter interdisciplinar desta atuação, pois este enfoque exige a integração de profissionais de diversas áreas, tanto para o enfoque preventivo quanto para o terapêutico.
Ressalta BOSSA (1998,p8) que "os psicopedagogos têm construído sua teoria a partir do estudo dos problemas de aprendizagem. E a clínica tem se constituído em eficiente laboratório da teoria".
Tanto na clínica quanto na instituição, o psicopedagogo atua intervindo como mediador entre o sujeito e sua história traumática, ou seja, a história que lhe causou a dificuldade de aprender. No entanto, o profissional não deve fazer parte do contexto do sujeito, já que ele está contido numa dinâmica familiar, escolar ou social da qual o profissional deve manter-se ciente do problema de aprendizagem, fazer a leitura e a intervenção no mesmo. Assim, com o auxílio do psicopedagogo, o sujeito pode reelaborar sua história de vida reconstruindo fatos que estavam fragmentados e retomar o percurso normal de sua aprendizagem.
Neste ângulo, o trabalho clínico do psicopedagogo se completa com a relação entre o sujeito, sua historia pessoal e a sua modalidade de aprendizagem. Já o trabalho preventivo objetiva "evitar" os problemas de aprendizagem, enfatizando a instituição escolar, os processos didáticos e metodológicos, a dinâmica institucional com todos profissionais nela inseridos.
A sustentação do trabalho psicopedagógico ocorre através das diversas áreas do conhecimento humano. Eis algumas delas : Psicologia, Pedagogia, Psicanálise, Psicologia genética, Lingüística.
Neste sentido, ressalta BOSSA(1998,p.8), que "A psicopedagogia vem constituindo seu corpo teórico na articulação da psicanálise e psicologia genética. Articulação que fica evidente quando se trata de observar os problemas de aprendizagem, pilar da teoria da psicopedagogia
Para Psicopedagogia é fundamental que o profissional faça uso do trabalho interdisciplinar; pois os conhecimentos específicos das diversas teorias contribuem para o resultado eficiente da intervenção ou prevenção psicopedagógica. Por exemplo, a Psicanálise pode fornecer embasamento para compreender o mundo inconsciente do sujeito; a Psicologia Genética proporciona condições para analisar o desenvolvimento cognitivo do sujeito; a Psicologia possibilita compreender o mundo físico e psíquico do sujeito; a Lingüística permite entender o processo de aquisição da linguagem, tanto oral quanto escrita
Nestas áreas encontramos autores renomados que contribuem para o crescimento da Psicopedagogia , tanto em nível preventivo quanto em nível clínico.
Em nível preventivo, segundo BOSSA (1994), a Psicopedagogia tenta detectar perturbações no processo ensino - aprendizagem, conhecer a dinâmica da instituição educativa, orientar a instituição quanto à metodologia de ensino utilizada. Isto, através de orientação de estudos e apropriação dos conteúdos escolares
Pode-se concluir que o campo de atuação do psicopedagogo é a aprendizagem, sua intervenção é preventiva e curativa, pois se dispõe a detectar problemas de aprendizagem e "resolvê-los", também, preveni-los evitando que surjam outros.
No enfoque preventivo, BOSSA(1994), enfatiza que a função do psicopedagogo é detectar possíveis problemas no processo ensino-aprendizagem; participar da dinâmica das relações da comunidade educativa, objetivando favorecer processos de integração e trocas; promover; realizar orientações metodológicas para o processo ensino-aprendizagem, considerando as características do indivíduo ou grupo; colocar em prática processo de orientação educacional, vocacional e ocupacional em grupo ou individual.
Neste sentido, cabe questionar como o psicopedagogo atua para detectar e intervir nos problemas de aprendizagem?
3. Diagnóstico psicopedagógico
O psicopedagogo usa o diagnóstico psicopedagógico para detectar os problemas de aprendizagem.
RUBINSTEIN (1996) compara diagnóstico psicopedagógico a um processo de investigação, onde o psicopedagogo assemelha-se um a detetive a procura de pistas, selecionando-as e centrando-se na investigação de todo processo de aprendizagem, levando-se em conta a totalidade dos fatores envolvidos neste processo.
Afirma ela que o diagnóstico psicopedagógico é em si mesmo uma intervenção, pois o psicopedagogo tem que interagir com o cliente, a família, e a escola, partes envolvidas na dinâmica do problema de aprendizagem.
A autora (1996,p128) ilustra que " durante e após o processo diagnóstico serão construídos um conhecimento e uma compreensão a respeito do processo de aprendizagem". Isto permite que o psicopedagogo tenha maior clareza a respeito dos objetivos a serem alcançados no atendimento psicopedagógico.
O diagnóstico psicopedagógico clínico, segundo a estudiosa (1996, p.134) deve concentrar sua ação no sentido de "... levantar hipóteses, verificar o potencial de aprendizagem, mobilizar o aprendiz e o seu entorno (família e escola) no sentido da construção de um olhar sobre o não aprender RUBINSTEIN.
Quais recursos o psicopedagogo usa para realizar o diagnóstico e a intervenção psicopedagógica?
O Código de Ética da Psicopedagogia , em seu (Capítulo I - Dos Princípios - Artigo 1º) afirma que o psicopedagogo pode utilizar procedimentos próprios da Psicopedagogia. Neste sentido, realizando o diagnóstico psicopedagógico, o psicopedagogo está utilizando procedimentos próprio de sua área de atuação. No artigo 2º , enfatiza-se o caráter interdisciplinar da Psicopedagogia, destaca o uso de recursos das várias áreas do conhecimento humano para a compreensão do ato de aprender, também, menciona o uso de métodos e técnicas próprias.
RUBINSTEIN (1996) destaca que o psicopedagogo pode usar como recursos a entrevista com a família; investigar o motivo da consulta; realizar procurar a história de vida da criança realizando Anamnese; entrevistar o cliente; fazer contato com a escola e outros profissionais que atendam a criança; manter os pais informados do estado da criança e da intervenção que está sendo realizada; realizar encaminhamento para outros profissionais, quando necessário.
Os recursos apontados por RUBINSTEIN (1996) constituem-se em instrumentos para a realização do diagnóstico e intervenção psicopedagógica. Porém, BOSSA (1994), destaca outros recursos para o diagnóstico psicopedagógico, referindo-se a Provas de Inteligência (Wisc); Testes Projetivos; Avaliação perceptomotora (Teste Bender); Teste de Apercepção Infantil (CAT.); Teste de Apercepção Temática(TAT.); também, refere-se a Provas de nível de pensamento (Piaget); Avaliação do nível pedagógico ( nível de escolaridade); Desenho da família;Desenho da figura Humana;H.T.P - Casa, Arvore e Pessoa (House, Tree, Person); Testes psicomotores: Lateralidade; Estruturas rítmicas ..
A autora, assim como FERNÁNDEZ (1991) e PAÍN (1985) sugere, ainda, o uso de jogos considerando que o sujeito através deles pode manifestar, sem mecanismos de defesa, os desejos contidos em seu inconsciente. Além do mais, no enfoque psicopedagógico os jogos representam situações-problemas a serem resolvidas, pois envolvem regras, apresentam desafios e possibilita observar como o sujeito age frente a eles, qual sua estrutura de pensamento, como reage diante de dificuldades. Levando-se em conta que o sujeito possui poucos recursos (vocabulário, por exemplo) para se comunicar, expressar o que sente, o que deseja, pode fazer uso de jogos, desenhos e brincadeiras para manifestar o que sente. Sendo assim, cabe ao psicopedagogo estar atento para fazer a leitura e análise das mensagens que o sujeito está lhe enviando.
Quanto ao uso de testes, BOSSA (1994), não apresenta restrições quanto ao uso quanto ao uso dos instrumentos a que ela se refere para o diagnóstico psicopedagógico. Alguns são testes são de uso exclusivo de psicólogos, como as Provas de Inteligência (Wisc),Testes Projetivos, Avaliação perceptomotora (Teste Bender), Teste de Apercepção Infantil (CAT.), Teste de Apercepção Temática(TAT.). Porém, a autora chama atenção para as recomendações dos autores dos testes, como no CAT Infantil, no manual, afirma-se que o mesmo poderá ser aproveitado por por psiquiatras, psicanalistas, psicólogos, assistentes sociais e professores.
Considerando que há um grande receio por parte dos psicólogos e Conselho Federal de Psicologia ( CFP), que profissionais não formados em psicologia façam uso de testes ditos específicos da psicologia, principalmente, os que medem o nível de inteligência e testes projetivos, a leitura atenta às indicações dos autores quanto ao uso dos mesmos pode evitar posturas anti-éticas no que se refere a relações com outros profissionais, em especial com os da área da Psicologia.
Ainda, salienta BOSSA(1994, p.51), que a legislação que regulamenta a profissão de psicólogo a Lei nº 4119, de 27 de agosto de 1962 não especifica quais são os testes quais são os testes específico de uso dos psicólogos.
Para evitar tal fato, o psicopedagogo pode ser criativo e desenvolver atividades que possibilitem observar os aspectos da inteligência e da projeção e, se o profissional achar que os testes psicológicos são importantíssimos para concluir um diagnóstico, pode encaminhar o cliente para uma avaliação psicológica, efetivando um trabalho mulitidisciplinar .
Considerando que a Psicopedagogia é uma área multidisciplinar, deve o psicopedagogo desenvolver trabalhos integrado com outros profissionais, respeitando o seu cliente e resguardando, para os psicólogos, a exclusividade do uso dos testes psicológicos, pois a Psicopedagogia conta com uma série de recursos que permite ao psicopedagogo desenvolver seu trabalho em harmonia com outras áreas do conhecimento humano, trabalhando nos estritos limites das atividades que lhes são concedidas, conforme aponta o Capítulo III do Código de Ética. .
4.0. Recursos para o diagnóstico e intervenção psicopedagógico
O diagnóstico psicopedagógico, segundo RUBINSTEIN (1996), possui uma dinâmica muito particular, fazendo com que o psicopedagogo participe ativamente do processo psicopedagógico, contrariando os padrões onde o terapeuta adota uma atitude estática diante da dinâmica do caso.
A conduta dinâmica proposta por RUBINSTEIN no diagnóstico psicopedagógico é a Avaliação Assistida.
LINHARES (1995,p.23), refere-se à avaliação assistida como sendo a "combinação entre avaliar e intervir ensinando diretamente o examinando durante o processo de avaliação"
A avaliação assistida ou avaliação dinâmica, está fundamentada na teoria sócio-construtivista proposta por VYGOTSKY, a qual aborda a "aprendizagem mediada e a zona de desenvolvimento proximal".
Na aprendizagem mediada, LINHARES (1995) enfatiza que os eventos são selecionados, ordenados, filtrados e dotados de significado específico por agentes mediadores, com o objetivo de modificar o repertório das crianças e estimular a manifestação de níveis mais elevados de funcionamento, com o objetivo da criança revelar seu potencial para a aprendizagem.
Este conceito de aprendizagem mediada influenciou a avaliação do desempenho intelectual, e vários estudiosos propuseram maior ênfase no potencial de aprendizagem do que no desempenho real. Este novo enfoque está fundamentado na Teoria de VYGOTSKY, precisamente em seu conceito de "zona de desenvolvimento proximal". Neste sentido, o "examinador" verifica a convergência entre desenvolvimento e aprendizagem.
A diferença entre avaliação assistida e a avaliação padronizada, segundo LINHARES, está no fato de que a primeira se caracteriza pelo fator dinâmico, já a segunda se caracteriza como estática.
O quadro abaixo mostras as características entre ambas avaliações.
Avaliação Assistida Avaliação Padronizada
Dinâmica Estática
É flexível Possui instruções padronizadas.
Valoriza o conhecimento adquirido e resolução de problemas. O "avaliador" possui comportamento pautado pelo manual do teste.
Dá ênfase em como o conhecimento é adquirido. Valoriza produtos de aprendizagem
Resultados Resultados
Indicadores do processo de aprendizagem Comparar indivíduos baseando-se em seus escores com grupos de referência.
TABELA 1: Comparação entre Avaliação Assistida e Padronizada.
Para LINHARES (1995) deve-se levar em conta quatro dimensões para caracterizar a avaliação assistida, as quais são compostas pela Interação (onde as ações são compartilhadas entre os sujeitos envolvidos); Método (pode ser estruturado de acordo com o grau de interação entre o sujeito e o examinador, ainda na maneira de incorporar as intervenções de ajuda no processo da avaliação, podendo ser clínico ou estruturado); conteúdo que se deseja ensinar; Foco (é o desempenho potencial revelado através da condição de assistente).
Com relação ao método, LINHARES(1995) destaca que como as intervenções de ajuda no método clínico são menos sistematizadas, assim como as intervenções se processam de modo flexível ao longo da avaliação, então fica difícil separar o desempenho inicial de base (que ocorre sem ajuda) do desempenho potencial (que pode ocorrer através da mediação). Deste modo, o método clínico permite a avaliação qualitativa mais geral do desempenho do examinado, enquanto que o método estruturado, envolve a intervenção de ajuda mais sistematizada. Nele pode-se estabelecer uma estruturação no processo de avaliação. Separa-o em fases que se diferenciam pelo fato de serem sem assistência ao educando e com assistência.
Na fase de ajuda, no método estruturado é prevista a direção que se pode tomar. Mas, pode variar a forma e a quantidade de ajuda oferecida.
Em relação ao conteúdo, LINHARES (1995) destaca que com a avaliação assistida pode-se avaliar as habilidades de domínio geral cognitivo: operações cognitivas e raciocínio; as habilidades de domínio específico como a compreensão da leitura, consciência fonológica e habilidades aritméticas.
Como o Foco é o desempenho do potencial da criança revelado através da condição de assistência que se dá ao educando. Através do foco, pode-se identificar a região de sensibilidade à instrução do examinado; a velocidade de aprendizagem e a amplitude de transferência; crianças com alto escores que apresentam bom desempenho na fase de investigação, independente da assistência; estimular a localização do desenvolvimento potencial na zona de desenvolvimento proximal.
Levando em conta as características da avaliação assistida, LINHARES (1995, p.29), considera que " a avaliação assistida parece ser uma modalidade de avaliação promissora, especialmente para crianças classificadas como deficientes mentais ou referidas como apresentando dificuldades de aprendizagem".
Outra recurso para o diagnóstico psicopedagógico é a LPAD (Learning Potencial Assessment Device).
Tanto RUBINSTEIN (1996) quanto LINHARES (1995), referem-se a LPAD (Learning Potencial Assessment Device) proposto por FEUERSTEIN (1996), como sendo um método dinâmico de caráter diagnóstico para avaliar o potencial cognitivo dos sujeitos com problemas de aprendizagem.
RUBINSTEIN (1996), destaca que FEUERSTEIN considera os métodos tradicionais de avaliação insuficientes para avaliar a capacidade de aprendizagem dos indivíduos, enquanto que LINHARES aponta o LPAD como sendo o instrumento dinâmico para avaliar o potencial cognitivo, incluindo o mapeamento das funções cognitivas deficientes. Ela, ainda enfatiza um segundo material desenvolvido por FEUERSTEIN o PEI (Instrumental Enrichment), o qual visa a modificabilidade cognitiva estrutural, combatendo e corrigindo funções cognitivas abrangentes que instalam, reforçam os princípios cognitivos fundamentais ao nível operacional abstrato.
4.1 O LPAD (The Learning Potencial Assesment Device)
O LPAD (The Learning Potencial Assesment Device) criado por Feuerstein em 1972, é considerado um teste dinâmico, cujas variáveis mais relevantes são os mecanismos pessoais que o sujeito articula, na sua interação com o meio, o que determina o seu potencial cognitivo.
Segundo Feuerstein, esse procedimento de avaliação, o LPAD, apresenta quatro diferenças básicas dos testes psicométricos tradicionais:
1. Modifica para o examinador a situação de neutralidade na aplicação do teste: o examinador torna-se um "mediador", que poderá estimar o potencial de aprendizagem de seu aluno, observando o que este consegue fazer sozinho e depois com sua ajuda, à medida que as dificuldades emergem nas tarefas propostas.
Ao estimular o aluno a vencer as dificuldades observadas, o professor-mediador neutraliza as situações de fracasso, demonstrando para o aluno que a situação de aprendizagem poderá ser agradável e proveitosa.
2. Apresenta mudanças na estrutura do teste: a estrutura do teste deve favorecer a apresentação gradual e bem seqüenciada das propostas de aprendizagem. Dessa forma, o professor-mediador criará uma situação de aprendizagem com experimentadas dificuldades, mas sob um clima de apoio o encorajamento.
Assim, o material de avaliação bem organizado, com etapas de dificuldades estudadas, possibilita ao professor acompanhar os recursos utilizados e as transformações que ocorrem no pensamento desses alunos diante da situação problema trabalhada.
Segundo Gunzburg(1973) e Case(1972) , uma avaliação bem planejada será aquela que proporcionará ao aluno o encorajamento para superar as dificuldades apresentadas no decorrer de seu processo. Assim, as diferentes estratégias utilizadas como recursos pelo aluno para realizar atividades propostas serão extremamente importantes na identificação e estimulação do seu potencial cognitivo.
3. Transforma o produto esperado do teste em um processo de orientação. Assim, os objetivos da avaliação passam a focar mudanças ocorridas no processo de aprendizagem. Essa abordagem dinâmica para a avaliação auxilia o professor-mediador a construir processos de remediação para a aprendizagem a partir de sua interação direta com o aluno.
Segundo Feuerstein, toda interpretação do desenvolvimento humano deverá priorizar a interpretação da forma como o indivíduo utiliza seu potencial cognitivo e soluciona os seus problemas do cotidiano.
4. A exigência de uma mudança na interpretação dos dados recolhidos na avaliação. Haverá um ênfase maior nos sucessos do aluno durante o processo. As técnicas tradicionais de avaliação acabam enfatizando e medindo a dificuldade e a performance medíocre do aluno. Assim, as respostas positivas e os sucessos obtidos pelo aluno, durante o processo de avaliação, funcionariam como indicadores de seu potencial de aprendizagem e indicariam uma pista para o contato com as funções psicológicas superiores desse aluno.
Portanto, essas quatro características apresentadas por Feuerstein na estruturação do LPAD exigiram um procedimento de avaliação diferenciado, sendo necessário que se sejam apresentadas as tarefas à crianças e que seja feita observação a respeito da forma como ele se comporta diante da tarefa e a soluciona, sem contar inicialmente com o auxílio do avaliador. Durante a aplicação da atividade deverá ser realizada a mediação da tarefa à criança objetivando auxiliar o indivíduo na identificação da proposta da tarefa e na sua execução organizada.
Quanto a este fato, Feuerstein afirma ser possível definir as habilidades cognitivas desse sujeito examinado e descobrir as suas formas de ação para solucionar problemas. Assim, poderão definir rotas alternativas de trabalho que poderão enriquecer e até modificar a sua "inteligência global".
Neste aspecto Feuerstein ressalta, no entanto, a importância de se criar um clima amistoso de confiabilidade entre o avaliador e o aluno, para que se evitem tensões, desistências e, por conseqüência, a desmotivação diante das dificuldades apresentadas.
Os déficits encontrados nessa análise dizem respeito à impulsividade do indivíduo diante de problemas propostos em decorrência da sua desorganização exploratória e das suas dificuldades nas habilidades comparativas, que envolveriam seu campo perceptual e interativo com o meio.
Ao analisar as dificuldades do aluno durante o processo de aprendizagem, Feuerstein afirma que muitos indivíduos considerados rebaixados cognitivamente, deveriam ser considerados "operadores retardados", e suas habilidades cognitivas poderão ser melhoradas qualitativamente, mesmo na fase mais tardia da adolescência ou na fase adulta. Isto seria possível graças a uma ativa e adequada mediação nos processos de aprendizagem.
Depois de apresentar a atividade à criança, observar como ela a realiza e realizar a mediação da atividade, Feuerstein propõe novamente a realização da tarefa para saber se o indivíduo avaliado poderá obter sucesso na proposta apresentada, demonstrando que ocorreu a aprendizagem, mas não como um processo acumulativo de informações e conceitos, e sim como um processo de reconstrução de seus esquemas cognitivos.
Para Feuerstein, os indivíduos que apresentam suas capacidades cognitivas retardadas demonstram, no decorrer do processo de avaliação, dificuldades na elaboração e resposta das tarefas (input-output). Isso implicaria em trabalhar com a aprendizagem mediada (parceiro experiente X parceiro inexperiente) e com um conceito global a respeito da inteligência, que deverá ser interpretada qualitativamente, ou seja, valorizando a qualidade das tarefas realizadas e não a quantidade das mesmas.
Sob esse ponto de vista, Feuerstein argumenta que nenhum instrumento de avaliação da inteligência pode deixar de considerar os processos individuais do pensamento, com base nos processos de "input" do sujeito, ou seja, na forma como indivíduo organiza e entra em contato com as informações; a forma como o indivíduo opera seu pensamento baseando-se nas informações disponíveis, ou seja, seus processos de elaboração; como o indivíduo comunica o resultado dos seus processos mentais, ou seja, a maneira como ele faz uso de suas informações (output), através de seus comportamentos e habilidades.
Afirma RUSSO (1994) que o modelo de processo de pensamento considerado por Feuerstein, input-elaboração-output, além de proporcionar a identificação das dificuldades potenciais dos processos mentais do indivíduo, poderá, também, proporcionar através do procedimento de avaliação, pré-teste-aprendizagem mediada-teste, o desenvolvimento e o exercício das capacidades cognitivas afetadas no sujeito.
Enfatiza a referido autora que Feuerstein acredita na importância da motivação e das características afetivas do sujeito, como componente fundamental para as realizações desses procedimentos de avaliação. Tais idéias foram materializadas em seu instrumento de avaliação, denominado "Learning Potencial Assessment Device - LPAD".
Após a aplicação do LPAD, nas suas diversas modalidades, Feuerstein sugere como estratégia pedagógica de trabalho o uso do instrumento PEI (Program Instumental Enrchiment) ou PEI (Programa de Enriquecimento Cognitivo), objetivando proporcionar aos indivíduos considerados "operadores retardados" um enriquecimento de seu potencial cognitivo.
4.2 PEI (Program Instumental Enrchiment) ou Programa de Enriquecimento Instrumental
O PEI se fundamenta na concepção de que é a inteligência que enfatiza sua condição de ser receptiva a trocas e modificações
FEUERSTEIN, (apud GARCIA, 1991, p.18), afirma que a inteligência é um processo dinâmico auto-regulador altamente sensível aos efeitos do meio ambiente. Deste modo, contesta as posições da psicologia que concebem a inteligência como organismo determinado geneticamente e que permanece constante e invariável ao longo de toda vida.
O criador do PEI estabeleceu como objetivo deste instrumento, aumentar a capacidade do organismo humano de ser modificado através da exposição direta dos estímulos e experiências obtidas através do enfrentamentos de eventos da vida, com oportunidades formal e informal de aprendizagem.
Este objetivo geral implica objetivos específicos como corrigir as funções mentais deficientes; possibilitar a formação de conceitos básicos para a realização dos exercícios do programa; desenvolver um sistema de hábitos a partir das experiências obtidas nos exercícios realizados; proporcionar ao indivíduos pensamentos reflexivo e insight; contribuir para mudanças de atitudes.
O PEI é composto por, aproximadamente, 600 páginas de exercícios, distribuídos em quatorze instrumentos denominados Organização de Pontos; Orientação Espacial; Comparações; Percepção Analítica; Orientação Espacial II; Ilustrações; Classificação; Relações Temporais; Progressões Numéricas; Relações Parentesco Familiar; Relações Transitivas; Silogismo; Desenho de Padrões e Instruções. Estes exercícios são apresentados ao estudante página por página, para serem desenvolvidos.
GARCIA (1991) menciona que a realização dos exercícios requer uma série de processos de elaboração e transformação onde o estudante contribui ativamente para a organização, re-estruturação, descobrimento e re-aplicação das relações produzidas.
4.3 Outras Alternativas
Muitas alternativas para uso do psicopedagogo estão sendo colocadas no mercado. Os recursos apresentados por autores de materiais publicados pela Editora Vetor, que além de fornecer material, também promove cursos para orientar a utilização dos mesmos, vem beneficiando a avaliação e intervenção psicopedagógica. Eles estão aqui resumidos, pois, a análise de cada um demanda outra dissertação.
1. Lendo e Escrevendo (1 e 2)
Este material pode ser aplicado para detectar se o estudante possui os requisitos básicos para o processo de Alfabetização.
Pode ser usado em alunos da Pré- escola e séries iniciais.
Autora: Geraldini P. Wintter e Melany S. Copit
2. Teste de Prontidão Horizontes
Pode ser usado para detectar Maturidade/ Prontidão para Alfabetização na pré-escola e séries iniciais do Ensino Fundamental.
Autora: Neda Lian Branco Martins
3. Metropolitano de Prontidão - fator R
Pode ser usado para detectar prontidão alfabetização na pré-escola e séries iniciais do Ensino Fundamental.
Autor: G.H. Heldreth, Ph.D. Griffiths
Adaptação e Padronização: Ana Maria Poppovic
4. Becasse R-l (F e M)
Este teste pode auxiliar no diagnóstico da maturidade escola. Ele traz atividades envolvendo: Estruturação de estórias;Títulos; conteúdos; Redação Omissão ou recusa; Dinâmica da Aplicação; Escolha da Lâmina.
Autora: Bettina Katzenstein Schoenfeldt.
5. Papel de Carta
Este material pode ser utilizado para auxiliar na Avaliação das Dificuldades de Aprendizagem. Apresenta como conteúdo atividades envolvendo comunicação e vinculação.
A Editora Vetor recomenda que este teste seja usado somente por psicólogos.
Autora: Leila Sara José Chamat
6. Prontidão para Alfabetização
Trata-se de um Programa para o Desenvolvimento de Funções Específicas destinadas a alfabetização. Apresenta conteúdo teórico e prático.
Autoras: Ana Maria Poppovic e Genny Golubi de Moraes
Além dos recursos apresentados pela editora Vetor, as provas piagetianas e os níveis de alfabetização são igualmente importantes podendo ser confeccionados pelo próprio profissional
7. As Provas Piagetianas
Podem ser usadas para detectar o estágio do raciocínio lógico matemático da criança. O Conteúdo pode ser montado com o número de provas que se achar necessário. Ernesto Rosa Neto apresenta uma seqüência compostas por tarefas que envolvem a Classificação, Seriação, Classe- Inclusão; Conservação de Quantidades Contínuas e Quantidades Descontínuas.
8. Os Níveis de Escrita
Os Níveis de Escrita estudados por Emília Ferreiro, também são recursos excelentes. Eles podem ser utilizados para identificar o nível de escrita em que a criança se encontra no processo de alfabetização, podendo ser: icônico (a criança representa seu mundo através de desenhos); não icônico (a criança consegue usar letras para escrever e desenhar representando sua forma de escrita, porém o uso das letras não está sistematizado, muitas vezes coloca as letras e faz o desenho, usando ambos para escrever uma mesma palavra); realismo nominal (faz o uso das letras conforme o tamanho do objeto e não de acordo com a palavra, para ela o objeto grande deve ter muitas letras e o objeto pequeno poucas letras); nível pré-silábico (a criança já sabe que precisa de letras para escrever, embora não faça distinção entre letra e número, também já sabe que precisamos usar muitas letras diferentes para escrever). Deste modo, a criança usa as letras do próprio nome variando a posição e a ordem em que elas aparecem no seu nome, para escrever novas palavras); nível pré-silábico em conflito (nesta fase a criança pode enfrentar um conflito já que conta as letras para escrever, mas no momento de escrever acha que é necessário muitas letras para escrever, acreditando que com poucas letras não é possível a escrita, ainda, ao pedir a ela que faça a relação de letras com sílabas, ela risca as letras que parecem sobrar. Isso pode acontecer com palavras monossílabas; ao vencer este conflito a criança entrará no nível pré-silábico); nível pré-silábico (a criança passa a atribuir valor sonoro a cada uma das letras que compõe a escrita e descobre que a escrita representa a fala). Deste modo, formula a sílaba - sem valor sonoro -, cada letra representa um valor som; nível pré-silábico "elaborado" (a criança percebe o valor silábico, portanto, usa uma letra para significar uma sílaba, assim usa uma letra para escrever a palavra monossílabo, mas como acredita que uma letras só não dá para ler, coloca outras só para que possa ler); nível silábico "alfabético" (começa a usar algumas sílabas, embora algumas outras usa só uma letra e se contenta com isso vai descobrindo a sílaba e começa a usá-la); nível alfabético (a criança já usa praticamente todas as sílabas simples, embora com alguns erros, sendo necessário trabalhar a ortografia).
9. Informática.
Os recursos da informática, também, não podem ser ignorados pela Psicopedagogia.
É verdade que o computador não possui flexibilidade para compreender outras linguagens, decifrar códigos desconhecidos ou criticar o que lhe é apresentado. Ele é mais um recurso que pode ser explorado de inúmeras maneiras.
Considerando que a Psicopedagogia trabalha com a aprendizagem humana, os recursos da informática poderão possibilitar a criação, a comunicação, a interação, enfim novas descobertas promovendo a aprendizagem humana.
Foram mencionados aqui, alguns instrumentos que podem ser usados para o diagnóstico e intervenção psicopedagógica, enfatizando que se o psicopedagogo não utilizar recursos exclusivos de outras áreas, não estará ferindo a ética profissional, ainda estará zelando pelo bom relacionamento com especialistas de outras áreas, conforme menciona o Código de Ética da Psicopedagogia, (Capítulo II, Das Responsabilidades dos Psicopedagogos, Artigo 6º, letra b), também, estará garantindo o bem estar das pessoas em atendimento profissional, conseqüentemente, mantendo a ética profissional.
No que tange ao levantamento realizado nesta pesquisa sobre alguns recursos para diagnóstico e intervenção psicopedagógica, destaca-se que não se trata de apresentar um quite de materiais para serem utilizados com todas as crianças e em todas situações, pois tal atitude colocaria o psicopedagogo na posição de um simples aplicador de testes, não é isto que se quer para este profissional, também, não é pretensão da pesquisadora fornecer roteiro ou receita para diagnóstico e intervenção. O propósito aqui foi refletir sobre os recursos que estão no mercados. Portanto, cabe ao profissional analisar cada situação e decidir por aplicar o recurso que lhe for conveniente tendo em vista a qualidade de seu trabalho e o compromisso com o cliente.
Conclusão
Pode-se concluir que o mercado editorial dispõe de muitos recursos para diagnóstico e intervenção psicopedagógica possibilitando ao psicopedagogo desenvolver seu trabalho de maneira eficiente e eficaz, contribuindo assim para melhorar a qualidade do ensino, quer sua atuação seja na clínica ou na institucional escolar, quer seu enfoque de trabalho seja preventivo ou curativo, no sentido de intervir no problema de aprendizagem já apresentado pela criança ou no sentido de prevenir a instalação de problemas nos educandos. Deste modo, não há razão para que o psicopedagogo faça uso de recursos específicos da Psicologia uma vez que possui recursos diversificados. Se houver necessidade de uma avaliação do nível emocional ou inteligência deve encaminhar a criança para um psicólogo, pois ele poderá realizar a avaliação e, se necessário uma intervenção nesses níveis os dois profissionais, psicopedagogo e psicólogo, poderão atuar juntos, até mesmo porque a Psicopedagogia é uma área de atuação multidisciplinar.
Bibliografia
BARONE, Leda M. C. Psicopedagogia - O Caráter Interdisciplinar na Formação e Atuação Profissional. Considerações a Respeito da Ética. Porto Alegre: Artes Médicas, l987.
_____________. A Especificidade do Diagnóstico Psicopedagógico. In: Atuação Psicopedagógica e Aprendizagem Escolar. Petrópolis: Vozes, 1996. p. 127 - 139.
BOSSA, Nádia Ap. A Psicopedagogia no Brasil: Contribuições a Partir da Prática. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.
CÓDIGO DE ÉTICA DA ABPP, In: Revista Psicopedagogia. São Paulo. v.12, Nº25, p.36-37, ABPp, 1993.
CUBERO, Rosário & MORENO, Carmem. Desenvolvimento Psicológico e Educação. In: Cesar COLL, Jesús PALÁCIOS, Alvaro MARSHESI. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.
DICIONÁRIO BRASILEIRO DA LÍNGUA PORTUGUESA. 11ª Edição. 9ª Tiragem. Editora Gamma: Rio de Janeiro, 1982.
FERNANDEZ. Alícia. Inteligência Aprisionada. Porto Alegre: Artes Médicas,1991.
FLORES, Herval G. Ética e Conhecimento. Revista de Psicopedagogia. Vol. 12. N.º 25, 1993.
GARCIA, Ligia Garcia. Las Experiências de Aprendizaje a Atraves de Un mediador y Sus Efectos En El Desarrollo De Estructuras Cognoscitivas. In IX Congresso Latino - Americano de Neurologia Infantil . Blumenau/ Sta. Catarina, 1991.
LINHARES, Maria Beatriz M. Avaliação Assistida. Psicologia: Teorias e Pesquisa, Brasília, 11 (1): 23-31, 1995.
RUBINSTEIN, E.. A Intervenção Psicopedagógica Clínica, in SCOZ at alii, Psicopedagogia: Contextualização, Formação e Atuação Profissional, Porto Alegre: Artes Médicas, l992.
RUSSO, Luiza. Uma Introdução à Abordagem de Reuven Feuerstein na Avaliação Indivíduos com Atraso de Desenvolvimento. Psicopedagogia. São Paulo,13 (34): 5-8, Agosto, 1994.
VETOR. Programação de Cursos 1º Semestre 1999. São Paulo. Editora Psico-pedagógica Ltda,.1999.
VYGOTSKY, Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes., 1991.
***********************************************Teste Projetivo: O Desenho
O teste do desenho é mais um dos recursos ao qual o psicológico recorre como auxiliar da sua praxe seja na empresa, indústria, clínica ou escola. Em suas variadas formas, ele está presente nas atividades de seleção, avaliação e ajuda psicológica. Mas, afinal, o que se busca avaliar por meio do desenho nessas situações? Este artigo pretende esclarecer e contextualizar o teste do desenho, na tentativa de dissipar dúvidas que, quase sempre, angustia os candidatos quando submetidos, em particular, a esse tipo de instrumento nos processos seletivos. Campos (1999) destaca que o primeiro trabalho sobre o desenho como fenômeno expressivo, digno de menção, foi realizado em 1887, por Ricci, em Bolonha. O H-T-P (House - casa, Tree - árvore, Person - pessoa), é o teste projetivo mais usado em exame psicotécnico/seleção de pessoal, avaliação clínica, etc. Outros testes, mas apenas por meio da figura humana, a exemplo do Goodenough e do Machover, estão voltados para mensuração da inteligência infantil.
Nesse momento, se faz necessário uma breve descrição do H-T-P. Este teste é administrado à criança acima de 8 anos de idade, adolescente e adulto, cuja aplicação pode ser em nível individual ou em grupo. Seu tempo de realização é livre, mas, geralmente, não ultrapassa a média de 30 a 90 minutos. O material utilizado é papel ofício A-4 (tamanho ideal, não pode ser papel com pauta), lápis grafite n. 2 (de modo geral grafite é mais apropriado para desenhar, facilita o controle do tônus muscular sobre os traços, ao passo que o estereográfico é escorregadio). Os desenhos são feitos à mão livre, ou seja, sem régua ou objetos que sirva a essa função. Embora, o uso da borracha, por parte do aplicador, seja optativo, quase sempre compõe o kit, até porque que a sua utilização, por si, já consiste em motivo de análise. Quando se trata de criança, também se utiliza lápis coloridos, no que se constitui, assim, a Bateria Acromática e Cromática do H-T-P.
Na concepção de Buck (2003), o H-T-P tem como objetivo obter informação sobre como uma pessoa vivencia a sua individualidade em relação aos outros, e em facilitar a projeção de elementos da personalidade e de áreas de conflitos, identificados como o propósito de avaliação ou terapêutica. Ainda para o autor, “os desenhos também estimulam o estabelecimento de interesse, conforto e confiança entre o examinador e o cliente”(p.2). Sua técnica se respalda no “conceito de que os desenhos da figura humana”, bem como os da casa e da árvore, “são úteis para o estudo da personalidade ou como meio de diagnóstico na avaliação clínica, e se fundamenta na teórica na psicologia da imagem de si mesmo, assim como na teoria psicanalítica da projeção” (HARRIS, 1981, p.57- grifo nosso).
Para Levy (apud TRINCA, 1987), o desenho além de projetar a imagem corporal, usualmente compõe uma gama de projeções relacionadas ao autoconceito, a imagem ideal do eu, e as atitudes para com os outros, mesmo com o examinador na situação da testagem. O teste do desenho pode ser uma expressão consciente, como também incluir símbolos disfarçados e fenômenos inconscientes. O desenho da figura humana, segundo Alves (apud WECHSLER, 2003), é uma das medidas mais utilizá-las pelos psicólogos brasileiros, na maioria das vezes com o intuito de avaliação emocional mais do que cognitiva. A freqüência da utilização dessa técnica, certamente, se deve a sua composição simples, aparentemente objetiva e de baixo custo financeiro (HUTZ e BANDEIRA apud WECHSLER, 2003).
Ao examinando é solicitado, geralmente, um mínimo de três desenhos, e, em seguida se conduz o Inquérito1. Nessa etapa do Inquérito é extraído o maior número possível de informações e descrições subjetivas que o examinando discorre sobre cada uma das figuras grafadas. Cabe ressaltar que, na clínica, esse manejo é bem mais favorável de se consolidar do que num exame psicotécnico, por se tratar, quase sempre, de grupo. Para Deleuze (1997), o devir não é imaginário, bem como uma vigem não é real, ele faz do mínimo de um trajeto ou da sua imobilidade no mesmo lugar, uma viagem; e é esse percurso que leva o imaginário a um devir. Ao trazer esta afirmativa deleuziana para o contexto desta discussão, diríamos que este teste é o “devir”, e que o examinando é o “imaginário”. Daí a importância do Inquérito. Este, junto ao desenho funda as disposições de acesso ao indivíduo, com significativa e vertical compreensão do seu Eu.
Em outras palavras, é a fala do examinado, no seu sincero propósito de colaborar com o processo, que vai dar mais sentido, e legitimar mais ainda as expressões dos seus desenhos. Afinal, “toda linguagem é uma linguagem exposta à emergência dos efeitos do inconsciente” (NASIO, 1993, p.79). Nessa perspectiva, Deleuze (2006) ressalta que a estrutura se estabelece daquilo que é linguagem, seja ela esotérica ou não-verbal, do mesmo modo em que “só há estrutura do inconsciente à medida que o inconsciente fala e é linguagem” (DELEUZE, 2006, pp.238-9). O desenho é uma outra forma de linguagem por meio do qual o inconsciente também se manifesta. Para Campos (1999) o desenho na vez de técnica projetiva reflete uma impressão do “todo” do indivíduo, como uma “Gestalt”2 organizada, que aparece em toda a sua extensão, pelo olhar do examinador experiente na técnica da interpretação de desenho (grifos da autora).
A autora acredita que tudo esta no desenho, cada linha e parte em suas relações com as outras, o aspecto da sua elaboração com um todo apresenta um efeito unificado, diferente do Rorschach que, além de não apresentar tal clareza de interpretação, necessita de cálculos e escores. Enfim, “a projeção do Desenho é apreendido pelo clínico com uma unidade; o Rorschach deve ser tratado parte por parte” (CAMPOS, 1999, p.27). Por questões inerentes à conduta para com os testes psicológicos, não é possível esmiuçar aqui o significado específico do H-T-P, ou seja, em que se consubstanciam seus itens, isto, se não o invalidaria, entretanto retiraria um pouco do seu impacto avaliativo.
Existem os desenhos projetivos a exemplo do Zulliger (aplicação individual ou coletiva, por meio de slides ou apresentação de 3 cartões ou lâminas), e do Rorschach (aplicação somente individual, mediante a apresentação de 10 cartões ou lâminas), com os seus famosos borrões de tinta que se constituem de estímulos ambíguos. O indivíduo descreve, verbalmente, como os percebe. Feito isso, terá que destacar com lápis de cores variadas nas folhas de localização, uma espécie de marca d`água, os locais nos quais as imagens inspiraram suas respostas. O H-T-P é um teste projetivo, mas gráfico, isto o diferencia destes outros citados.
Os três desenhos do H-T-P trabalham com a mesma deliberação tendo em vista para a interpretação das características da personalidade,estado emocional, transtorno mental3 e outros. Convém salientar que, este teste, apesar da sua relevância tende a denotar aspectos patológicos dos quais quase ninguém escapa. Assim sendo, a praxe recomenda a aplicação de mais de um teste de personalidade quando da avaliação do item específico: Personalidade, e da importância de que o avaliador perceba em quais situações deve relativisar os seus dados qualitativos.
Segundo Van Kolck (1984), o indivíduo ao atender à solicitação - “desenhe uma pessoa” - lança sobre o papel a imagem corporal que possui e que se torna veículo de expressão de sua personalidade (p.14). A autora acrescenta que essa imagem não é apenas consciente, mas também construída como base no corpo do outro, e que não está ligada somente à aparência, mas, em especial, a qualidade da relação. A folha de papel em branco representa o mundo externo do indivíduo que nos desenhos livres é ocupada por objetos diversos sem conexão entre si, ou, pelo contrário, isolados, ou mesmo vazios de conteúdos (PICCOLO, 1995), e, por vezes, porque não, bem distribuídos, relacionados e harmonizados.
O sistema inconsciente, estranhamente, é colocado em dúvida por Nasio (1993), ao mesmo tempo em que indica o suposto lugar do seu trânsito. Para o autor, “se o inconsciente existe, ele só pode existir no interior do campo da psicanálise e, mais precisamente, no interior do campo do tratamento analítico” (p.49). Diríamos que o inconsciente está na vida, no cotidiano das pessoas, e em toda atuação psicológicas, embora umas abordagem priorizem, outras o pretira ou ignore. O inconsciente não é uma invenção de Sigmund Freud, nem patente da psicanálise. Segundo Mueller e Hergenhahn (apud GORSKI, 2005), se atribuem ao filósofo Gottfried W. Leibniz a descoberta do inconsciente muito antes de Freud tocar nessa tecla.
O desenho é uma das mais autênticas expressões do testando, uma vez que capta, em particular, conteúdos inconscientes, sem a sua intervenção. Embora ele possa até intuir que algo do seu interior, do seu Eu, irá torná-lo conhecido, mas não consegue ter o controle sobre o que será exposto. Isto certamente o angustia bem mais, porque o deixa vulnerável. Porém, a intenção não é deixá-lo numa situação desconfortável. Mas, esse teste se estrutura de tal modo que o examinando não consegue manipular informações ao seu favor. Posto que, ele não tem noção de quais aspectos dos desenhos serão considerados favoráveis ao seu caso.
Com exceção de figuras estereotipadas - a exemplo de coqueiro, bananeira e pessoa unidimensional ou feita de “palitos”-, que são impróprias para serem analisados porque não oferecem material suficiente, no teste do desenho não tem resposta certa nem errada. Logo, todos os componentes dos desenhos são analisáveis. A grosso modo, o H-T-P se compara a uma radiografia psíquica. Considerado o fato de que o candidato ou examinado não tem controle sobre os testes, durante o processo de seleção ou avaliação o mais sensato é procurar relaxar (fazer exercícios respiratórios, e manter os pés bem apoiados no chão, sobretudo e de maneira moderada nos momentos antecedem a sua realização, são fundamentais), e ariscar-se em: “Ser a própria pessoa, sem subterfúgios, ou representar algum personagem”, e ser cooperativo às realizações e às solicitações da demanda diagnóstica ou psicométrica. Uma vez que assim proceda, e essa postura é válida para todos os testes, estará facilitando uma melhor denotação do seu potencial, e como conseqüência um resultado mais satisfatório do seu desempenho.
Para um melhor entendimento do trabalho prático com desenhos, a seguir serão apresentadas quatro vinhetas de dois casos clínicos, e de dois exames psicotécnicos. Um paciente, médico, estava em crise no casamento. A sua esposa se queixava que isto se devia, em grande parte, à relação simbiótica do marido com os parentes, em especial ao seu apego à mãe viúva. O que era, veementemente, negado por ele, que se dizia independente e acostumado a se “virar” sozinho. Portanto, está casado ou solteiro lhe parecia, apesar deste seu segundo matrimônio, ser indiferente, etc. Solicitei que ele desenhasse a sua família.
Depois de relutar, de questionar a utilidade do desenho, meio indisposto do tipo: “Só vou fazer porque não tenho outra alternativa”, com o lápis esgrimiu rápidos golpes no papel. Este gesto que também tem outras significações, aqui se restringirá ao que foi explicitado: Quatro esboços do mesmo tamanho, similares, e um apêndice junto e a esquerda do primeiro esboço da seqüência. Cada garatuja como se fossem parênteses sobrepostos. Um menor “a cabeça”, em cima de um outro maior “o tórax”, e a base do primeiro, bastante rechonchuda em relação aos demais, representando os quadris.
Quando do Inquérito, apontei para que os nomeasse, o dos quadris largos era sua mãe, o apêndice que sugeria algo como: “Preso à barra da sua saia”, o paciente se auto-reconheceu, e os outros eram seus irmãos. Sugeri que fizesse um outro desenho, mas, com a sua família: mulher e filho (esta fora a intenção inicial). Desta vez apareceram figuras, mas sem se tocarem: Um homem, na direita do papel, olha para o oeste; uma mulher no seu lado esquerdo, olha para o leste, e uma criancinha dava a impressão de engatinhar alheia ao casal. Ao chamar sua atenção para estes detalhes, o paciente se conscientizou das suas dificuldades, e pareceu disposto a repensar e a assumir seu casamento.
Um outro paciente, este já em fase de ser liberado para cirurgia bariátrica, se dizia muito bem, e que havia superado o trauma de hospital, etc. Sugeri que ele fizesse a cena desse dia tão sonhado. No desenho bem elaborado - não quer dizer bonito, perfeito, mas, que seus componentes estão nitidamente representados -, se evidenciou uma figura de barriga enorme, deitada na mesa de cirurgia sob um grande refletor, e com os olhos arregalados em direção à porta. Ao longo do seu corpo três pessoas identificadas como o cirurgião, a anestesiologista e uma enfermeira. Com base nesse “olhar de pavor com desejo implícito de fuga”, ele resolveu adiar a cirurgia, por uns quinze dias, com o objetivo de explorar um pouco mais esse medo.
Uma examinada, no psicotécnico, achou que a perfeição do desenho seria considerada, daí reforçou e retocou todos os desenhos. Seu H-T-P ficou bizarro, e adquiriu uma outra conotação. Esse fato junto à mesma atitude no Teste Palográfico de reforçar os traços (palos), quando da contagem dos mesmos, contribuíram para a sua não indicação. Num concurso público bastante concorrido, uma candidata à vaga de Agente de investigação (função fictícia para dificultar associações), de repente, por conta de uma pergunta da sua concorrente, durante a realização de um teste, ficou agressiva, e bastante exaltada. Seu protesto tinha um pouco de pertinência, houve de fato uma pequena interferência, mas que não devia ter ocorrido. Porém, não chegara a prejudicar o andamento do todo.
Quando reunidos para discutirmos o caso, a psicóloga e o estagiário responsáveis pela sala, estavam se sentindo profundamente culpados e incompetentes. Na função de um dos membros da coordenação do evento, chamei a atenção de que lhes tinha faltado uma prontidão para conter essa interferência, mas que a reação da moça fora exageradamente desproporcional ao incidente. Na análise do seu teste, todos os desenhos, em especial o da figura humana apresentava vários indicativos de intensa agressividade. Chegou-se a conclusão de que a sua agressividade e tensão não eram reacional a situação da testagem, mas constitucional à sua personalidade. A candidata foi considerada, temporariamente, inapta para o cargo.
O desenho tem a função de estabelecer contato, investigação e tratamento. Na comunicação verbal o examinado poderá tentar conduzir, com seus argumentos, o interlocutor para determinado foco, persuadi-lo para o que julga ser crucial para conquistar a vaga. Daí a grande vantagem do desenho, o indivíduo não tem a chance de exercitar esse artifício. Assim como o corpo fala, o desenho diz por meio do inconsciente, aquilo que, por cautela ou autocensura, o seu autor não se permite verbalizar. No psicotécnico, os traços de personalidade identificados nos desenhos são comparados ao perfil que se exige para o cargo. Nesse caso, por vezes, sujeitos de elevado nível cultural e consideráveis características pessoais, não são contempladas. Do mesmo modo que, um outro, com menos potencial poderá se adequar melhor a essa função.
Num primeiro momento, esse processo, parece meio sem lógica e, em particular, cruel. Deve-se lembrar que este sistema é capitalista, e que a escolha de um candidato se dá em relação a diversos fatores. Alguns são bem específicos de cada empresa ou processo seletivo. Por exemplo, numa empresa na qual não haja perspectiva de ascensão funcional, colocar uma pessoa com elevado nível de escolaridade, inteligente, e criatividade, numa função “elementar”, sem possibilidade de crescimento, seria condená-la ao desajuste. Também seria motivo de constrangimento indicar uma outra para uma colocação que está além do seu potencial. Ela se desgastaria para atingir um nível razoável de satisfação produtiva, ou não atingiria, gerando frustração, ou mesmo, algo mais sério. Segundo Codo e Vasques-Menezes (apud ABREU et al., 2002), as pessoas entram em burnout4 ao se sentirem incapazes de investir em seu trabalho, e em conseqüência da incapacidade de lidar como o mesmo.
Um processo seletivo não é pensado em ternos emergenciais. Entre outros, também porque, contratação no Brasil, implica em encargos sociais altíssimos, etc. Na situação de desempregado há disposição sim, mas que, se não forem seguidos os parâmetros racionais de seleção, não há nenhuma segurança de que seja mantida. Atendida as necessidades básicas de subsistência, outras ocuparão o campo psicológico do indivíduo. Assim sendo, vem à tona o velho jargão, de que somente “o casamento da pessoa certa com a função”, poderá resistir às intempéries ocupacionais.
Entre os desenhos, é o da figura humana geralmente o mais realizado, mas, paradoxalmente, é também o mais rejeitado. Para Buck (2003), isso está associado ao nível de desajustamento do sujeito, uma vez que evidencia, mais diretamente, as dificuldades das relações interpessoais e a consciência corporal, mais do que a casa ou árvore. No que se refere aos dados de inteligência, aptidões, etc., feitas as suas devidas ponderações, pode se considerar os mais elevados escores ou percentuais. Ao passo que, na avaliação ou análise da personalidade propriamente dita, os aspectos mais comprometedores são vistos em relação à capacidade adaptativa. Junto a outros itens que poderão ajudar o paciente a superar as suas dificuldade, e, no caso do examinado, no psicotécnico, a enfrentar as situações. Por conseguinte, tenta-se fazer prevalecer o princípio de que, a parte mais saudável, uma vez destacada e valorizada, favorece as outras mais afetadas: “Como alguém conta comigo, eu sou responsável por minha ação perante o outro” (RICOEUR apud SENNETT, 2002: 174). Todo paciente, etc., por mais comprometido que pareça sempre apresenta algum “gancho” como ponto de partida para a sua ajuda.
Porém, nem sempre é fácil de desvelar áreas conflitivas, para perceber os potencias de um candidato, é preciso técnica e atenção, e, no caso clínico, paciência, bem como persistência, para encontrar e alargar as arestas que contribuam para a “cura” do paciente ou remissão do seu sintoma. Van Kolck (1984) salienta que além da projeção5, mecanismos como identificação6 e introjeção7 podem se manifestar, mas certamente a expressão e a adaptação são os dois processos que ocupam lugar de importância quando o desenho é concretizado. A adaptação, expressão e projeção, segundo a autora, estão explícitas no ato de desenhar. Assim sendo, mais do que qualquer outra especificidade de produção pessoal, deve ser visto com bastante critério os aspectos: Adaptativo que diz respeito à adequação à tarefa solicitada, sua correspondência em relação à faixa etária, sexo e, eventual, patologia; Expressivo que analisa o estilo característico da resposta que se mostra por meio gráfico da forma; e o Projetivo que verifica as situações e objetos que denotam conteúdo e a maneira de tratar o tema.
No teste do desenho, embora seu enunciado se refira “ao melhor que o examinado possa desenhar”, a estética ou beleza artística não é considerada, mas os conteúdos que estão representados. Histórias, críticas, sentimentos e emoções verbalizados durante a aplicação e no inquérito são dados complementares que podem até colaborar com o fechamento do Parecer de um Laudo. Tudo que o indivíduo faz, diz, escreve, desenha é uma projeção do seu Eu, ou são fragmentos de si mesmo. Ele pode até não ser exatamente aquilo, mas está de alguma forma, por meio desses sinais, representado. Van Kolck (1984) cogitar que há “casos de rejeição em graus diferentes de intensidade, a partir da negação a desenhar até o não complemento do desenho”(p.10 - grifo da autora).
Na situação de testagem, o discurso de que não sabe desenhar, a priori pode sugerir uma preocupação com a plástica do desenho, mas, na realidade, trata-se de resistência, um mecanismo de defesa, receio de se projetar. De modo geral, “todas as defesas contêm aspectos adaptativos e são indispensáveis para um ajuste adequado à realidade” (PICCOLO, 1995, p.209). É a “melhor solução” (grifo da autora) encontrada pelo sujeito para lidar com as situações, a sua maneira de perceber e conectar-se tanto com a realidade interna quanto com a realidade externa. Em virtude disto, interessa conhecer quais os perigos fantasiados que o ego tenta evitar, e no que acredita como de mais terrível que possa ocorrer caso relaxe essa conduta defensiva (idem, ibid).
Assim como o corpo não mente, e conta coisas sobre a história emocional, e dos mais profundos sentimentos, caráter e personalidade (KURTZ e PRESTERA, 1989), o mesmo pode-se dizer do desenho, que também funciona com uma estrutura similar à grafologia. Assim como na grafologia, o teste do desenho é uma série de atos, de registros gráficos dos movimentos, “quer dizer, como um filme em que o próprio indivíduo plasma, graficamente, seu tipo de inteligência, sua sensibilidade, seus impulsos, suas tendências, suas reações etc.” (VELS, 1997, p.39).
Segundo Vels (1997), a grafologia tem a vantagem de nos dar uma imagem fiel do indivíduo revelada por ele mesmo, sem intermediário e sem risco de inibição e nervosismo que todo teste psicotécnico produz, quando o indivíduo se sente “examinado” (p. 11 - grifo do autor). É verdade que toda situação de testagem gera algum tipo de tensão, mas, se o indivíduo é conhecedor de que sua grafia é objeto de avaliação, por que na grafologia seria diferente? Enfim, no processo psicotécnico,, se destina um tempo para o Rapport8 ou “quebra gelo”, entre outras, para desmistificar os testes, etc., e também para atenuar a ansiedade ou nervosismo dos examinandos (SILVA, 2007).
Tomando por base o exposto poder-se-ia indagar se o treinamento do H-T-P, por exemplo, leva a exposição de desenhos mais satisfatórios? Nunca é demais ressaltar, que não é permitido o treino de qualquer teste psicológico. Isto fere os princípios éticos que regem a categoria, e que está sujeito à invalidação e punição por parte do CFP (Conselho Federal de Psicologia) que regulariza a profissão. Mas, na hipótese de um sujeito recorrer a esse expediente ilegal? Esse macete com o teste do desenho pode até implicar numa vantagem, mas aparente, uma vez que camufla determinados aspectos, mas, dificilmente, não deixará de transparecer as características que, de fato, são inerentes a sua personalidade.
Provavelmente, ficaria um desenho confuso, correndo o risco de que, exatamente por isto, ser preterido, haja vista as incoerências da expressão dos desenhos. Também deve ser considerado o fato de que a avaliação não se dá somente na exclusividade de um desenho ou teste, mas no seu conjunto que subsidia a decisão do examinador. Nesse sentido, Van Kolck (1984) diz que um traço gráfico isolado nada significa. Cada traço deve ser considerado em conexão com os demais e no contexto geral do desenho (p.6). Enfim, o treino não é garantia para assegurar vaga ou carteira de habilitação.
Na perspectiva de ser um psicanalista fazendo outra coisa mais apropriada para a ocasião, Winnicott (apud MENCARELLI e VAISBERG, 2005) propunha uma espécie de jogo de traços e rabiscos no qual cada pessoa deveria finalizar apenas com um desenho esboçado pelo outro. Assim, em poucos encontros era possível chegar ao núcleo problemático do paciente. Apesar desta “deixa” de Winnicott, o desenho na condição de modalidade de teste psicológico é pouco estudado na academia, como conseqüência seu uso, em termos proporcionais, ainda é bem restrito.
Com exceção da ênfase infantil, e do psicotécnico, o teste do desenho não tem uma presença maciça em termo do auxílio que esse recurso pode trazer. Talvez por consistir-se num instrumento de característica rudimentar - todo mundo, de uma forma ou de outra desenha, rabisca, etc., desde os seus primórdios de criança -, não tenha sido valorizado. Segundo Lipovetsky (2005), “não é mais apenas a riqueza do material que constitui o luxo, mas a aura do nome e renome das grandes casas, o prestígio da grife, a magia da marca” (p. 43). Mas este imperativo simbólico, não é exclusivo da moda. Talvez, nesse universo, seja mais explicitamente ditatorial, todavia está também nos mais diversos universos dos segmentos sociais, mesmo no acadêmico, e nem sempre de modo subjacente.
Enfim, os trabalhos mais expressivos em relação ao desenho estiveram voltados para saúde mental a cargo da Nise da Silveira. Esta psiquiatra que não aceitava o eletrochoque - atualmente denominado eletroconvulsoterapia9 - como meio de tratamento, recorreu ao desenho, modelagem e pintura, na sua assistência aos pacientes psicóticos. Em 28 de setembro de 1956, no Engenho de Dentro, no Rio de Janeiro, fundou o Museu de Imagens do Inconsciente.
O desenho está imerso na realidade social, nas suas mais diversas matrizes de arte, seja mediante das obras clássicas, sofisticadas, estilizadas, e até mesmo nas manifestações dos anseios e protestos populares por meio das grafites de rua. Porém, o desenho na sua função de Avaliação Psicológica, não pode se constituir numa tarefa simplória, não se trata de deleitar ou rejeitar conforme o conforto ou incômodo da percepção. Mas, de ir além, traspassar para enxergar, ali, uma vida imbricada noutras vidas, que almejam pela realização de um sonho, atender uma necessidade, e ter uma chance. Finalmente, o teste do desenho tem o dom de veículo que aproxima, e se faz explicitar dos fragmentos, das nuances de luz e sombra, a compreensão. E, assim, se fecha a gestalt de quem ajuda (psicólogo), e de quem espera ser ajudado (paciente, examinado).
NOTAS:
1. O Inquérito consiste num roteiro padronizado de perguntas que são feitas após a conclusão de cada desenho. Isto não significa dizer que o aplicador não possa explorar, de maneira mais espontânea, itens que não ficaram claros, conforme a necessidade.
2. Teoria da Gestalt afirma que não se pode ter conhecimento do todo por meio das partes, e sim das partes pelo todo, uma vez que o conjunto possui leis próprias que regem seus elementos. Só mediante a totalidade é que o cérebro pode, de fato, perceber, decodificar e assimilar uma imagem ou um conceito. Esta teoria deu origem a Psicologia da Gestalt que, por sua vez, enfatiza os processos que envolvem figura e fundo, e a percepção ativa do indivíduo no aqui e agora (FAGAN e SHEPHERD, 1980). No entender de Rey (2003), a Gestalt move-se claramente em função de uma compreensão holística dos fenômenos psicólogicos.
3. A expressão doença mental foi substituída por Transtorno mental (MATOS; MATOS; MATOS, 2005, p.313).
4. Burnout é um termo de origem inglesa que designa “algo que deixou de funcionar por exaustão de energia” (OLIVEIRA apud SILVEIRA et al., 2005, p.159). Esta síndrome também pode ser definida como um estado de exaustão emocional, física e mental causado por elevado nível de exigência durante longo tempo (PINES e ARONSON apud idem, ibid).
5. Projeção é a operação pela qual o sujeito expulsa de si e localiza no outro, pessoa ou coisa, qualidades, sentimentos, desejos que ele desconhece ou recusa em si mesmo. Comum na paranóia, e na superstição dos “normais” (LAPLANCHE e PONTALIS, 2004).
6. Identificação é o processo psicológico pelo qual se assimila aspecto, propriedade, atributo do outro e se transforma, total ou parcial, segundo esse modelo. Enfim, a personalidade constitui-se e diferencia-se por uma série de identificações (LAPLANCHE e PONTALIS, 2004).
7. Introjeção é processo de aproximar-se da incorporação, que constitui o seu protótipo corporal, mas não implica necessariamente ao seu limite (introjeção do ego, do ideal do ego, etc.). Está estreitamente relacionada com a identificação (LAPLANCHE e PONTALIS, 2004).
8. Maiores informações sobre o Rapport podem ser encontradas no texto: Os Testes Psicológicos e as suas Práticas (SILVA, 2007 - http://www.algosobre.com.br/ - artigos / psicologia).
9. Com base em Fink e Berrios, Perizzolo et al. (2003) dizem que a eletroconvulsoterapia é o tratamento mais controverso tanto quanto mais polêmico da psiquiatria. Sua própria natureza, histórico de abuso, apresentações desfavoráveis da mídia, e testemunhos de pacientes tão convincentes quanto desiformados contribuíram para o contexto de tal visão.
REFERENCIAL
ABREU, K. L. et al. (2002). Estresse ocupacional e síndrome de Burnout no exercício profissional da psicologia. Revista Psicologia: ciência e profissão. Vol. 1, n.1. Ano 22. Brasília: CFP.
BUCK, J. N. (2003). H-T-P: casa-árvore-pessoa, técnica projetiva de desenho: manual e guia de interpretação. 1. ed. Trad. R. C. Tardivo. São Paulo: Vetor.(Uso exclusivo de psicólogos).
CAMPOS, D. M. (1999). O teste do desenho como instrumento de diagnóstico da personalidade: validade, técnica de aplicação e normas de interpretação. 31 ed. Petrópolis-RJ: Vozes.
DELEUZE, G. (1997[1925-1995]). Crítica e clínica. Trad. P. P. Pelbart. São Paulo: Ed. 34.
DELEUZE, G. (2006 [1925-1995]). A ilha deserta: e outros textos. Trad. L. B. L. Orlandi. São Paulo: Iluminuras.
FAGAN, J. e SHEPHERD, I. L. (1980).Gestalt-Terapia: Teoria, Técnicas e aplicações. 4. ed. Trad. Álvaro Cabral. Rio de Janeiro: Zahar.
GORSKI, F. T. (2005). Freud, Lacan e o conto da Ilha Desconhecida - Reflexões psicanalíticas acerca de um conto de Saramago. Revista Psicologia: ciência e profissão. Vol. 1, n.1. Ano 25. Brasília: CFP.
HARRIS, D. B. (1981). El test de Goodenough: revision, ampliacion y actualizacion. Barcelona-Buenos Aires: Paidos.
KURTZ, R. e H, PRESTERA. (1989). O corpo revela: um guia para a leitura corporal. Trad. M. A. B. Libanio. São Paulo: Summus.
LAPLANCHE e PONTALIS. (2004). Vocabulário da psicanálise. Trad. P. Tamen. São Paulo: Marins Fontes.
LIPOVETSKY, G. e ROUX, E. (2005). O luxo eterno: da idade do sagrado ao tempo das marcas. Trad. M. L. Machado. São Paulo: Companhia das Letras.
MATOS, E. G; MATOS; T. M. G; MATOS, G. M. G. (2005). A importância e as limitações do uso do DSM-IV na prática clínica. Revista de Psiquiatria do R.G.S. v. 27, n. 3, set/dez.
MENCARELLI, V. L. e VAISBERG, T. M. J. A. (2005). Iluminando o self: uma experiência clínica psicanalítica não convencional. Revista Estudos de Psicologia. Vol. 22, n. 4, out/dez. Campinas-SP: PUC-Campinas.
NASIO, J.-D. (1993). Cinco lições sobre a teoria de Jacques Lacan. Trad. V. Ribeiro. Rio de Janeiro: Zahar.
PERIZZOLO, J. et al. (2003). Aspectos da prática da eletroconvulsoterapia: uma revisão sistemática. Revista de Psiquiatria do R. G. S. vol. 25, n.2. mai/ago.
PICCOLO, E. G. (1995). Defesas nos testes gráficos. In: O processo psicodiagnóstico e as técnicas projetivas. 8 ed. Trad. M. Felzenszwalb. (Orgs). OCAMPO, M. L. S. et al. São Paulo: Martins Fontes.
PICASSO, P. (2004). 1.000 Pensamentos de Personalidades que Influenciaram a Humanidade. (Org.). A. H. Oliveira. São Paulo: DPL.
REY, L. G. (2003). Sujeito e subjetividade: uma aproximação histórico-cultural. Trad. R. S. L. Guzzo. São Paulo: Pioneira Thomson Learning.
SENNETT, R. (2002). A Corrosão do Caráter. 6. ed. Trad. M. Santarrita. Rio de Janeiro: Record.
SILVA, V. G. (2007). Os Testes Psicológicos e as suas Práticas (http://www.algosobre.com.br/ - artigos / psicologia).
SILVEIRA, N. M. et al. (2005). Avaliação de burnout em amostra de policiais civis. Revista de Psiquiatria do R. G. S. vol. 27, n.2. mai/ago.
TRINCA, W. (1987). Investigação clínica da personalidade: o desenho livre como estímulo da apercepção temática. São Paulo: EPU.
Van KOLCK, O. L. (1984). Testes projetivos no diagnóstico psicológico. São Paulo: EPU.
VELS, A. (1997). Dicionário de grafologia e termos psicológicos afins. Trad. J. C. A. Cunha. São Paulo: Casa do Psicólogo.
WECHSLER, S. M. (2003). Avaliação do desenvolvimento cognitivo infantil pelo desenho da figura humana. Revista Boletim de Psicologia. Vol. LIII, n. 119, jul/dez. São Paulo: Sociedade de Psicologia de São Paulo.__________________________________________________
CAIXA DE TRABALHO: UM DEPOSITÁRIO DO MUNDO INTERNO DO APRENDIZ
Muitos Psicopedagogos utilizam a caixa de trabalho como mais uma opção no tratamento psicopedagógico, embora existam psicopedagogos que não trabalhem com a mesma. Veremos aqui o que é a caixa de trabalho, suas vantagens e desvantagens.
Visca idealizou a caixa de trabalho para se trabalhar com as dificuldades de aprendizagem e, para isso, inspirou-se na caixa individual utilizada pelos terapeutas analista na Psicanálise de crianças. Ela seria composta de brinquedos e materiais escolhidos para representarem o mundo interno das crianças, suas fantasias inconscientes frente ao mundo (BARBOSA, 2000, p. 35).
Visca nos diz que:
...cada caixa de trabalho é única, não apenas porque será usada por um único paciente (individual ou grupal), mas também no sentido de que não há caixas duas iguais, da mesma maneira que não existem dois indivíduos ou dois diagnósticos iguais (1987, p. 29).
A caixa deverá ser única porque ela representa uma importância significativa para o sujeito, já que contém objetos que foram escolhidos para ele, os quais intencionam promover “... a superação ou a minimização das dificuldades de aprendizagem” (BARBOSA, 2002, p. 36).
A caixa de trabalho constitui-se, na sua forma física, só e tão somente numa caixa de papelão, de cartolina ou plástica, num tamanho suficiente que possibilite guardar todo o material de uso e pequenas construções.
Embora simples na aparência tem um rico significado internamente já que é ali que o sujeito depositará suas construções e elaborações como desenhos, pintura, texto etc. Ela representa “o depositário de conteúdos simbólicos do paciente” (WEISS, 2003, p. 152). Ela não deverá se tornar apenas receptáculos de materiais e produções, pois representa o mundo interno do aprendiz, devendo ser manejada apenas por seu dono, sem correr o risco de ser mexida ou observada por terceiros, é o que nos aconselha Barbosa. O psicopedagogo deverá garantir a privacidade do sujeito para que este não se sinta invadido e não perca a confiança.
Para Barbosa ela é “um continente, no qual a criança poderá depositar seus conteúdos de saber e de não saber” (2002, p. 35).
Weiss nos informa que “Os materiais a serem colocados são definidos ao final do diagnóstico quando se planeja o tratamento” (2003, p. 152). Barbosa completa nos dizendo que os materiais são escolhidos previamente de acordo com a leitura que fizemos da criança ou adolescente durante a avaliação psicopedagógica (2002, p. 35).
Para se organizar uma caixa é preciso considerar alguns aspectos, tais como: estágio de pensamento, interesses ou motivações, déficits de aprendizagem, sexo, idade, meio sócio-cultural, prognóstico e grau de focalização da tarefa (Visca, 1987, p. 29). Barbosa completa ainda com: nível de apropriação da linguagem escrita, vínculos afetivos estabelecidos com as situações de aprendizagem (2002, p. 36).
Barbosa nos faz uma observação de extrema relevância a cerca da composição da caixa. Há crianças ou adolescentes que apresentam o predomínio da assimilação, ou seja, são aquelas que se aproximam mais de situações lúdicas. Para estes sujeitos deverão ser colocado apenas um material não estruturado (tinta, argila, peças para montar, massa de modelar, etc) e mais materiais estruturados ou semi-estruturados (cadernos, livros, jogos com regras, modelos, receitas etc) a fim de que ele se identifique com a caixa através deste único material não-estruturado e experimente mudanças através dos diferentes materiais estruturados (2002, p. 36-37).
O excesso de materiais não estruturados para este tipo de aprendiz representa o excesso de recursos distratores, dificultando sua concentração e sua busca em direção ao movimento de acomodação, que o obriga a modificar os esquemas de aprendizagem já existentes (Id. Ibid., 2002, p. 37).
Já em outros sujeitos ocorre o predomínio da acomodação, que são aqueles que estão sempre modificando seus esquemas de forma excessiva o que acabam por imitar e não criar. Para estes, Barbosa recomenda um material estruturado para servir como ponto de partida e mais materiais não-estruturados para que criem sem seguir modelos, sem modificar seus esquemas de aprendizagem, ou seja, são sujeitos que necessitam de uma maior flexibilidade.
Além de materiais, estruturados e não estruturados, a caixa deverá conter materiais básicos que servirão de apoio, tais como: lápis, borracha, régua, apontador e a depender da necessidade apontada pela avaliação: tesoura cola, revistas para recortar, cadernos etc.
A caixa de trabalho pode ser incluída como uma das constantes do enquadramento, a qual só poderá sofrer modificações com novos combinados entre o terapeuta e o sujeito. Dentre as modificações está o acréscimo ou a retirada de algum objeto. Se isto for feito sem nenhum critério ou avaliação, a evolução do sujeito poderá ser seriamente prejudicada.
É comum crianças e adolescentes quererem trazer objetos de casa ou levar objetos da caixa para casa. Isto só pode acontecer se fizer parte de um combinado entre aprendiz e terapeuta; se for contribuir para a aprendizagem ou para a minimização da dificuldade de aprendizagem; se houver clareza dos objetivos desta ação (Id. Ibid., 2002, p. 38)
Outra modificação está em repor objetos como uma cola que a criança usou em apenas uma tarefa de recorte e colagem. Barbosa nos orienta repor “dependendo da consciência que ela possui em relação aos limites e ao seu descontrole frente aos limites” (2002, p. 38).
Além da caixa de trabalho, há profissionais que trabalham com o que Bosse denominou de material disparador em seu artigo na revista Psicopedagogia: O material disparador – considerações preliminares de uma experiência clínica psicopedagógica.
Nesta citação ela explica porque acredita ser inviável trabalhar com a caixa de trabalho:
Em nossa realidade atual, torna-se praticamente inviável ao psicopedagogo dispor de materiais como: jogos, tesouras, caixas de lápis de cor etc. para uso exclusivo de um único cliente. A menos que o profissional se dedique a atender pessoas de classe econômica alta, o que não me parece ser o objetivo da Psicopedagogia (BOSSE, 1995, p. 81).
Consiste em selecionar um material previamente ao início de cada sessão e tem como objetivo mobilizar o sujeito à busca da aprendizagem. A eleição do material acompanha os interesses e necessidades da criança ou adolescente. Segundo Bosse, o material disparador poderá ser um livro, um jogo, pedaços de tecido, papel de dobradura etc.
Feita a seleção, o material é deixado sobre a mesa de trabalho ao lado de uma caixa com instrumentos básicos de uso comum a todos os clientes, tais como, lápis, borracha, tesoura, cola, caneta, régua, apontador, hidrocor, papel sulfite, papel pautado, quadriculado e colorido.
Ela nos diz que o mesmo material deverá ser oferecido ao sujeito por várias sessões seguidas até que se esgote o seu interesse, entretanto observa que o fato dele perder o interesse não significa que ele tenha superado a defasagem. Então, caberá ao psicopedagogo encontrar ‘uma nova “brecha” entre os interesse da criança, que permita trabalhar aquela mesma dificuldade’ (1995, p. 82).
Da mesma forma que a caixa de trabalho, o material a ser oferecido deverá estar de acordo com seu nível cognitivo para que lhe dê estímulo em seguir adiante. Porém também deverá ser oferecido outro material que mobilize aprendizagens de um nível imediatamente superior ao que o sujeito se encontra para que se possa desafiá-lo a trabalhar com suas dificuldades, superando suas resistências.
As substituições também não deverão ser feitas de forma aleatória. Elas deverão responder a questões tais como: “Porque vou substituir este disparador nesta sessão? Porque vou introduzir outro”. Mesmo quando o sujeito pedir algo e este objeto estiver na sala, ela propõe que diga que talvez lhe seja entregue na próxima sessão. Isto permitirá avaliarmos o seu nível de tolerância à frustração e suas resistências.
Creio que seja essa a contribuição da proposta que desenvolvi com o material disparador: a organização e sistematização de uma prática adequada à realidade brasileira e, ao mesmo tempo, coerente com os princípios de um modelo mais amplo, que é o da Epistemologia Convergente, que lhe dá sustentação. (BOSSE. P. 1995, p. 83).
Deveremos lembrar mais uma vez, que a proposta da Epistemologia Convergente é de se trabalhar com a caixa de trabalho, através da qual o psicopedagogo irá observar as ações do cliente para, a partir daí, fazer suas intervenções com o objetivo de promover o seu avanço em relação às dificuldades.
Bibliografia:
BARBOSA, Laura Monte Serrat. Caixa de trabalho uma ação psicopedagógica proposta pela Epistemologia Convergente, in Psicopedagogia e Aprendizagem. Coletânea de reflexões. Curitiba, 2002.
BOSSA, Nadia A. A psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática. Porto Alegre, Artes Médicas, 2000.
______________. Dificuldades de Aprendizagem: O que são? Como Tratá-las? Porto Alegre, Artes Médicas Sul, 2000.
BOSSE, Vera R. P. O material disparador – considerações preliminares de uma experiência clínica psicopedagógica. In: Psicopedagogia, Rev 14 (33), São Paulo, 1995.
PAÍN, Sara. Diagnóstico e tratamento dos problemas de aprendizagem. Porto Alegre, Artes Médica, 1985.
WEISS, M. L. L. Psicopedagogia Clínica: uma visão diagnóstica dos problemas de aprendizagem escolar. Rio de Janeiro, DP&A, 2003.
_____________________________________________
AVALIAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
O trabalho psicopedagógico possui como objetivo central abordar, investigar e intervir nas dificuldades encontradas no processo de ensino aprendizagem.
Encontrar uma definição clara para designar as dificuldades de aprendizagem não é uma tarefa fácil. É preciso esclarecer os padrões de normalidade para identificarmos e analisarmos as anomalias.
Com a finalidade de identificar as causas do fracasso escolar instalado no Brasil na década de 70, profissionais de áreas distintas como pediatras, psicólogos, fonoaudiólogos, educadores, passaram a contribuir com pesquisas e estudos sobre o desenvolvimento infantil e a aprendizagem.
Considerando a escola responsável por grande parte da formação do ser humano, o trabalho do psicopedagogo na instituição escolar tem um caráter preventivo no sentido de procurar criar competências e habilidades para solução dos problemas. Com esta finalidade e em decorrência do grande número de crianças com dificuldades de aprendizagem e de outros desafios que englobam a família e a escola, a intervenção psicopedagógica ganha, na atualidade, grande relevância nas instituições de ensino.
Ao analisarmos o processo de aprendizagem, devemos perceber um múltiplo enfoque, explanando propriedades psicológicas, neurológicas e sociais do indivíduo, já que a construção da aprendizagem considera aspectos biológicos, cognitivos, emocionais e do meio, que constroem o ser e embaseia a sua evolução.
Concebe-se a aprendizagem como uma construção intrapsíquica, com continuidade genética e diferenças evolutivas, resultantes das pré-condições enérgico-estruturais do sujeito e das circunstâncias do meio, como discorre Visca (1991, apud Guiroto).
Assim, percebe-se a contribuição da neuropsciologia na análise dos processos de aprendizagem, segundo Luria (1966, apud Moretti e Martins), a neuropsicologia tem por objetivo o estudo das relações entre as funções do sistema nervoso e o comportamento humano. Através da neuropsicologia podemos compreender os processos de aprendizagem e buscar meios de solucionar as possíveis dificuldades encontradas, dentre outras atividades cognitivas.
Conclui-se que os fatores neurológicos fornecem subsídios para um olhar singular e para a compreensão do funcionamento intelectual e de sua evolução durante a vida do educando.
Observou-se que cada indivíduo possui uma maneira peculiar de aprender e construir o seu conhecimento, afirmando o objetivo do trabalho psicopedagógico.
Nos últimos anos, com a acentuação do fracasso escolar e diante do baixo desempenho acadêmico, o interesse pelo processo de aprendizagem aumentou.
Crianças, adolescentes e adultos continuam apresentando dificuldades em aprender de acordo com o processo considerado normal, o que exclui o indivíduo de uma sociedade cada vez mais globalizada.
Neste contexto, o psicopedagogo institucional, como um profissional qualificado, está apto a trabalhar na área da educação, dando assistência aos professores e a outros profissionais da instituição escolar visando a melhoria das condições do processo ensino aprendizagem, bem como para prevenção dos problemas que surjam nesse processo.
Ao psicopedagogo cabe avaliar o aluno e identificar os problemas de aprendizagem, buscando conhecê-lo em seus potenciais construtivos e em suas dificuldades, encaminhando-o, por meio de um relatório, quando necessário, para outros profissionais, como psicólogo, fonoaudiólogo, neurologista, que realizam os diagnósticos e exames complementares com o intuito de favorecer o desenvolvimento da potencialização humana no processo de aquisição do conhecimento.
Equipes multidisciplinares buscam respostas para as dificuldades assistidas. Estuda-se a possibilidade de identificar as áreas encefálicas responsáveis pelos processos cognitivos, o que tornará viável o estudo e a formação de diferentes conexões e meios de aprender, possibilidades que surgem no campo psicopedagógico com o avanço da neurociência.
Dá-se, assim, a importância do olhar singular para o educando. Por meio de técnicas e métodos próprios, como testes, anamnese, brincadeiras lúdicas e entrevistas, o psicopedagogo possibilita uma intervenção visando a solução de problemas de aprendizagem.
Por meio de testes já regulamentados, é possível analisar as propriedades neurológicas e psíquicas do educando como: coordenação motora, equilíbrio, percepção, visão, audição, relação intrapessoal, expectativas, anseios e outros.
Segundo Moretti e Martins os tradicionais testes que compõem a avaliação psicodiagnóstica, referem-se a grande e importante parte da avaliação neuropsicológica. Tal avaliação na infância é divida em dois grupos distintos, descritos abaixo:
1.Investigações rígidas, compostas por uma bateria de exames da área, buscando alterações subjacentes às funções analisadas;
2.Exames menos sistemáticos, interpretativos. Oriundo da re-leitura da avaliação tradicional psicopedagógica.
Através de encaminhamentos para áreas respectivas, os profissionais podem detectar os motivos das dificuldades existentes, como por exemplo, a existência de uma lesão cerebral.
Lembramos que com um sistema de saúde público falho, muitas crianças ao cair ou sofrer uma batida importante, não recebem o atendimento adequado. Exames como a tomografia computadorizada ou a ressonância magnética, podem encontrar pequenas lesões que outrora podem trazer à tona conseqüências no desenvolvimento do indivíduo.
O psicopedagogo deve estar apto para intervir e orientar os professores a agir de modo satisfatório nas problemáticas vivenciadas em sala de aula.Porém é preciso salientar que somente a intervenção com os professores não garante a eficácia da intervenção. A participação dos pais e familiares no âmbito escolar é primordial, visando descrever o cotidiano da criança e observando o seu desenvolvimento humano, acompanhando a interação da criança com o ambiente escolar.
Cabe ao psicopedagogo perceber eventuais perturbações no processo aprendizagem, participar da dinâmica da comunidade educativa, favorecendo a integração, promovendo orientações metodológicas de acordo com as características e particularidades dos indivíduos do grupo, realizando processos de orientação. Já que no caráter assistencial, o psicopedagogo participa de equipes responsáveis pela elaboração de planos e projetos no contexto teórico/ prático das políticas educacionais, fazendo com que os professores, diretores e coordenadores possam repensar o papel da escola frente a sua docência e às necessidades individuais de aprendizagem da criança ou, da própria ensinagem.
Bossa (1944, pág. 23).
Percebe-se a importância do trabalho psicodiagnóstico e as contribuições trazidas pela neurociência.
A avaliação formada por testes, anamneses, entrevistas, brincadeiras lúdicas e investigações, permitem ao profissional um aprofundamento na vida do educando, e, conseqüentemente, no cotidiano de sua família e da comunidade que o rodeia, tornando possível a avaliação do indivíduo e a comparação com os padrões de aprendizagem considerados normais, e, posteriormente, a execução das intervenções terapêuticas que se fazem necessárias.
Bibliografia
BOSSA, Nádia. A Psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática. Porto Alegre: Artmed, 1994.
CABREIRA, Priscila Aguirre. Quais os fatores que levam a criança a ser abrigada e as possíveis conseqüências que afetam a sua aprendizagem. http://www.abpp.com.br/artigos93.htm. Acessado em Maio, 2009.
CAPAVILLA, Alessandra Gotuzo Seabra. Contribuições da neuropsicologiacognitiva e da avaliação neuropsicológica à compreensão do funcionamento cognitivo. http://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo.php?script=sci_arttextãpid=s10562-104920070010005&ing=tanrm=pt. Acessado Maio, 2009.
GUIROTO, Aparecida Pires. Baixo rendimento escolar associado a fatores psicossociais: Um estudo de caso. http://www.abpp.com.br/artigos/79.htm. Acesso em Maio, 2009.
MORRETI; MARTINS, Lúcia Helena Tiosso, João Batista. Contribuições da neuropsicologia para a psicologia clínica e educação. http://scielo.bvs-psi.org.br/scielo.php?pid=s1413-8557997000100008&script=sci_arttext&ting=pt. Acessado em Maio, 2009.
Nenhum comentário:
Postar um comentário